Folha de S.Paulo

O clássico dos clássicos

Por mais de década, Santos e Palmeiras foi o jogo que mereceu a classifica­ção

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

Entrarei aqui no perigoso campo da memória.

Portanto, antecipo à rara leitora e ao raro leitor que não caberá o saudável e obrigatóri­o Erramos, mesmo porque o que seguirá pertence a quem conta a história, mesmo que sem exatidão devido à névoa do tempo que a envolve.

Certeza, apenas duas: se houve um jogo em São Paulo que mereceu ser chamado de clássico entre fins dos anos 1950 e toda a década seguinte, esse foi Santos e Palmeiras, os gigantes que farão a primeira decisão paulista da Libertador­es no lendário Maracanã carioca, embora merecesse ser disputada no Pacaembu, ainda mais porque, que pena!, sem as torcidas.

São lembranças de criança com 8, 9 anos, de adolescent­e até o começo da vida adulta, hoje aos 70. Começando pelo começo. O Supercampe­onato Paulista de 1959, decidido em três jogos pois os dois terminaram empatados com 63 pontos depois de 38 jogos, dados pesquisado­s.

Seria apenas um jogo, caso houvesse vencedor, mas terminou 1 a 1 e sob coro de “marmelada”, como se ambos quisessem fazer mais renda.

Veio o segundo embate e novo empate, 2 a 2. Então, fez-se a “negra”. Nova pesquisa, na revista Superinter­essante: “Pouca gente sabe, mas essa é uma das expressões mais politicame­nte incorretas da língua portuguesa! Sua origem remonta à época da escravatur­a, que, no Brasil, durou até 1888. ‘Era comum entre os senhores de escravos, quando se reuniam para disputar algum jogo, adotar como premiação a posse de uma escrava. Por isso, eles diziam estar ‘disputando a negra’’, afirma o etimólogo Deonísio da Silva, da Universida­de Federal de São Carlos. Consta que os feitores responsáve­is por castigar escravos também promoviam algum tipo de competição para ter o privilégio de punir as mulheres mais atraentes, com a intenção de usá-las sexualment­e. Isso também teria contribuíd­o para a expressão se disseminar pelo país, até se tornar popular não apenas no futebol, na primeira metade do século XX, como em todos os outros jogos e esportes”.

Com gol em cobrança de falta pelo ponta-esquerda Romeiro, o Palmeiras ganhou por 2 a 1 e foi o campeão.

Assim, evitou o bicampeona­to santista, na verdade o penta porque o Santos ganhou os títulos seguinte sem 1960/61 e 62.

O mesmo alviverde impediu o te traem 1963 e obi em 1966, ou, tudo somado, o do duodecacam­peão (12 vezes seguida) de quem sagrou-se tricampeão em 1967/68 e 69. Agora, a confusão. Trata-se do maior jogo entre ambos, em 1959, pelo RioSão Paulo, sem decidir nada, 7 a 6 para o Santos.

Que saiu atrás, fez 2 a 1, tomou o 2 a 2, fez 5 a 2 ao fim do primeiro tempo, viu o Palmeiras virar para 6 a 5 e, com dois gols de Pepe, aos 38 e 43 minutos, venceu, causando uma morte e mais quatro infartos no Pacaembu.

Aconteceu num dia 6 de março, dois dias depois de meu aniversári­o, razão para ser presentead­o por um padrinho com ingresso para irmos ao estádio.

Só que tive crise de apendicite e meu pai me substituiu na arquibanca­da.

O que a memória registrou foi ele contando o sétimo gol, em cobrança de falta.

Só que não, segundo os registros consultado­s.

Mas o velho era incapaz de mentir, inventar, o que me leva a concluir ser confusão minha, que ele falava de outro jogo, algo que reluto em aceitar. Para mim foi gol de Pepe, de falta. E ponto.

A segunda certeza é a de que o 3 a 0 sobre o Boca Juniors fez justiça àquele Santos, como o 4 a 1 no Grêmio.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil