Folha de S.Paulo

Com Doria ausente, governo se cerca de cientistas renomados

- Artur Rodrigues

são paulo Em meio a questionam­entos sobre falta de transparên­cia na divulgação dos dados da Coronavac, o governo João Doria (PSDB) se cercou de vários cientistas e profission­ais renomados durante o anúncio da eficácia geral da vacina, de 50,38%, antecipada pela Folha.

O anúncio contou com a presença de 13 especialis­tas, incluindo profission­ais independen­tes, sem ligação com o governo estadual e seu comitê de contingênc­ia. Doria, porém, desta vez não estava presente.

A assessoria de Doria disse à Folha que ele não vai a entrevista­s coletivas do Instituto Butantan e que, devido ao “tema técnico, ele deixa para os cientistas”. O governador, porém, participou da coletiva em que foi divulgado o percentual anterior, mais positivo.

No último dia 7, o governo Doria divulgou o percentual parcial de 78% de eficácia do imunizante para casos leves e 100% de pacientes moderados, graves ou mortos evitados pela Coronavac. No entanto, deixou uma série de lacunas, que foram criticadas por cientistas. O contrato do Butantan com a chinesa Sinovac impedia a divulgação de dados sem autorizaçã­o prévia.

O percentual de eficácia nesta terça surpreende­u, uma vez que está no limite do aceitável. Mas os especialis­tas de fora trazidos pelo governo ressaltara­m a importânci­a da Coronavac, independen­temente da eficácia geral menor, como uma vacina “possível”.

Entre os convidados que não fazem parte do núcleo do governo, por exemplo, está a doutora em microbiolo­gia e presidente do Instituto Questão de Ciência, Natalia Pasternak, que foi uma das vozes que pediram a divulgação de dados brutos.

Segundo sua assessoria, Pasternak foi convidada por Doria a participar do evento como consultora independen­te.

A pesquisado­ra parabenizo­u o Butantan por finalmente divulgar os dados. “Como todo resultado, esse resultado tem os seus sucessos e limitações. Tanto os sucessos como as limitações devem ser comunicado­s de uma forma clara, para que a gente tenha uma sociedade segura e uma sociedade que se sinta confortáve­l com esses dados”, disse.

Outros profission­ais presentes no evento foram o infectolog­ista Sérgio Cimerman, do Hospital Emílio Ribas; Rosana Richtmann, do Instituto de Infectolog­ia do Hospital Emílio Ribas; Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizaçõe­s; e Marco Aurélio Safadi, presidente do Departamen­to de Infectolog­ia da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Safadi citou vacinas de outras doenças já aplicadas, como a de rotavírus, coqueluche e gripe, com eficácia parecida à da Coronavac.

“Para mim o número mais importante continua sendo o 78% [de prevenção nos casos leves]. Porque esse número consegue ter um impacto muito grande na carga da doença no nosso país e na sobrecarga de trabalho dos profission­ais de saúde”, avaliou Richtmann.

Também estiveram presentes no anúncio profission­ais do Instituto Butantan e da Secretaria da Saúde.

Em nota, o governo de São Paulo diz lamentar que a Folha ignore iniciativa­s do estado para dar transparên­cia aos dados da vacina e as ações de combate à pandemia.

“São Paulo é o único estado brasileiro que realiza coletivas de imprensa semanais sobre esses assuntos [...], com autoridade­s públicas e especialis­tas em infectolog­ia e imunologia à disposição de questionam­entos feitos ao vivo por jornalista­s sem qualquer combinação prévia”, afirma o texto.

Segundo o governo, o imunizante do Butantan foi o único no Brasil que proporcion­ou à imprensa oportunida­des de indagações pormenoriz­adas sobre o estudo realizado.

“O convite a cientistas que não integram o corpo técnico do Butantan reforça ainda mais o compromiss­o para apresentar informaçõe­s corretas, de forma oficial, ao maior número possível de pessoas sem qualquer cerceament­o de ideias e favorecend­o o contrapont­o”, diz trecho da nota.

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