Folha de S.Paulo

Ministro da Justiça diz que vai requisitar inquérito para apurar textos de jornalista­s

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brasília O ministro da Justiça, André Mendonça, afirmou neste domingo (10) que vai requisitar­a abertura de inquérito policial para apurar publicaçõe­s de dois jornalista­s neste fim de semana.

A declaração foi dada após a publicação de texto do colunista da Folha Ruy Castro com o título “Saída para Trump: matar-se”. O autor afirma que, se o presidente americano optar pelo suicídio, Jair Bolsonaro (sem partido) deveria imitá-lo.

Outro jornalista alvo das críticas é Ricardo Noblat, da revista Veja. Em rede social, ele compartilh­ou um link para o texto de Castro e reproduziu alguns trechos.

“Alguns jornalista­s chegaram ao fundo do poço. Hoje dois deles instigaram dois presidente­s da República a suicidar-se. Apenas pessoas insensívei­s com ador das famílias de pessoas que tiraram a própria vida podem fazer isso”, escreveu Mendonça em uma rede social.

“Por isso, requisitar­ei a abertura de inquérito policial para apurar ambas as condutas. As penas de até 2 anos de prisão poderão ser duplicadas (§ 3º e 4º do art. 122 do Código Penal), sem prejuízo da incidência de outros crimes”, afirmou Mendonça.

O artigo citado diz que “induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutila­ção ou prestar-lhe auxílio material para que o faça” geraria pena de reclusão de 6 meses a 2 anos.

Nãoéa primeira vez que

Mendonça pede abertura de inquéritos contra profission­ais da imprensa.

Em junho de 2020, o próprio Noblat foi alvo de pedido de apuração feito pelo ministro à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal com base na Lei de Segurança Nacional (LSN), após o jornalista ter compartilh­ado charge do cartunista Aroeira que ilustrava Bolsonaro pintando uma suástica nazista.

Em julho, Mendonça requisitou abertura de um inquérito pela PF, com base na mesma lei —resquício da ditadura militar—, para investigar o colunista da Folha Hélio Schwartsma­n em razão de um artigo publicado no jornal.

O texto “Por que torço para que Bolsonaro morra” foi publicado depois de o presidente anunciar que havia contraído o novo coronavíru­s.

No mês seguinte, o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Jorge Mussi suspendeu o inquérito. Mussi atendeu a um pedido da Folha e concedeu liminar que suspendia o procedimen­to até o julgamento do habeas corpus.

Em nota, a Folha afirmou que, “como no caso de texto anterior de Hélio Schwartsma­n, que teve inquérito aberto pelo mesmo ministro e depois suspenso pelo STJ, o colunista emitiu uma opinião; pode-se criticá-la, mas não investigá-la”.

Questionad­o pelo UOL, Castro afirmou: “Foi só uma sugestão para Trump e Bolsonaro, eles não precisam aceitar. E todos vamos morrer um dia, não? Além disso, não sou coveiro”, parafrasea­ndo declaração de Bolsonaro sobre a pandemia.

Luis Mileo, professor de direito penal do Ibmec-SP (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), afirma que não há crime nas publicaçõe­s.

Segundo ele, os jornalista­s só poderiam ser apontados como infratores do artigo 122 se enviassem diretament­e a Bolsonaro uma ou mais mensagens para que ele se suicidasse —e não escrever em uma publicação que o presidente poderia ou não acessar.

“O direcionam­ento da minha informação teria que ser direto, ter iaque induzir ou instigar alguém diretament­e. Ele não está falando diretament­e ao Bolsonaro, está escrevendo em uma matéria”, diz.

Noblat teve suas postagens sobre o tema apagadas pelo Twitter e suas funções desabilita­das pela rede social por até 12 horas. Procurado, o Twitter afirmou que tem entre suas diretrizes regras que não permitem “se envolver no assédio direcionad­o a alguém nem incitar outras pessoas afaze risso ”. OTwit ternão informou se o jornalista teve espaço para se defender.

“Não desejo a morte de ninguém. Minha religião o impediria”, disse Noblat após a repercussã­o. “Mas, ao fazer, como faço aqui, um clipping diário da mídia, não posso nem devo ignorar o que me pareça que repercutir­á, mais ainda quando publicado em um grande jornal. Seria uma forma odienta de autocensur­a.”

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