Força-tarefa faz jornada dupla em análise de uso emergencial
Grupo reúne 42 técnicos de três áreas; diretoria suspendeu agendas para estudar os imunizantes
A análise dos pedidos de uso emergencial de vacinas fez a Anvisa criar grupo com 42 pessoas de diferentes áreas em jornadas de 16h. No domingo (17), cinco diretores decidirão as liberações em reunião transmitida ao vivo.
brasília A análise dos pedidos de uso emergencial de vacinas contra a Covid-19 fez a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) criar um grupo com 42 servidores de diferentes áreas, implementar reunião diária para discutir os dados e suspender agendas não ligadas a vacinas na diretoria mais à frente do tema.
A corrida para análise começou na sexta-feira (8), quando os primeiros pedidos para autorização de uso emergencial foram protocolados pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e pelo Instituto Butantan.
A primeira tem um acordo com a farmacêutica AstraZeneca para obter doses da vacina de Oxford, e a segunda firmou parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac para fazer a Coronavac.
Desde então, a verificação dos dados –etapa que deve embasar a decisão de um possível aval para aplicação das doses no Brasil– ocorre por meio de um comitê formado principalmente por técnicos das áreas de medicamentos, fiscalização e monitoramento, além de membros de outras diretorias da Anvisa.
A área de medicamentos, com 12 servidores dedicados à tarefa, é quem está coordenando a análise. No grupo estão biomédicos, estatísticos, biólogos, farmacêuticos e médicos.
Farmacêutico e servidor de carreira da agência, o gerente da área de medicamentos, Gustavo Mendes, está à frente da comissão.
Para fazer a análise, parte dos servidores se dividiu entre os dois processos —da Fiocruz e do Butantan.
Já o grupo da área de medicamentos se divide por tipo de demanda –um grupo, por exemplo, verifica dados de eficácia, enquanto outros checam dados de qualidade e o protocolo de estudos clínicos. Há ao menos uma reunião diária para discutir os dados, além de contato frequente com os laboratórios.
A agência não informa o tamanho dos processos. Fontes do Butantan dizem que o relatório sobre a vacina Coronavac soma cerca de 10 mil páginas. Já o da Fiocruz teria cerca de mil páginas em anexos.
Um painel acompanha a evolução das análises.
Até o início da tarde desta quarta-feira (13), cerca de 41% dos documentos enviados pelo Butantan já tinham a verificação concluída. Mas o instituto ainda precisava enviar mais dados para o processo.
Já os da Fiocruz somavam 33% entre os já concluídos. O restante ainda estava em análise ou dependia de informações complementares.
Segundo os técnicos, o grupo tem trabalhado cerca de 16 horas por dia. O objetivo é preparar dois relatórios, um para cada vacina, documento que deve basear a decisão de diretores sobre a liberação ou não dos imunizantes.
A discussão é prevista para ocorrer em reunião marcada para domingo (17). Haverá transmissão ao vivo.
A data corresponde a um dia antes do fim do prazo de dez dias definido para análise do uso emergencial das vacinas. No encontro, cinco diretores da Anvisa devem analisar o relatório técnico e votar, cada um, sobre o aval.
Embora siga o padrão de outras análises, o modelo é inédito em termos de vacinas, já que, até então, a agência não tinha uma regra que permitisse pedidos de uso emergencial —modelo que vale para vacinas que já tiveram dados de segurança e eficácia, mas cujos estudos ainda estão sendo concluídos.
Caso a decisão seja favorável ao aval, o Brasil já teria, em tese, autorização para começar a aplicar os imunizantes. O pontapé oficial para isso deve ser uma publicação no Diário Oficial da União, que informará sobre a decisão dos diretores.
Somados os pedidos de Butantan e Fiocruz, são, ao todo, 8 milhões de doses em análise para eventual liberação. Destas, 6 milhões são da Coronavac, e 2 milhões da vacina de Oxford, ambas importadas de outros países. O início da vacinação, no entanto, ainda deve depender da organização do Ministério da Saúde.
Alvo de críticas em relação à demora para definir a estratégia, o ministro da Saúde, general, Eduardo Pazuello, disse na segunda-feira (11) que pretende iniciar a imunização “no dia D” e “na hora H”.
O Ministério da Saúde avalia marcar o início da imunização contra a Covid em um evento no Palácio do Planalto na próxima terça-feira (19) com governadores. A ideia é vacinar um idoso e um profissional de saúde.
A agenda, porém, ainda não foi confirmada. A opção por fazer a cerimônia é avaliada pelo Ministério da Saúde. Pelo lado do Planalto, no entanto, ainda há dúvida sobre a realização do evento. Bolsonaro já disse que não vai se vacinar.
