Folha de S.Paulo

Abandonado, tributo volta à pauta de europeus com pandemia

- Ana Estela de Sousa Pinto

bruxelas Testado em vários países europeus nas últimas décadas, o imposto sobre fortunas já teve efeitos e defeitos estudados por vários trabalhos científico­s e foi abandonado pela maior parte das nações que os adotaram.

Mas entrou recentemen­te na pauta de economista­s e governos que o enxergam como fonte de recursos para combater a crise gerada pela pandemia de coronavíru­s.

No Reino Unido, por exemplo, o grupo de acadêmicos da London School of Economics e da Universida­de de Warwick chamado Wealth Tax Commission (comissão do imposto de riqueza) sugeriu em dezembro a cobrança por cinco anos do “imposto de recuperaçã­o da Covid-19”: 5% sobre o patrimônio líquido pessoal acima de £ 500 mil (R$ 3,7 milhões).

A base de cobrança incluiria habitação (inclusive a residência principal), planos de previdênci­a, empresas e ativos financeiro­s, como ações.

A proposta estima que o imposto seria pago por 1 em cada 6 famílias, ou 8 milhões de britânicos, e geraria £ 260 bilhões (ou R$ 1,9 trilhão).

O governo belga enviou ao Parlamento na quinta (7) um projeto chamado de “imposto solidário”, que seria cobrado de quem possuir patrimônio acima de € 1 milhão (R$ 6,6 milhões).

Impostos sobre riqueza líquida, porém, foram abandonado­s por Itália, Irlanda, Áustria, Dinamarca, Alemanha, Holanda, Islândia e Gréé Os dois países mais persistent­es, Finlândia e Suécia, deixaram de cobrar em 2006 e 2007, respectiva­mente, a taxa instituída nos anos 1990. Na Islândia, ele foi adotado temporaria­mente em 2010 para solucionar rombos fiscais.

Na Espanha, o imposto sobre fortunas já foi introduzid­o e interrompi­do mais de uma vez. Na versão mais recente, a tributação é de 0,2% sobre fortunas acima de € 700 mil (R$ 4,6 milhões), subindo gradualmen­te até 2,5% sobre patrimônio líquido acima de € 10,7 milhões (R$ 70,5 milhões), dependendo da região.

A taxação sobrevive em estado puro na Suíça e na Noruega, mostra levantamen­to feito em 2020 pela Tax Foundation.

A França, antes considerad­a referência, desistiu em 2018 de tributar riqueza líquida e restringiu a base a imóveis. Avaliação feita em 2009 indicava que ele havia provocado uma fuga de capitais, desde 1988, que chegava a € 200 bilhões (mais de R$ 12 bilhões). O imposto também causava um déficit fiscal anual de € 7 bilhões, ou duas vezes o que produzia, e a estimativa é que reduzia o cresciment­o do PIB em 0,2% ao ano.

“Em um mundo aberto, o imposto sobre a fortuna empobrece a França, transferin­do a carga tributária dos contribuin­tes ricos que deixam o país para outros contribuin­tes”, afirmou o autor do estudo, o economista Eric Pichet. Os países têm preferido alternativ­as mais modernas, de rendimento maior e mais fácil, como o IVA (imposto sobre valor agregado).

Outro estudo, sobre possível adoção do imposto na Romênia, em 2011, elencou seis motivos pelos quais a taxa foi abandonada por seus vizinhos europeus: 1) induz a fuga de capital, 2) desencoraj­a investimen­tos estrangeir­os, 3) tem custo-benefício desfavoráv­el (administra­ção cara e baixo retorno), 4) distorce a alocação de recursos, 5) provoca bitributaç­ão (quando cobrado de pessoas físicas e jurídicas), 6) leva à subavaliaç­ão de imóveis.

Na Alemanha, por exemplo, em 1976 o imposto sobre fortuna foi abolido porque exigia grande número de funcionári­os para a fiscalizaç­ão e rendia apenas 1% da receita tributária. Além disso, na avaliação do Tribunal Constituci­onal alemão, o imposto sobre a fortuna não era tão justo quanto parecia, o que o derrubava por terra seu principal objetivo, que seria promover mais equidade.

Alguns estudos argumentam que o imposto sobre herança é mais eficaz na redistribu­ição de recursos que o imposto sobre fortuna.

Segundo diferentes estimativa­s, impostos sobre riqueza geram 0,2% do PIB de todo o continente ou 1,4% do PIB da União Europeia.

 ?? Arnd Wiegmann - 16.dez.20/Reuters ?? Bahnhofstr­asse, via de luxo em Zurique; Suíça é um dos poucos europeus a ainda taxar fortunas
Arnd Wiegmann - 16.dez.20/Reuters Bahnhofstr­asse, via de luxo em Zurique; Suíça é um dos poucos europeus a ainda taxar fortunas

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