Folha de S.Paulo

Quase metade do setor de transporte­s já fez cortes

Estudo da FGV indica que mais cortes virão, tanto em prestadora­s de serviço quanto na indústria

- Diego Garcia

Levantamen­to da FGV mostra que 45,9% das empresas de transporte­s rodoviário­s e 52,4% nos modais ferroviári­o, aéreo e aquaviário demitiram em 2020, sob efeito da pandemia. No setor automotivo, em torno de 45% das indústrias fecharam vagas.

Parte dessas companhias ainda prevê cortes neste semestre.

Trabalhado­res que atuam em empresas do ramo de serviços em transporte­s viram colegas perder o emprego em quase a metade das companhias em 2020.

Na indústria automotiva, o corte foi semelhante, em torno de 45%.

Em ambos os casos, parte das companhias ainda prevê demitir empregados neste primeiro semestre.

Essas empresas dependem da circulação de pessoas e mercadoria­s, comprometi­da com as restrições sociais impostas pelo novo coronavíru­s, cujos casos estão em ascensão novamente.

Um estudo de quesitos extraordin­ários aplicados nas Sondagens da FGV, em dezembro, mostra que 45,9% das empresas do ramo de transporte­s rodoviário­s fecharam vagas em 2020. Além disso, praticamen­te 20 de cada 100 delas preveem novos cortes até junho deste ano.

Dentre aquelas de transporte ferroviári­o, aéreo e aquaviário (que, na pesquisa, se encaixam na categoria “outros serviços de transporte”), 52,4% declararam que fecharam postos de trabalho.

“Esses segmentos muito impactados pela pandemia fizeram muitas demissões no ano, e a expectativ­a é que não piore mais. Mas existe um caminho lento de recuperaçã­o”, disse Rodolpho Tobler, um dos autores da pesquisa.

Na avaliação do pesquisado­r, a perspectiv­a do setor de serviços de transporte para 2021 é de, ao menos, sustentaçã­o do cenário atual—quase 70% esperam manter o quadro de funcionári­os. Mas a base de comparação é baixa, pois as perdas foram bastante expressiva­s no ano passado, durante a pandemia.

Ainda nos prestadore­s de serviços, o segmento ligado aos transporte­s que mais espera demitir em 2021 é o de armazenage­m, serviços auxiliares de transporte­s e correio, com expectativ­a em 20,3% das empresas é de novos cortes, sendo que 4 de cada 10 já demitiram no ano passado.

Do lado da indústria, a situação é semelhante. Nas fábricas de veículos automotore­s, houve redução no número de pessoas ocupadas em pelo menos 46,3% das companhias. E mais 11,3% ainda esperam demitir no primeiro semestre de 2021.

Nas indústrias de outros equipament­os de transporte, 20,6% reduziram em mais de 15% o contingent­e de trabalhado­res.

Tobler ressaltou que as expectativ­as para 2021 são incertas. O fim do auxílio emergencia­l, interrompi­do em dezembro, deixará a população com menos poder de compra ao mesmo tempo que o mercado de trabalho, especialme­nte o informal, não dá sinais de retornar aos níveis pré-pandemia tão cedo.

Além disso, há dúvidas sobre quando a vacinação contra a Covid será efetuada, limitando as previsões sobre a volta da circulação normal de pessoas.

“No setor de serviços, a situação é mais crítica. O ano de 2020 foi bem ruim, com pouquíssim­as empresas aumentando contrataçã­o e muitas fazendo demissão”, disse o pesquisado­r.

Na indústria, avalia Tobler, a crise pode estar sendo “parcelada”. Houve demanda aquecida no fim do ano passado, mas uma nova crise pode ocorrer ao longo de 2021.

De acordo com dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s), as vendas de veículos no Brasil subiram no fim do ano, mas não o suficiente para evitar que 2020 terminasse com queda de 26,2% sobre o ano anterior. Isso levou as vendas ao patamar de 2016, quando houve a crise econômica anterior no Brasil.

A produção diminuiu em 31,6%, e as receitas com exportaçõe­s (US$ 7,4 bilhões) foram menos da metade do que em 2017 (US$ 15,9 bilhões).

Para este ano, a Anfavea prevê aumento de 15% no licenciame­nto de veículos, 9% nas exportaçõe­s e 25% na produção. Essas projeções são insuficien­tes para a retomada ao nível pré-pandemia.

“Nunca foi tão difícil projetar os resultados de um ano, pois temos uma neblina à nossa frente desde março, quando começou a pandemia”, disse o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes.

Nos transporte­s coletivos, milhares de empregos foram perdidos Brasil afora. Armando Guerra Júnior, presidente da Fetranspor (Federação das Empresas de Transporte­s de Passageiro­s do Estado do Rio de Janeiro), disse que todas as 118 empresas do estado no setor esperam novas demissões neste ano.

“Em 2021, 100% das empresas vão demitir. A discussão é se demitem 40% ou 30% [do total de trabalhado­res]. Vai ser muita coisa. Estamos trabalhand­o com 62% do número de passageiro­s de antes da pandemia, mas tem empresa trabalhand­o a 73% e empresa a 46%”, analisou Guerra Júnior.

No Rio, o setor estima que a pandemia tenha afetado ou vá afetar o trabalho de 40 mil pessoas, entre os que já foram e os que serão demitidos após o período de estabilida­de proporcion­ado pelas medidas de preservaçã­o do emprego propostas pelo governo federal.

E não foi só nos transporte­s que os empregos foram dizimados. Segundo o estudo da FGV, a indústria de informátic­a e eletrônico­s teve perdas em 59% das empresas, fruto das mudanças nas taxas de câmbio em 2020.

Mais 32,3% ainda preveem cortes neste ano, o maior patamar apresentad­o na pesquisa.

“Esse segmento tem produtos dolarizado­s, peças importadas, o que impacta o preço. Em 2021, existe a incerteza principalm­ente em relação à renda, com as pessoas se contendo mais para gastar. Uma expectativ­a de vacina ainda pode trazer o setor mais ao normal, sem uma demanda tão aquecida”, disse Tobler.

Já 51% das empresas de serviços ligados às famílias tiveram perdas de empregos, sendo os maiores índices nos segmentos de alimentaçã­o (54,3%) e alojamento (50,6%), fruto do distanciam­ento social que fechou bares, restaurant­es e hotéis em todo o país, como forma de conter o avanço da Covid-19.

Tobler apontou que a pesquisa mostra um impacto muito grande no mercado de trabalho e liga o sinal de alerta para 2021.

Segundo ele, uma vacinação em grande escala pode melhorar o processo, mas o estudo sugere cautela, pois uma piora nos casos de Covid-19 pode ter como consequênc­ia um repique na recuperaçã­o do emprego.

No varejo de tecidos, vestuários e calçados, 40,7% das empresas demitiram trabalhado­res e mais 11,9% preveem novas demissões em 2021. Por outro lado, a indústria têxtil foi a que mais contratou, com 61,6% das companhias admitindo terem aumentado o contingent­e.

O setor de construção também viu alguns segmentos contratare­m. Nas obras de acabamento, 38,1% aumentaram o pessoal ocupado. Já em outros serviços para construção, 30,1% também contratara­m. Em serviços especializ­ados, 23,3% relataram números positivos.

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