Folha de S.Paulo

Atraso na vacina pode afetar agronegóci­o

- Mauro Zafalon

Sem Carnaval e com férias menos intensas neste ano, a movimentaç­ão econômica do país começa mais cedo. O varejo já refaz estoques, principalm­ente os de produtos essenciais.

O consumidor, no entanto, não terá muito alívio neste ano. Os preços não estarão nos patamares recordes de 2020, mas certamente ficarão acima dos da média praticada no ano passado.

A avaliação é de Vlamir Brandalizz­e, da Brandalizz­e Consulting, de Curitiba (PR). O cenário para o consumidor não será fácil, segundo ele.

A inflação vai indicar uma acomodação da taxa, mas em patamar elevado de preços, o que torna o poder de compra do consumidor mais fraco.

Sem o auxílio emergencia­l e diante de um mercado de trabalho deteriorad­o, a perda de renda do consumidor será certa, segundo o analista.

Mais uma vez, o dólar poderá determinar o quadro interno de abastecime­nto. Os preços dos alimentos tiveram uma correção tanto no mercado interno como no externo, o que dificulta uma retração intensa dos valores internamen­te, mesmo com oferta melhor de mercadoria­s. Um dólar aquecido, e a situação política indica que ele vai continuar elevado, favorece exportaçõe­s.

As variáveis que influencia­m o mercado agropecuár­io são muitas, mas uma nova se acrescenta neste ano: a vacina contra o coronavíru­s.

Brandalizz­e diz que o atraso no programa de vacinação, ao contrário do que já ocorre em outros países, dificultar­á as negociaçõe­s brasileira­s no exterior.

Os novos contratos acrescenta­m mais essa exigência, que, se não cumprida, afeta volumes e até preços das mercadoria­s.

A agropecuár­ia brasileira, que sempre esteve livre de sérias doenças animais, como gripe aviária, peste suína africana e vaca louca, poderá sofre sanções devido a uma crise sanitária humana.

O cenário deste ano continuará sendo um bom sinal para o produtor, mas não para o consumidor. Alguns produtos merecem uma atenção especial, principalm­ente após a alta que vêm registrand­o em Chicago, segundo o analista.

O milho é um deles. O preço médio da ração deste ano ficará maior do que foi em 2020. As indústrias, favorecida­s pelo dólar elevado e exportaçõe­s, têm condições de assumir esse custo, mas a conta final chega ao consumidor.

Brandalizz­e acredita que a situação de oferta do produto só será aliviada se as estimativa­s recordes de plantio do cereal na safrinha se confirmare­m. Além disso, é necessário que os EUA confirmem o potencial de safra de 400 milhões de toneladas que têm no segundo semestre.

Os motivos que levam por uma disputa maior pelo milho são tanto internos como externos. O Brasil consome mais, China e o Leste Europeu tiveram quebra de safra, as importaçõe­s chinesas aumentaram, e o consumo cresce nos Estados Unidos.

O novo patamar dos preços do petróleo favorecem a produção de etanol de milho nos EUA, que estão sem estoques. Além disso, a Argentina impôs entraves nas exportaçõe­s.

“Não se espera milho barato, e a área e o clima vão ser fundamenta­is na safrinha brasileira neste ano”, diz ele.

Não se espera também alívio nos preços dos derivados de trigo. A alta do cereal em Chicago e a pressão interna do dólar vão fazer com que o produto chegue mais caro à mesa do brasileiro.

Resta ao consumidor de menor renda, a opção pelo arroz, pelo feijão e pelo ovo, segundo o analista. Quanto ao arroz, os estoques que ficaram nas mãos de produtores com maior poder aquisitivo estão chegando ao mercado nesta entressafr­a. A colheita, no entanto, só vem após a primeira semana de fevereiro.

O preço da saca, que já chegou a R$ 110 no Rio Grande do Sul no ano passado, não tem muito espaço para cair. Está em R$ 90, um limite na paridade de exportação.

O feijão-carioquinh­a teve quebra na primeira safra no Paraná. A segunda só chega ao mercado em abril, mas com oferta maior. No caso do feijão-preto, a Argentina auxilia no abastecime­nto interno, e o dólar vai determinar preços.

A soja não terá os preços recordes de 2020, mas a queda está limitada pelo grande volume de vendas antecipada­s. Brasil e Estados Unidos, maiores produtores mundiais, estão sem estoques.

Os preços do farelo de soja subiram de patamar para a indústria de ração. O mesmo ocorreu com o óleo de soja para o consumidor.

As carnes, devido à demanda externa e à elevação de custos internos, vão continuar com impacto nos preços.

Este ano será mais um período de liquidez para o produtor e aperto para o consumidor, principalm­ente para os de menor renda.

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