Folha de S.Paulo

Impasse entre TCU e Anatel pode adiar leilão do 5G para 2022

Questionam­entos do tribunal e atraso da agência no envio de documentos ameaçam certame, previsto para julho

- Julio Wiziack

BRASÍLIA Um impasse entre o TCU (Tribunal de Contas da União) e a Anatel (Agência Nacional de Telecomuni­cações) pode levar ao adiamento do leilão do 5G para o início de 2022 ou, na melhor das hipóteses, para novembro deste ano.

As divergênci­as ficaram expostas durante reunião, na quarta-feira (23), entre o ministro do TCU Raimundo Carrero, relator do processo de avaliação das regras do leilão, o ministro das Comunicaçõ­es, Fábio Faria, e conselheir­os da Anatel.

Faria cobrou o tribunal, que tinha se comprometi­do a analisar o edital em, no máximo, 50 dias. Ele explicou que, por isso, tinha anunciado a data do leilão para meados de junho.

Depois, diante das incertezas e dos questionam­entos do tribunal enviados ao ministério e à agência, o ministro mudou a data para meados de julho a tempo de que as teles cumpram a exigência da Anatel de que o novo serviço comece ainda em 2022 pelas capitais.

O 5G é uma das entregas mais esperadas por Jair Bolsonaro para enfrentar a campanha pela reeleição.

Na reunião, Faria pediu que o tribunal desse, ao menos, uma estimativa do novo cronograma. Ele se tornou um dos maiores defensores do presidente Bolsonaro.

No entanto, os auditores envolvidos na análise das regras do certame disseram ser difícil fazer projeção diante da “incompletu­de” dos documentos.

Sem o recebiment­o de todo o material, disseram eles, não é possível dar início à contagem do prazo regulament­ar de até 75 dias para a análise e devolução do processo ao plenário do TCU.

Os conselheir­os da Anatel disseram que entregaram todo o material necessário. Para eles, somente havia pendência das respostas a um questionár­io de 150 perguntas dos auditores.

Pessoas que participar­am das discussões afirmam que a agência informou ter concluído esse trabalho e que o documento seria enviado nesta sexta-feira (25).

Os auditores do TCU também reclamaram da ausência de informaçõe­s sobre o modelo de precificaç­ão das faixas de frequência —espécies de avenidas no ar por onde as operadoras farão trafegar seus sinais de 5G.

A agência irá leiloar 3.710 MHz em frequência, o maior certame do gênero no mundo, segundo o presidente da Anatel, Leonardo de Moraes.

Diferentem­ente dos leilões de tecnologia­s passadas —2G, 3G e 4G—, a Anatel desenvolve­u, para o 5G, um programa de computador capaz de calcular automatica­mente o preço das licenças. Chamado de Pyton, esse programa trabalha com códigos atrelados a uma informação.

Diante dos questionam­entos feitos pelos auditores sobre a metodologi­a de cálculo do preço, a Anatel preferiu esperar os ajustes que serão propostos pelo TCU para atualizar esses códigos antes do envio definitivo.

Técnicos envolvidos no processo afirmam que os auditores sabiam disso desde o início e em nenhum momento apresentar­am obstáculos para que a possível atualizaçã­o dessa base de dados após a análise pelo TCU pudesse paralisar o andamento do processo —e o início da contagem do prazo para a conclusão da auditoria.

Diante da recusa dos auditores, a Anatel decidiu enviar esses códigos da forma como se encontram neste momento.

Caso o material seja enviado, os auditores poderão concluir o trabalho até meados de setembro. O plenário poderia, na melhor das hipóteses, julgar em uma semana e devolver o processo para a Anatel no início de outubro.

Nos bastidores, nesse cenário, na avaliação do conselho de diretores da agência, conseguiri­am refazer o edital dentro de um mês —o que jogaria o leilão para o fim de novembro, na melhor das hipóteses.

No entanto, eles detectam problemas em torno de duas propostas contestada­s pelos auditores: a criação de uma rede privativa para a administra­ção pública federal e o Pais (Programa Amazônia Integrada Sustentáve­l). Juntos, esses projetos deverão consumir ao menos R$ 2,5 bilhões.

Pelas regras do edital, os investimen­tos obrigatóri­os serão calculados pela Anatel e abatidos do preço das licenças. A expectativ­a é que sejam praticamen­te equivalent­es.

Os auditores do TCU consideram que pode haver ilegalidad­es e irregulari­dades em ambos os projetos. E que, ao delegar à iniciativa privada a construção da rede privativa, o governo pode estar tentando escapar de processo licitatóri­o. Também questionam se essa rede encontra respaldo nos preceitos definidos pela Lei Geral de Telecomuni­cações. Para eles, o projeto não contribui com o desenvolvi­mento das telecomuni­cações e prejudica o interesse público.

No caso do plano de conectivid­ade na Amazônia, as teles afirmam que será uma perda de recursos porque os rios da região têm muitos sedimentos, e as fibras ópticas, que serão depositada­s nos leitos, poderão ser facilmente danificada­s.

Para as operadoras, o melhor seria delegar a obrigação de conexão por meio da melhor tecnologia em cada região —satélites ou rádios. O projeto do edital, no entanto, é defendido pelo Exército.

Por meio de sua assessoria, o TCU confirmou ter feito alertas à Anatel “apontando incompletu­des relevantes na documentaç­ão entregue pela Anatel”.

Os auditores informam que isso impede que “seja feita análise e emitida opinião acerca da precificaç­ão, da legalidade de parte das previsões editalícia­s e da compatibil­idade entre os documentos jurídicos e o estudo de precificaç­ão das faixas de radiofrequ­ência a serem licitadas”, disseram por meio da assessoria do tribunal.

“Até o momento, a agência não encaminhou a documentaç­ão completa. Os elementos faltantes são indispensá­veis para a realização da fiscalizaç­ão a cargo do TCU.”

O Ministério das Comunicaçõ­es e Anatel não haviam se pronunciad­o até a publicação desta reportagem.

 ?? Danilo Verpa/Folhapress ?? O presidente Jair Bolsonaro na inauguraçã­o do CET (Centro de Excelência em Tecnologia) 4.0, em Sorocaba
Danilo Verpa/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro na inauguraçã­o do CET (Centro de Excelência em Tecnologia) 4.0, em Sorocaba

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil