Com Doria ausente, governo se cerca de cientistas renomados
são paulo Em meio a questionamentos sobre falta de transparência na divulgação dos dados da Coronavac, o governo João Doria (PSDB) se cercou de vários cientistas e profissionais renomados durante o anúncio da eficácia geral da vacina, de 50,38%, antecipada pela Folha.
O anúncio contou com a presença de 13 especialistas, incluindo profissionais independentes, sem ligação com o governo estadual e seu comitê de contingência. Doria, porém, desta vez não estava presente.
A assessoria de Doria disse à Folha que ele não vai a entrevistas coletivas do Instituto Butantan e que, devido ao “tema técnico, ele deixa para os cientistas”. O governador, porém, participou da coletiva em que foi divulgado o percentual anterior, mais positivo.
No último dia 7, o governo Doria divulgou o percentual parcial de 78% de eficácia do imunizante para casos leves e 100% de pacientes moderados, graves ou mortos evitados pela Coronavac. No entanto, deixou uma série de lacunas, que foram criticadas por cientistas. O contrato do Butantan com a chinesa Sinovac impedia a divulgação de dados sem autorização prévia.
O percentual de eficácia nesta terça surpreendeu, uma vez que está no limite do aceitável. Mas os especialistas de fora trazidos pelo governo ressaltaram a importância da Coronavac, independentemente da eficácia geral menor, como uma vacina “possível”.
Entre os convidados que não fazem parte do núcleo do governo, por exemplo, está a doutora em microbiologia e presidente do Instituto Questão de Ciência, Natalia Pasternak, que foi uma das vozes que pediram a divulgação de dados brutos.
Segundo sua assessoria, Pasternak foi convidada por Doria a participar do evento como consultora independente.
A pesquisadora parabenizou o Butantan por finalmente divulgar os dados. “Como todo resultado, esse resultado tem os seus sucessos e limitações. Tanto os sucessos como as limitações devem ser comunicados de uma forma clara, para que a gente tenha uma sociedade segura e uma sociedade que se sinta confortável com esses dados”, disse.
Outros profissionais presentes no evento foram o infectologista Sérgio Cimerman, do Hospital Emílio Ribas; Rosana Richtmann, do Instituto de Infectologia do Hospital Emílio Ribas; Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações; e Marco Aurélio Safadi, presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria.
Safadi citou vacinas de outras doenças já aplicadas, como a de rotavírus, coqueluche e gripe, com eficácia parecida à da Coronavac.
“Para mim o número mais importante continua sendo o 78% [de prevenção nos casos leves]. Porque esse número consegue ter um impacto muito grande na carga da doença no nosso país e na sobrecarga de trabalho dos profissionais de saúde”, avaliou Richtmann.
Também estiveram presentes no anúncio profissionais do Instituto Butantan e da Secretaria da Saúde.
Em nota, o governo de São Paulo diz lamentar que a Folha ignore iniciativas do estado para dar transparência aos dados da vacina e as ações de combate à pandemia.
“São Paulo é o único estado brasileiro que realiza coletivas de imprensa semanais sobre esses assuntos [...], com autoridades públicas e especialistas em infectologia e imunologia à disposição de questionamentos feitos ao vivo por jornalistas sem qualquer combinação prévia”, afirma o texto.
Segundo o governo, o imunizante do Butantan foi o único no Brasil que proporcionou à imprensa oportunidades de indagações pormenorizadas sobre o estudo realizado.
“O convite a cientistas que não integram o corpo técnico do Butantan reforça ainda mais o compromisso para apresentar informações corretas, de forma oficial, ao maior número possível de pessoas sem qualquer cerceamento de ideias e favorecendo o contraponto”, diz trecho da nota.