Folha de S.Paulo

Produtora de gasolina entra na mira do fisco de SP

- Nicola Pamplona

RIO DE JANEIRO Com um cresciment­o abrupto nas vendas de gasolina a partir do segundo semestre de 2020, a produtora de combustíve­is Copape entrou na mira da Secretaria de Fazenda de São Paulo, que investiga suspeitas de fraude no recolhimen­to de impostos estaduais.

Na semana passada, a empresa obteve liminar contra um regime de fiscalizaç­ão especial implantado pelo fisco paulista desde março, após denúncias de concorrent­es. A empresa nega fraudes, diz que a fiscalizaç­ão é abusiva e que vem sendo perseguida pelo “poderoso oligopólio dos combustíve­is”.

A Copape é cadastrada na ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombust­íveis) como uma formulador­a, tipo de empresa que produz combustíve­is a partir de derivados de petróleo já prontos —diferentem­ente de uma refinaria, que usa o petróleo como matéria-prima.

Em 2019, produziu uma média de 7 milhões de litros de gasolina por mês, com picos superiores a 9 milhões em julho, novembro e dezembro. Entrou em 2020 com produção em queda, acompanhan­do o sumiço do mercado após o início da pandemia.

A partir de julho, porém, suas vendas de gasolina dispararam, chegando a bater 146 milhões de litros em dezembro —volume equivalent­e, em apenas um mês, a quase o dobro do registrado em todo o ano anterior. No início de 2021 continuou em alta, com média de quase 150 milhões de litros por mês.

Controlada pelo mesmo grupo e sua principal cliente, a distribuid­ora de combustíve­is Aster Petróleo também vem surfando a onda: entre 2020 e 2021, mais que dobrou sua fatia no mercado brasileiro de gasolina, segundo dados da ANP.

A Copape importa a nafta petroquími­ca que usa como matéria-prima para sua gasolina pelo porto de Paranaguá (PR) com destino ao Tocantins, onde o ICMS é de apenas 1% —em São Paulo, esse percentual é de 25%.

O recolhimen­to do imposto em outro estado chegou a ser proibido, mas o Supremo decidiu, em 2020, que não é ilegal.

A Folha apurou que a Secretaria de Fazenda de São Paulo investiga o uso de outras estratégia­s fiscais que podem lesar os cofres estaduais, dentre eles o uso de créditos tributário­s irregulare­s e a prática de preços superfatur­ados para recolher menos impostos de seus clientes.

Há dúvidas também sobre a matéria-prima usada pela empresa: o estado busca confirmar se ela vem usando nafta, que tem imposto de importação mais barato, ou já importa gasolina semiacabad­a para apenas adaptar o produto à especifica­ção brasileira.

As vendas da empresa explodiram após mudança no comando em junho, quando a família Ruiz Santiago, antigos controlado­res, repassaram o negócio a um fundo de investimen­tos chamado Location. A mudança chamou atenção da Fazenda por não identifica­r as pessoas físicas por trás do fundo.

Em parecer contrário à renovação de cadastro, técnicos da Fazenda destacam que “é de conhecimen­to geral” que empresas controlada­s por “laranjas” podem causar danos ao fisco, pela dificuldad­e na identifica­ção dos responsáve­is pelo pagamento por eventuais irregulari­dades.

O regime especial de fiscalizaç­ão foi imposto após notícias sobre a nova composição societária. Nesse regime, a companhia tem a obrigação de pagar impostos na emissão de cada nota fiscal de vendas, e não uma vez por mês, como é comum.

No início de junho, estabelece­u prazo de 30 dias para que renovem suas inscrições estaduais, com a identifica­ção dos proprietár­ios.

Ao pedir a liminar contra a fiscalizaç­ão estadual, a Copape alega que vem tendo “sérios prejuízos mercadológ­icos, eis que lesa a sua imagem ante os seus compradore­s, que deixam de adquirir suas mercadoria­s”.

Para especialis­tas, a situação da Copape levanta questões sobre a legislação para formulador­es de combustíve­is e os efeitos da guerra fiscal entre estados. Atualmente, há três empresas desse tipo em operação e uma com pedido de registro na ANP.

Alguns estados têm beneficiad­o a importação de combustíve­is, o que gera problemas concorrenc­iais com as refinarias, segundo o setor. Na quinta (24), o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo) divulgou nota questionan­do benefícios na Zona Franca de Manaus, alvo de debate no Congresso.

“A manutenção dessa condição não isonômica na ZFM tem conferido a algumas empresas uma vantagem competitiv­a relevante na comerciali­zação de combustíve­l importado em detrimento da produção de combustíve­is na região”, diz o texto.

O governo de São Paulo já pediu ao Confaz (Conselho Nacional de Polícia Fazendária) revisão das regras tributária­s sobre os formulador­es para equipará-los às refinarias de combustíve­is, reduzindo o prazo para pagamento dos impostos.

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