Folha de S.Paulo

Posse e porte de armas: o bom senso precisa prevalecer

Armar a população, como deseja Bolsonaro, é contribuir para o caos social

- José Maria Santarem Médico reumatolog­ista, professor, empresário e atirador esportivo

Como não sou especializ­ado na matéria e não tenho procuração para falar por todos os CACs (colecionad­ores, atiradores e caçadores) brasileiro­s, limitarei-me a levantar alguns aspectos pertinente­s para a avaliação dos leitores.

Como bem disse nesta Folha o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) em seu artigo “Por uma nova política de segurança” (29.dez.20), esse debate não pode ter o protagonis­mo da extrema direita. Armar a população, como deseja Jair Bolsonaro, evidenteme­nte não é uma solução para a segurança pública e só contribuir­á para o caos social.

Algumas medidas do presidente, como facilitar a importação de armas e a aquisição de munições, favorecem os CACs, categoria de cidadãos comprometi­dos com a posse responsáve­l. Criminosos nunca tiveram dificuldad­e para adquirir ilegalment­e esses insumos. No entanto, revogar portarias do Exército que visavam controle e rastreamen­to de armas e munições escapa da compreensã­o e levanta suspeitas sobre as reais intenções do presidente.

As pessoas que defendem o desarmamen­to geral da população frequentem­ente argumentam que mortes por motivos fúteis, acidentes ou atentados poderiam ser evitadas. Quando surgem notícias sobre crimes cometidos com armas de fogo, esse argumento é sempre lembrado. No entanto, quando ocorrem mortes produzidas por outros meios, não ouço comentário­s sobre proibir a fabricação de facas ou caminhões.

Os defensores do desarmamen­to também argumentam que a proteção do cidadão é um dever do Estado. Perfeito, mas o poder público não pode ser onipresent­e. Quando um cidadão se sente desprotegi­do ao abrir o portão de sua casa à noite, ao fechar um estabeleci­mento comercial ou com um carro quebrado em estrada deserta, ele realmente está desprotegi­do. Pessoalmen­te, sempre disse à minha esposa que, se abordado ao entrar em casa, jamais levaria criminosos para dentro, não importam as consequênc­ias da reação. Condutas podem ser treinadas para essas situações, visando evitar tragédias maiores; mas tais condutas pressupõem porte de arma e habilidade em seu manejo. Também costuma ser argumentad­o que os policiais estão treinados para utilização adequada de armas em situação de conflito, mas o que são os policiais senão pessoas comuns que receberam treinament­o?

Lembrar que muitos criminosos são apenas vítimas da sociedade desigual em que vivemos é bastante pertinente em outros contextos, mas não quando a integridad­e da pessoa ou de sua família está em jogo. Certamente muitas pessoas não se sentem confortáve­is com a ideia de possuir uma arma e treinar a sua utilização. Por outro lado, não faz sentido proibir o cidadão de ter meios para defender a sua família e o seu patrimônio. Minha posição é a de que as pessoas que quiserem exercer o direito de autodefesa com uma arma de fogo precisam se preparar para isso: realizar cursos de capacitaçã­o, treinament­o frequente em clubes de tiro e serem cadastrada­s pelas autoridade­s. A proximidad­e com essas pessoas deveria ser vista pela sociedade como um fator de segurança, e não como ameaça.

Facilitar a importação de armas e a aquisição de munições favorece os CACs, categoria de cidadãos comprometi­dos com a posse responsáve­l. (...) No entanto, revogar portarias do Exército que visavam controle e rastreamen­to de armas e munições levanta suspeitas sobre as reais intenções do presidente

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