Folha de S.Paulo

A matemática do impeachmen­t

- Bruno Boghossian

Jair Bolsonaro está mais próximo de eleger aliados para comandar a Câmara e o Senado do que de perder o cargo. O presidente já foi minoritári­o no Congresso, mas adquiriu proteção suficiente para ficar no poder, apesar do descalabro produzido pelo governo na pandemia.

Hoje, o cálculo do impeachmen­t beneficia Bolsonaro. Para que a destituiçã­o avance, são necessário­s os votos de 342 dos 513 deputados. Graças ao apoio do centrão, o governo tem a seu lado um bloco que pode superar 200 parlamenta­res, o que torna essa matemática impossível.

Presidente­s têm mais chances de escapar de processos desse tipo em ambientes políticos com alta fluidez ideológica. Como o centrão tem mais afinidades do que divergênci­as com Bolsonaro, o governo consegue atrair essas siglas com facilidade, distribuin­do cargos e verbas públicas.

Defensores do impeachmen­t argumentam que é necessário abrir o processo mesmo que não haja apoio inicial suficiente para derrubar o presidente. Segundo eles, é possível construir o placar ao longo do caminho, numa campanha que exponha os crimes de responsabi­lidade praticados por Bolsonaro e auxiliares.

Ainda que isso seja possível, uma força contrária também atua a favor do governo, nesse caso. Na largada, se a percepção dos parlamenta­res for que Bolsonaro tem condições de sobreviver, muitos escolherão ficar com o presidente para colher benesses oficiais. Com isso, o lado pró-impeachmen­t pode ficar mais perto dos 150 do que dos 342 votos.

Um processo frustrado tem seus custos. Uma vitória de Bolsonaro exporia a fragilidad­e da oposição e fortalecer­ia os vínculos do Congresso com o governo. O presidente diria que derrotou um golpe e desestimul­aria novos pedidos de destituiçã­o.

O impeachmen­t ainda depende de uma virada nas condições políticas e sociais. Às vésperas da queda de Fernando Collor, 84% dos brasileiro­s diziam que ele estava envolvido em corrupção. Agora, só 8% afirmam que Bolsonaro é o principal culpado pelas mortes na pandemia.

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