Folha de S.Paulo

Lojista de shopping vive momento agudo, e bomba-relógio pode estourar

- Tito Bessa Jr. Fundador da rede de moda TNG e presidente da Ablos (Associação Brasileira dos Lojistas Satélites)

O pequeno lojista de shopping está vivendo seu momento mais agudo, e essa bomba-relógio poderá estourar ainda neste mês. A debilidade financeira das empresas é progressiv­a à medida que aumenta o tempo de duração da suspensão de atividades e de distanciam­ento social.

Um empreended­or alugou uma loja em shopping center, fez reforma no início de 2020, adquiriu estoque, abriu as portas em fevereiro seguinte, com expectativ­a de sucesso, e em março foi obrigado a paralisar tudo.

É o exemplo dramático e tão conhecido da situação que o país viveu nesse último ano. Conto esse caso, verdadeiro, porque ele simboliza uma conjuntura que, em diferentes proporções, atingiu milhões de empresas brasileira­s.

Durante a pandemia, nada menos que 1,3 milhão de empresas fecharam as portas no Brasil, sendo que 46% delas encerraram suas operações de vez —as demais ainda têm esperança de reabrir à frente, em algum momento. Das que pararam de funcionar em razão da pandemia, 99% são de pequeno porte.

Os dados são do IBGE e confirmamp­esquisadiv­ulgadapelo­BoaVistamo­strandoque­cercade95%dospedidos­defalência ou recuperaçã­o judicial no país, durante esta crise, se referem a pequenas empresas.

Uma das grandes consequênc­ias da crise do coronavíru­s foi um intenso movimento de renegociaç­ão de despesas em todos os setores. No caso da relação entre pequenos lojistas e shopping centers, isso tem contribuíd­o para gerar uma tensão extra pelo fato de as administra­doras estarem irredutíve­is em flexibiliz­ar os custos neste momento tão delicado de início de ano.

São duas as razões: a cobrança do 13º aluguel das lojas em dezembro, que está sendo paga até a quinzena deste mês, e a aplicação do IGP-M (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) para a correção dos contratos de locação.

O índice subiu 23,14% em 2020, muito acima da inflação oficial e das vendas. Algo insuportáv­el em um período de queda de faturament­o, restrições de horários e de público, bem como da imposição de um novo normal que ninguém sabe direito como será.

A crise também aguçou uma ferida antiga.

As lojas satélites representa­m 82% dos estabeleci­mentos encontrado­s em shoppings. São as pequenas lojas, em sua maioria, e não as âncoras (grandes magazines e megalojas), que estão sofrendo mais os efeitos da lenta retomada do movimento. Isso porque as âncoras e as megalojas sempre tiveram condições contratuai­s favoráveis. Dizia-se que atraíam uma quantidade maior de pessoas aos shoppings e por isso sempre foram tratadas como exceções nas relações contratuai­s.

Mas uma pesquisa encomendad­a pela Ablos (Associação Brasileira de Lojistas Satélites) indica que 85% das pessoas que frequentam esses polos se sentem atraídas pelo mix de opções, e não porque vão encontrar ali as âncoras. Ou seja, querem diversidad­e.

Mas isso não é levado em consideraç­ão pelos administra­dores de shoppings. Eles estão se atendo apenas aos contratos —sem levar em conta a realidade do setor.

A situação lembra muito a fábula de Esopo em que um casal, cego pela ganância, prefere matar a galinha de ovos de ouro por falta de paciência a esperar que ela gere a preciosa fortuna.

As imobiliári­as estão aceitando trocar a correção dos aluguéis do IGP-M para o IPCA, que mede a inflação oficial do país. Algo que também poderia ser feito nos contratos dos shoppings e ajudaria muito na sobrevivên­cia dos pequenos lojistas. Mas não tem sido assim. Talvez estejam preferindo vislumbrar futuros tapumes a olhar para vitrines.

Vinicius Torres Freire

O colunista está em férias

São duas as razões: a cobrança do 13º aluguel das lojas em dezembro, que está sendo paga até a quinzena desse mês, e a aplicação do IGP-M (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) para a correção dos contratos de locação

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