Decisão da agência será transmitida ao vivo neste domingo
brasília Com duas vacinas contra a Covid-19 aguardando aprovação no país, as atenções se voltam para a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), responsável pela liberação de imunizantes e medicamentos no Brasil.
Caberá neste domingo (17) a cinco membros da Diretoria Colegiada a autorização de uso emergencial das vacinas.
Segundo a Anvisa, no encontro de domingo os diretores deverão analisar os dados de relatório elaborado pela área técnica sobre os dois pedidos.
A partir desse parecer, o grupo decidirá em votação se liberará ou não a aplicação das vacinas. O encontro está previsto para ocorrer na parte da manhã, a partir das 10 horas. A expectativa é que a reunião dure 5 horas, sendo transmitida pelos canais digitais da Anvisa.
A necessidade de reunião entre os diretores se dá porque se trata de uso emergencial e em caráter excepcional das vacinas –no caso de pedidos de registro, a decisão cabe apenas à área técnica.
A data da reunião corresponde ao último dia do prazo definido pela agência para analisar os pedidos de uso emergencial de vacinas.
As regras para uso emergencial foram criadas em dezembro, e a vacina contra a Covid-19 será a primeira a ser aplicada dessa forma no país. Também será a primeira vez que uma reunião pública da Diretoria Colegiada da Anvisa acontece num domingo.
A agência analisa dois pedidos para esse aval neste momento. O primeiro foi feito pelo Instituto Butantan, que mantém uma parceria com a chinesa Sinovac. O laboratório busca autorização para uso de 6 milhões de doses da vacina Coronavac importadas da China no ano passado.
Já o segundo pedido foi feito pela Fiocruz, que mantém uma parceria com a farmacêutica AstraZeneca e Universidade de Oxford. A fundação pede autorização para uso de 2 milhões de doses que serão importadas da Índia.
A Diretoria Colegiada é formada por cinco membros, todos indicados no governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Dois são servidores de carreira da Anvisa.
Apesar da agência já ter dito muitas vezes que as decisões são técnicas, alguns diretores mantêm ligações de amizade, políticas ou ideológicas com o atual governo. A lista inclui um militar muito próximo a Bolsonaro, um apadrinhado do bloco político centrão e uma médica defensora do uso da hidroxicloroquina contra a Covid-19.
Em outubro de 2020, o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, negou à Folha que a agência pudesse postergar o aval a alguns imunizantes, como a Coronavac, por pressões do governo.
“Isso está previsto no Código Penal em algum lugar. Se estamos concebendo a possibilidade de alguém daqui intencionalmente procrastinar, postergar ou realizar qualquer impedimento para que um medicamento salve vidas... Eu jamais vou poder cogitar isso. E, se eu tomar conhecimento, tomarei todas as medidas cabíveis.”
Caso o aval às vacinas seja dado, o Brasil já poderá, em tese, aplicá-las. A medida vale a partir do momento em que a decisão for publicada no Diário Oficial da União, o que deve ocorrer no mesmo dia.
Mas o início da imunização dependerá da organização da campanha e da logística de distribuição de doses.
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, fretou um avião da companhia aérea Azul para buscar os 2 milhões de doses da vacina de Oxford na Índia. O voo deve sair de Recife nesta quinta-feira (14).
O Ministério quer marcar o início da imunização em evento no Palácio do Planalto na próxima terça (19) com governadores, vacinando um idoso e um profissional de saúde.
A agenda, porém, não foi confirmada. O ministro enfrenta críticas por não dar previsão exata para o início da imunização —nesta semana, disse apenas que deve ocorrer no “dia D” e na “hora H”.
A opção por fazer a cerimônia é avaliada pelo Ministério da Saúde. Pelo lado do Planalto, no entanto, ainda há dúvida sobre a realização do evento.
O início da campanha de vacinação no dia 19 de janeiro colocaria o governo federal à frente do governo paulista, que pretendia começar a imunização em 25 de janeiro e já declarou que poderia solicitar uma antecipação caso a Anvisa libere o uso das doses antes dos dez dias de análise.
No sábado (9), entretanto, a agência informou ter recebido todos os documentos da Fiocruz necessários para análise, mas apontou que ainda faltavam informações do Butantan sobre a Coronavac.
Logo após a divulgação de que faltavam dados, o governador paulista, João Doria (PSDB), cobrou “senso de urgência” à Anvisa. A agência, porém, diz que os dados já eram previstos entre os requisitos para uso emergencial.
Nos últimos meses, a Coronavac tem estado no centro de uma guerra política entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o governador paulista, que são adversários para as eleições de 2022.
Raquel Lopes e Renato Machado