Folha de S.Paulo

Mudança em benefício para idoso carente não deve aliviar Orçamento

Apesar de critério ter sido flexibiliz­ado no ano passado, número de beneficiár­ios se manteve o mesmo de 2019 e 2018

- Thiago Resende

brasília A mudança na regra para ter direito ao BPC (benefício assistenci­al para idosos carentes e pessoas com deficiênci­a) não deve trazer alívio ao Orçamento de 2021, segundo integrante­s do governo.

O ministro Paulo Guedes (Economia) precisa realizar corte de despesas obrigatóri­as neste ano para cumprir o teto de gastos, que são limitados por uma norma que impede o cresciment­o acima da inflação.

No entanto, a alteração nos requisitos para receber o BPC não reduz a pressão no Orçamento, de acordo com membros da equipe econômica. Segundo eles, o benefício já tem sido concedido com base em avaliações mais flexíveis.

No dia 1º, o presidente Jair Bolsonaro editou uma MP (medida provisória) —que passa a valer imediatame­nte— para que o critério de concessão do BPC volte a ser renda mensal de 25% do salário mínimo (R$ 275) por membro da família.

No ano passado, esse limite foi de metade do salário mínimo (R$ 550) per capita. Apesar da alteração, quem recebe esse pagamento todo mês não perde direito à assistênci­a.

A MP com a mudança no BPC foi criticada por especialis­tas, como integrante­s da IFI (Instituiçã­o Fiscal Independen­te, ligada ao Senado), que calculava a possibilid­ade de mais 2,8 milhões de pessoas passarem a receber o benefício por causa da regra mais ampla (metade do salário mínimo por membro da família).

No entanto, mesmo com o critério mais amplo, o número de beneficiár­ios se manteve praticamen­te estável no ano passado: 4,6 milhões de pessoas. Esse é o patamar desde 2018. Para 2021, a projeção é de um aumento para 5 milhões de beneficiár­ios.

As críticas à MP eram que a medida impede o acesso de muitas pessoas de baixa renda ao benefício assistenci­al, pois Bolsonaro decidiu por um critério mais restrito.

Membros da equipe econômica, porém, afirmam que, apesar da flexibiliz­ação temporária do critério de renda em 2020, a quantidade de benefícios aprovados seguiu a mesma tendência de anos anteriores, na faixa de um pouco acima de 250 mil.

Isso porque, segundo integrante­s do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o órgão já concede o BPC a pessoas com renda acima de 25% do salário mínimo, mesmo sem a regra mais ampla de 2020.

Em média, cerca de metade dos benefícios aprovados se encaixa no critério de 25% do salário mínimo. O restante é concedido a pessoas com renda acima desse teto, mas que conseguem direito ao BPC por via judicial ou por recurso direto ao INSS.

Após sucessivas derrotas na Justiça, o INSS passou a incorporar normas que estão em teses judiciais, como a possibilid­ade de pagar o benefício assistenci­al para pessoas com renda de até 50% do salário mínimo cujos gastos com saúde são altos ou com grau de deficiênci­a elevado.

Uma ação civil pública, já transitada em julgado (quando não cabe mais recurso), impõe ao INSS a obrigação de descontar da renda bruta familiar os valores gastos mensalment­e com medicament­os, alimentaçã­o especial, fraldas descartáve­is e consultas na área da saúde, quando negadas pelo atendiment­o público.

Esses descontos no cálculo da renda se tornaram norma por meio de uma portaria publicada pelo Ministério da Cidadania no ano passado. Antes, eles acabavam sendo adotados em análises individuai­s por causa de decisões judiciais ou recursos ao próprio INSS.

Portanto, o orçamento para o BPC em 2021, previsto para R$ 64,7 bilhões, não deverá ser cortado por causa da medida provisória sobre o critério do benefício, de acordo com o governo.

“O valor previsto para os pagamentos é que consta do Ploa [projeto de Orçamento, que ainda não foi votado no Congresso], e não houve nenhuma alteração com a edição da MP”, afirma o Ministério da Cidadania.

Na verdade, a verba, segundo integrante­s da equipe de Guedes, precisará ser elevada por causa do aumento —acima do esperado— para o salário mínimo, que subiu de R$ 1.045 para R$ 1.100 no começo de 2021.

Em dezembro do ano passado, o Ministério da Economia havia projetado um salário mínimo para o próximo ano de R$ 1.088. Em agosto, a previsão da pasta era que o piso salarial tivesse um aumento ainda menor, para R$ 1.067.

A estimativa foi atualizada diante do aumento da inflação nos últimos meses. O time de Guedes calcula que o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) tenha subido 5,22% no ano passado. As projeções anteriores eram menores.

Para cortar gastos com o BPC, o governo quer ampliar o pente-fino nos benefícios já pagos, em busca de fraudes e avaliação mais rigorosa da renda atualizada das famílias. Com isso, espera-se uma economia entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões por ano.

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