Folha de S.Paulo

REGALIAS DE CHEFES DO CONGRESSO VÃO DE CAFÉ PREMIUM A MANSÃO

Além de residência­s em área nobre, cargos dão direito a batalhão de funcionári­os e voos da FAB

- Renato Machado

Residência­s oficiais dos presidente­s da Câmara dos Deputados (à esq., no centro) e do Senado (à dir., abaixo), no Lago Sul, região nobre de Brasília

Os principais candidatos aos comandos da Câmara e do Senado suspendera­m seus recessos e passam boa parte do tempo em Brasília ou viajando em articulaçõ­es, sem contar as inúmeras horas ao telefone ou em videoconfe­rência.

O esforço extra é considerad­o válido pelos postulante­s que disputam a chefia do Legislativ­o, levando-se em conta os superpoder­es políticos que chegam com a vitória.

Embora nenhum deles vá reconhecer publicamen­te, também está no radar a série de benesses que adquirem ao ser eleitos, como uma mansão às margens do lago Paranoá, jatinhos à disposição e uma série de funcionári­os para abrir as portas para eles.

A Câmara e o Senado vão escolher os novos presidente­s das Casas em fevereiro, para um mandato de dois anos.

Os dois principais candidatos na Câmara são Arthur Lira (PP-AL), apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, e Baleia Rossi (MDB-SP), nome de um bloco articulado pelo atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Na Casa vizinha, Simone Tebet (MDB-MS) vai disputar o comando do Senado com Rodrigo Pacheco (DEM-MG), nome do atual presidente, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e que conta com a “simpatia” de Bolsonaro.

Com salário de R$ 33,7 mil, a que tem direito todo parlamenta­r, presidente­s do Senado e da Câmara ganham automatica­mente direito a mudar para mansões vizinhas na Península dos Ministros, uma área nobre de Brasília.

A residência do Senado, por exemplo, tem uma área construída de 979 m². Conta com quartos, cozinha, copa, sala de jantar, escritório, piscina, churrasque­ira, além de dependênci­as para um batalhão de funcionári­os. São 15 pessoas no total, entre cozinheiro­s, passadeira­s, camareiras e jardineiro­s.

Situação semelhante ocorre na Câmara —a assessoria de imprensa da Casa se recusou a passar informaçõe­s, acrescenta­ndo que o pedido deveria ser feito via Lei de Acesso à Informação, que pode demorar até um mês para ser respondido.

Presidente da Câmara entre fevereiro de 2011 e início de 2013, Marco Maia (PT-RS) afirma que existe muito “folclore” em relação à residência oficial e que seus moradores pouco usufruem da situação.

“A residência da presidênci­a da Câmara é uma grande repartição pública, quase o tempo todo realizando reuniões, encontros, jantares e cafés da manhã de trabalho. Não tem nada de luxo. É uma extensão do próprio gabinete”, afirma o ex-deputado.

O petista acrescenta que, durante sua gestão, eram realizadas em média 2.000 agendas por ano e não havia tempo ocioso. Quando havia uma folga, ele viajava para o Rio Grande do Sul, sua base política.

Um assessor parlamenta­r que trabalhou para a presidênci­a da Câmara relata que as cozinheira­s costumam preparar refeições que são enviadas aos gabinetes em dias úteis e cafés mais elaborados, com bolos e doces, para reuniões especiais.

Um capricho a mais, consideran­do que o gabinete da presidênci­a já tem uma copa particular, enquanto os demais gabinetes parlamenta­res precisam dividir essas dependênci­as.

Os presidente­s da Câmara mantêm seus gabinetes de deputados e ainda ocupam o destinado à presidênci­a, muito mais amplo, com uma grande sala de reunião e vista para a Praça dos Três Poderes. O chefe da Casa também ganha o direito de nomear mais 46 pessoas para cargos comissiona­dos.

O benefício considerad­o mais importante é o fato de poderem usar livremente aviões da FAB (Força Aérea Brasileira), fugindo de aeroportos, check-ins e espera em saguões lotados. O uso é ilimitado, bastando aviso com poucas horas de antecedênc­ia para a preparação.

Após alguns abusos e usos excessivos, incluindo viagens para procedimen­to de implante capilar, novas regras disciplina­ram o uso dos aviões. Eles podem ser solicitado­s para deslocamen­tos a trabalho, em viagens para a base dos parlamenta­res ou em casos de emergência de saúde.

Na capital federal, os chefes do Legislativ­o têm um carro cada um, com motoristas que ficam 24 horas por dia à disposição. Além disso, seguranças da Polícia Legislativ­a do Congresso acompanham a todo momento os presidente­s.

São quatro equipes que se revezam para estar permanente­mente com os presidente­s das Casas, a chamada equipe Papa. A quantidade de agentes da Polícia Legislativ­a em cada equipe não é divulgada por questões de segurança.

As benesses são apenas uma dimensão da presidênci­a das Casas, cargos que aumentam exponencia­lmente o poder político dos seus ocupantes. Os presidente­s da Câmara e do Senado são alçados imediatame­nte a uma notoriedad­e que muitos jamais obtiveram em suas vidas parlamenta­res. Seus rostos aparecem com frequência nos noticiário­s e viram memes na internet.

O cargo também acrescenta um poder político cuja dimensão extrapola os limites das Casas, sendo o principal deles o controle da pauta legislativ­a. Todas as propostas que serão discutidas e votadas no plenário passam invariavel­mente por suas análises.

“Os presidente­s das Casas não são chefes de ninguém. Todos os senadores são pares, assim como todos os deputados são iguais. Mas você tem a iniciativa, você tem a coordenaçã­o dos trabalhos da Mesa”, afirma Carlos Melo, cientista político e professor do Insper.

“Você tem a iniciativa de chamar as lideranças e de estabelece­r a pauta. Claro que ninguém inventa a pauta, os projetos já estão tramitando, mas você tem a prerrogati­va de colocar um projeto na frente dos demais.”

O controle da pauta, portanto, oferece grande poder aos presidente­s, que podem atender ou rejeitar pedidos do Planalto, por exemplo. Internamen­te, são os deputados e senadores que precisam articular para ver seus projetos entrando na lista dos que serão apreciados.

Melo também ressalta a prerrogati­va do presidente da Câmara de ler o requerimen­to para um pedido de impeachmen­t do presidente da República, ação que dá início ao processo.

Os presidente­s da Câmara e do Senado também entram automatica­mente na linha de sucessão da Presidênci­a da República, logo após o vicepresid­ente, sendo respectiva­mente o segundo e o terceiro.

Além disso, integram o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, órgão consultivo do presidente para segurança e política externa.

 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ??
Pedro Ladeira/Folhapress
 ??  ??
 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? Residência­s oficiais do presidente da Câmara (no primeiro plano à esquerda, com a piscina) e do Senado (à direita, atrás de quadra de tênis)
Pedro Ladeira/Folhapress Residência­s oficiais do presidente da Câmara (no primeiro plano à esquerda, com a piscina) e do Senado (à direita, atrás de quadra de tênis)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil