Compra de vacina para clínicas avança, diz setor
Dirigente de associação afirma que a indiana Bharat Biotech deve pedir registro definitivo de imunizante em fevereiro
são paulo O processo para a compra de 5 milhões de doses da vacina indiana Covaxin pelas clínicas privadas brasileiras está “muito bem encaminhado” e a aquisição será feita assim que sair registro definitivo do imunizante no Brasil.
A Bharat Biotech, fabricante da Covaxin, deve pedir o registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no próximo mês.
A informação é do presidente da ABCVAC (Associação Brasileira das Clínicas de Vacina), Geraldo Barbosa, que integrou a comitiva que visitou as instalações da empresa na Índia, na semana passada.
A negociação do setor privado para vacinação tem despertado polêmica. Especialistas em saúde pública dizem que, por se tratar de uma vacina ainda pouco disponível no mundo, a oferta no setor privado pode criar uma disputa com o SUS, aumentando as desigualdades e atrasando a imunização dos grupos prioritários.
Já as clínicas privadas argumentam que o objetivo não é competir, mas, sim, complementar a oferta prevista no SUS, atendendo, por exemplo, empresas que querem oferecer a vacina a empregados que não estão hoje nos grupos prioritários previstos pelo Plano Nacional de Imunização (PNI).
Segundo Barbosa, o que for adquirido pelas clínicas privadas não irá interferir nas negociações com o SUS. “Se essas vacinas não vierem para o mercado privado brasileiro, não virão nem para o Brasil. Vão para outro país”, reforça.
OMinistériodaSaúdejádisse queclínicasparticularesdevem seguir a ordem dos grupos prioritários, como consta no PNI.
A Bharat Biotech é uma das empresas que constam na carta de intenções do Ministério da Saúde, divulgada no dia 16 de dezembro, mas não há, até o momento, nenhum contrato formal para compra de doses pelo governo federal.
A vacina foi aprovada no último dia 3 pelas autoridades indianas, mas ainda está na fase três de testes e não teve a eficácia divulgada.
Segundo Barbosa, a aquisição da vacina pelo setor privado depende do fim dos trâmites legais junto aos órgãos reguladores brasileiros, fabricante e distribuidora/importadora. O executivo e a equipe da representante da Bharat Brasil foram recebidos nos dias 7 e 8 de janeiro no Genome Valley, distrito industrial de alta tecnologia e inovação em Hyderabad, na Índia.
Barbosa afirma que fez uma apresentação à diretoria da fabricante sobre o potencial do mercado brasileiro e sobre a necessidade de vacinar o contingente da população que está ativo no mercado de trabalho.
“Há uma resposta positiva do mercado corporativo, que tem procurado a ABCVAC e as clínicas para subsidiar a imunização de seus colaboradores.”
A Covaxin é desenvolvida em colaboração com o Conselho Indiano de Pesquisa Médica (ICMR) e o Instituto Nacional de Virologia (NIV) .
Conforme divulgado pela Bharat Biotech, os ensaios clínicos de fase 3 da Covaxin começaram em meados de novembro e envolvem 26 mil voluntários em toda a Índia. Nas fases 1 e 2, ela foi avaliada em cerca de mil indivíduos.
Vacinação no sistema privado na escassez vai prejudicar a fila
Com a tão aguardada chegada de vacinas contra a Covid-19 ao Brasil, surge então a discussão sobre quem deve conduzir a aplicação das vacinas.
Seria mais efetivo apenas o poder público exercer esse papel, seguindo os critérios da vulnerabilidade dos pacientes e o da prevenção da expansão da doença? Ou seria também papel da iniciativa privada disponibilizar a vacina para aqueles que estiverem dispostos a pagar pelas doses?
Essa questão não seria um problema, se não estivéssemos tratando de um bem vital que hoje está escasso em diversas partes do mundo. A princípio, não haveria nenhum problema de natureza moral se alguns serviços gratuitos de interesse público fossem também oferecidos de maneira remunerada pela iniciativa privada.
Este é um anseio natural num país desigual como o Brasil. Inclusive, a oferta de bens públicos abundantes pela iniciativa privada pode, em alguma medida, favorecer uma melhor alocação de recursos públicos para aqueles que mais necessitam.
Infelizmente, não é essa a realidade da vacina da Covid-19 no Brasil. Por decisão deliberada, falta de organização e coordenação das autoridades, teremos, ainda, por algum tempo, doses em número insuficiente para atender a toda a população.
Daí ser imperativo estabelecer uma escala de prioridades, que leve em consideração critérios morais, obedecendo aos valores da dignidade humana, da utilidade coletiva e da equidade, para a distribuição da vacina.
A vulnerabilidade da vida e da saúde da sociedade como um todo devem ter prioridade máxima. Aqueles que têm mais risco de morrer, caso contraiam o vírus, em face da idade e de comorbidades, deverão receber a dose primeiro.
Esse critério, além de atuar diretamente para salvar vidas, preservará o sistema de saúde para os demais, inclusive aqueles portadores de outras doenças sensíveis ao adiamento do tratamento.
Esse tem sido o critério, por exemplo, para organizar a fila de transplante de órgãos. Não se pode admitir que uma pessoa, pelo fato de ter mais recursos financeiros, possa comprar um órgão ou um lugar na fila, em detrimento de outros que têm maior urgência.
Também devem estar no início da fila de vacinação profissionais da saúde diretamente envolvidos no combate à pandemia e aqueles responsáveis por outros serviços essenciais para o funcionamento da sociedade, aqui incluídos os profissionais que trabalham com a educação de crianças e adolescentes.
Enquanto tivermos uma demanda muito maior do que a oferta de imunizantes, deveremos pautar a distribuição de vacinas conforme um plano de priorização moralmente defensável e sanitariamente sensato, que também incorpore questões como regiões com maior propagação e menor acesso a serviços de saúde.
A disponibilização de vacinas pelo sistema privado, enquanto ainda houver escassez, permitirá que aqueles que dispõem de recursos financeiros possam passar à frente na fila, ainda que não se encontrem nos grupos de maior risco ou não pertençam aos setores mais essenciais à manutenção do bom funcionamento da sociedade.
Mais do que isso, uma distribuição desordenada pode atrasar o objetivo maior: alcançarmos mais rapidamente a chamada imunidade de rebanho.
Uma pandemia como a que estamos vivendo testa nossa resiliência, criatividade, perseverança, autocontenção, capacidade organizacional e, fundamentalmente, nossa fibra ética. Esse é o momento de não deixar ninguém para traz, especialmente os mais vulneráveis.