Folha de S.Paulo

Estudantes relatam temor de contágio e ansiedade antes da prova

- Juliana Mesquita

Para muitos alunos, o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) é, talvez, a única porta de entrada para a universida­de. Por isso, eles se dedicam ao máximo para ter um bom desempenho na prova. O exame por si só já exerce uma pressão e tanto sobre os estudantes. Mas como eles têm lidado com o assunto em meio a uma pandemia?

Sem o adiamento até então pelo MEC (Ministério da Educação), os estudantes devem realizar a primeira prova no próximo dia 17. Conheça alguns deles.

1 Giovanna dos Santos Pires da Silva, 17, Rio de Janeiro

A estudante já havia prestado a prova como treineira em 2019, mas neste ano é para valer. Com o foco de entrar para o curso de ciências sociais, Giovanna, assim como milhões de alunos no país, teve seus planos frustrados pela pandemia de Covid-19.

Aluna de escola particular, logo teve sua dinâmica de estudos totalmente alterada.

“Tem sido difícil estudar, minha maior dificuldad­e foi manter o foco. No começo a gente não tinha uma direção de quando a prova seria realizada, se as aulas presenciai­s voltariam, o que aconteceri­a Isso dava um desânimo”, diz.

“O peito apertava toda vez que eu pensava que era a minha grande oportunida­de de passar, que eu poderia estudar mais, já que estava em casa. Não diria tanta pressão externa, minha família sempre me apoia, mas me sinto mal de pensar que posso decepcioná-los”.

Além da própria segurança, ela teme pelos seus pais —ambos no grupo de risco da Covid-19. “Me sinto bastante apreensiva. É desrespeit­oso com a vida de nós, estudantes, nossos familiares e todas as pessoas envolvidas na aplicação da prova. Além de desrespeit­ar a votação —que escolheu a aplicação do exame em maio—, o Inep está indo contra as recomendaç­ões das instituiçõ­es de saúde.”

2 Thiago Martins Conceição, 19, Cuiabá, Mato Grosso

O estudante prestará o Enem pela terceira vez, para tentar ingressar na faculdade de psicologia. Ex-aluno de escola pública, Thiago teve dificuldad­es para conseguir estudar na pandemia.

Neste ano, ele conseguiu entrar para um cursinho prévestibu­lar, o MED acesso, oferecido por alunos que já passaram no vestibular para medicina e que agora ajudam estudantes de escolas públicas a ingressare­m na universida­de.

O ensino a distância, no entanto, foi difícil, já que Thiago não tinha um computador. O equipament­o foi adquirido com grande esforço por sua mãe.

A vontade de entrar para a universida­de é grande, mas o medo de prestar a prova nesse momento também.

“No passado, prestei o Enem em uma universida­de aqui na cidade onde não tem janela nem ventilação. Aí eu te pergunto: como fica quem irá realizar a prova este ano lá?”

O estudante ainda teme pela sua mãe, que faz parte do grupo de risco para as complicaçõ­es da Covid-19. Tudo isso o tem afetado diretament­e.

“Eu sofro de ansiedade, já parei semana passada na UPA, por receio, medo. Eu penso que tem mais pessoas assim no mesmo estado. E como sempre, somos deixados de lado, não temos voz”.

3 Larissa Andrade, 20, Carapicuíb­a, São Paulo

Ex-aluna de escola pública, Larissa prestará o Enem pela quarta vez. Seu sonho é cursar artes visuais. Para isso, ela se inscreveu em um cursinho pré-vestibular, mas nunca teve as aulas presenciai­s que estavam planejadas.

“No começo, eu conseguia acompanhar as aulas online regularmen­te, assim como realizar os exercícios propostos. Porém, com o tempo, a instabilid­ade afetou e muito no meu desempenho e na minha motivação; passei a me dedicar mais a procurar um emprego do que a estudar”.

Atualmente, ela trabalha como jovem aprendiz administra­tiva, mas vê no Enem a sua grande oportunida­de. Por outro lado, teme realizar a prova em meio à pandemia.

“É frustrante. Essa é a palavra que mais me cabe. Dedico anos da minha vida para o tão sonhado ingresso na faculdade, e quando finalmente sinto que minha hora pode ser essa, tenho medo. Medo de ficar doente, de contaminar minha família, de não ter tempo para conciliar com o emprego e ajudar com as contas.”

Larissa ainda diz que tem respeitado a quarentena desde o começo. “Cheguei a recusar vagas de emprego presencial para prezar a saúde dos daqui de casa. É um desrespeit­o com aqueles que estão seguindo as medidas de distanciam­ento”.

4 Flávia Bloisi Moraes, 19, Santa Terezinha, Bahia

Já é a quinta vez que a estudante vai prestar o Enem. Ela tem feito a prova desde o primeiro ano do ensino médio.

Ex-estudante da escola pública, Flávia sonha em cursar medicina. “O Enem significa uma porta de entrada para a universida­de, porque não tenho condições de me manter em uma faculdade particular.”

Para se preparar, ela estuda com a ajuda de canais do YouTube e com os livros que tem.

“Além de toda a pressão, da ansiedade por eu precisar passar no Enem, mas sem saber o que fazer caso eu não consiga, senti falta de um professor para me auxiliar e tirar dúvidas. Senti falta de um curso, mesmo que a distância, mas não tive condições de pagar um”.

Flávia ainda teme pelo seu bem-estar e de sua família ao prestar a prova. “O sentimento é de inseguranç­a, impotência e medo. Não tem como confiar nas medidas sanitárias que o governo diz adotar, mas não detalha quais são.”

 ??  ?? 1
1
 ?? Gabriel Cabral/Folhapress Fotos Arquivo Pessoal ?? 4
Gabriel Cabral/Folhapress Fotos Arquivo Pessoal 4
 ??  ?? 2
2
 ??  ?? 3
3

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil