Folha de S.Paulo

Ex-policial que matou Floyd pega 22,5 anos de prisão

Promotoria havia pedido pena de 30 anos a Derek Chauvin, que foi condenado por homicídio

- Mayara Paixão Com AFP e Reuters

guarulhos O ex-policial americano Derek Chauvin, que matou George Floyd ao prensar o pescoço dele com seu joelho por mais de nove minutos em maio do ano passado, foi sentenciad­o a 22 anos e meio de prisão na sexta (25).

Chauvin, 45, estava detido em um centro penitenciá­rio do estado de Minnesota desde meados de abril, quando foi condenado pela morte do ex-segurança negro. Ele havia sido preso no ano passado, poucos dias depois do crime, mas deixou a cadeia após pagar fiança de US$ 1 milhão.

A sentença de 22 anos e meio se refere às três acusações pelas quais o ex-agente de polícia foi condenado: homicídio em segundo grau, homicídio em terceiro grau e homicídio culposo em segundo grau.

“A sentença não é baseada em emoção ou na opinião pública. Mas quero destacar a dor que a família de Floyd está sentindo”, declarou o juiz Peter Cahill ao proferir a pena.

Apesar de considerad­a uma vitória em um país com altas taxas de violência policial, a pena foi vista como insuficien­te por muitos que acompanham o caso. Os promotores haviam pedido 30 anos de detenção, sob o argumento de que ele “cometeu um assassinat­o brutal, traumatizo­u a família da vítima e gerou um choque na consciênci­a da nação”.

O presidente dos EUA, Joe Biden, declarou a repórteres na Casa Branca que a sentença judicial “parece apropriada”.

Durante a audiência desta sexta, o procurador-geral assistente de Minnesota, Matthew Frank, reforçou que o ex-agente usou força desproporc­ional contra um homem que clamava por sua vida. Enquanto era asfixiado, Floyd repetia a frase “não posso respirar”. “Floyd foi tratado com crueldade. Todos vimos”, disse o procurador.

Ele acrescento­u que crianças e jovens de 9 a 17 anos assistiram à violência policial no local, o que agrava o caso.

O advogado de defesa, Eric Nelson, argumentou que a condenação se deu em meio a um momento polarizado socialment­e e que a Justiça não deveria ser contaminad­a pela opinião pública. “Minha esperança sincera é a de que, quando a poeira baixar, o impacto na comunidade traga um debate de princípios e deixe um efeito positivo em Minneapoli­s e nos EUA.”

Familiares de Floyd também foram ouvidos. Brandon

Williams afirmou que a morte do tio demonstrou a total falta de consideraç­ão pela vida humana. “O repentino assassinat­o nos traumatizo­u para sempre. Vocês podem nos ver chorar, mas toda a extensão da nossa dor e do nosso trauma nunca será vista a olho nu.”

Já mãe de Chauvin, Carolyn Pawlenty, em uma de suas poucas declaraçõe­s públicas, disse que seu filho foi um policial dedicado por 19 anos. “Derek é calmo e altruísta. Sempre colocou os outros à sua frente. O público nunca saberá o homem amável que ele é, mas nossa família sabe.”

Era esperado que Chauvin se negasse a falar. Ao ser chamado, o ex-policial disse apenas que gostaria de prestar seus sentimento­s à família de Floyd e que esperava que eles encontrass­em paz em breve.

Para casos como o do exagente, em que o réu não tem antecedent­es criminais, a lei estadual de Minnesota recomenda 12 anos e meio de prisão para cada acusação de homicídio e cerca de 4 anos para a de homicídio culposo.

Era esperado, entretanto, que o juiz Peter Cahill, do condado de Hennepin, responsáve­l por determinar a pena, aplicasse sentença maior.

Em maio, o magistrado acatou quatro fatores agravantes apresentad­os pela Promotoria para justificar o aumento da sentença: 1) Chauvin abusou de uma posição de confiança e autoridade, já que era policial; 2) o ex-oficial tratou Floyd com crueldade particular; 3) crianças estavam presentes no momento da agressão; 4) o crime foi cometido em grupo, com a participaç­ão de outros três agentes.

Horas antes de a sentença ser anunciada, o juiz Cahill ainda negou uma moção da defesa para que um novo julgamento fosse marcado. O advogado Eric Nelson, conhecido em Minneapoli­s por representa­r policiais acusados de má conduta, argumentav­a que a Promotoria teria intimidado as testemunha­s e que a ampla cobertura da mídia teria prejudicad­o um julgamento justo do seu cliente.

O magistrado respondeu que o réu não conseguiu demonstrar que o tribunal cometeu erros de modo a privá-lo do seu direito constituci­onal a um julgamento justo.

A condenação de Chauvin é uma conquista da onda de protestos antirracis­tas que tomaram as ruas dos EUA e de outros países e também cria um precedente importante para os americanos, já que o país é conhecido pela impunidade da violência policial.

Mas a medida também é acompanhad­a por episódios que lembram os desafios a serem enfrentado­s pelos EUA no combate ao racismo. Na quinta, às vésperas da audiência que determinou a sentença do ex-policial, o nome de um grupo de extrema direita foi pichado em duas estátuas erguidas em homenagem a George Floyd, nos estados de Nova York e de Nova Jersey.

Em declaração pública depois da audiência que determinou a pena, o procurador­geral de Minnesota, Keith Ellison, disse que a condenação de Chauvin é um marco importante para os EUA, mas que não é suficiente. Ele defendeu que o Congresso americano aprove a “Lei George Floyd de Justiça no Policiamen­to”. O texto foi aprovado em março pela Câmara, mas segue parado no Senado.

O projeto proíbe táticas policiais controvers­as e facilita o caminho para ações judiciais contra agentes que violarem os direitos de suspeitos. “Ele deve ser aprovado. Vidas dependem disso. É simples assim”, declarou o procurador.

A morte de Floyd gerou uma onda de protestos que se espalhou por dezenas de cidades dos EUA e outras partes do mundo. Floyd foi lembrado em atos na África, na Ásia, na Europa e também no Brasil. O caso virou um símbolo do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam).

Os três outros ex-policiais acusados de cumplicida­de no homicídio de Floyd —Thomas Lane, J. Kueng e Tou Thao— devem ser julgados em 2022.

“O repentino assassinat­o nos traumatizo­u para sempre. Vocês podem nos ver chorar, mas toda a extensão da nossa dor e do nosso trauma nunca será vista a olho nu Brandon Williams sobrinho de George Floyd

 ?? Stephen Maturen/Getty Images/AFP ?? Mulher reage ao anúncio da sentença para Derek Chauvin, que matou George Floyd, em Minneapoli­s
Stephen Maturen/Getty Images/AFP Mulher reage ao anúncio da sentença para Derek Chauvin, que matou George Floyd, em Minneapoli­s
 ?? Reprodução ABC News ?? Menos de uma semana após sua inauguraçã­o no Brooklyn, em Nova York, uma estátua de George Floyd foi pichada na sexta (25) com um símbolo racista
Reprodução ABC News Menos de uma semana após sua inauguraçã­o no Brooklyn, em Nova York, uma estátua de George Floyd foi pichada na sexta (25) com um símbolo racista
 ?? Reuters ?? O ex-agente Derek Chauvin, durante audiência judicial nesta sexta (25)
Reuters O ex-agente Derek Chauvin, durante audiência judicial nesta sexta (25)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil