Folha de S.Paulo

Prefeitura­s dizem poder acelerar mais vacinação, mas encaram falta de doses

Velozes, capitais suspendera­m aplicação, esgotaram lotes e ficaram à espera de novas remessas

- Fernanda Canofre, João Pedro Pitombo e Katna Baran

PORTO alegre, salvador e curitiba Com a logística de imunização contra a Covid-19 já azeitada, prefeitura­s têm enfrentado interrupçõ­es na aplicação das vacinas por causa de um descompass­o entre o ritmo acelerado de vacinação e a entrega fracionada de doses pelo governo federal.

Na manhã desta sexta-feira (25), quatro capitais já haviam aplicado mais de 90% das doses recebidas e outras 13 estavam em um patamar acima de 80%, de acordo com dados do Ministério da Saúde.

Depois de uma queda em maio, na última semana o país teve média diária de 1,2 milhão de pessoas vacinadas por dia comaprimei­radosedava­cina, segundo dados do consórcio de veículos de imprensa do qual a Folha faz parte. A depender dos municípios, o ritmo poderia estar ainda mais acelerado, não fosse por um fator: a disponibil­idade de doses.

Essa é a avaliação de prefeitura­s ouvidas pela Folha em uma semana na qual algumas capitais registrara­m suspensões parciais ou totais da aplicação da primeira dose depois de verem os estoques esgotarem.

Porto Alegre registrou falta de doses em alguns postos ainda na terça (22), e na quarta só tinha primeiras doses disponívei­s para pessoas que agendaram a vacinação noturna, que começou nesta semana e com vacinas reservadas. O estoque, porém, era pequeno —cerca de 400 doses.

Um levantamen­to do Cosems-RS (Conselho Estadual de Secretaria­s Municipais de Saúde) na quinta (24) apontou que pelo menos 130 municípios gaúchos haviam suspendido a aplicação da primeira dose por falta de estoque.

“Os municípios estão organizado­s para vacinar rápido. As doses estão vindo de forma gradual, conforme a disponibil­idade do Ministério da Saúde”, aponta Maicon Lemos, presidente do Cosems e secretário de Saúde de Canoas, na região metropolit­ana, que também suspendeu a primeira dose.

Das cerca de 140 unidades de saúde na capital, 30 costumam ser usadas para vacinação, além dos drive-thrus. Mas, com poucas doses, as vacinas têm sido concentrad­as em apenas 12 pontos, segundo o secretário de Saúde de Porto Alegre, Mauro Sparta.

A capital gaúcha tem capacidade diária de vacinar 18 mil pessoas, mas já houve registros de 23 mil vacinados em um dia. A prefeitura calcula que o serviço tem capacidade para ser ampliado, mas as doses são insuficien­tes.

O painel do estado mostra que Porto Alegre aplicou 84,5% do 1,1 milhão de doses entregues até esta sexta (25). A aplicação de primeiras doses será retomada nesta sábado (26), ampliando o público para mulheres a partir de 49 anos. “O que a gente lamenta é que não venham mais vacinas para fazermos mais rápido, porque teríamos condições”, avalia Sparta.

Em Salvador, a aplicação da primeira dose foi retomada nesta sexta após a chegada do primeiro lote de imunizante­s da Janssen. A vacinação havia sido suspensa na última terça-feira por falta de doses.

O secretário de Saúde, Leonardo Prates, diz que a interrupçã­o é resultado de uma conjunção de fatores que inclui lotes menores nas últimas semanas, o atraso na chegada de novos lotes e a eficiência na aplicação —a capital baiana já aplicou 95% do 1,4 milhão de vacinas recebidas.

A prefeitura da capital baiana montou uma logística com capacidade de vacinar até 100 mil pessoas por dia, mas o seu recorde diário foi de 31 mil em um único dia diante da falta de mais vacinas.

Prates também defende que os critérios de distribuiç­ão do Ministério da Saúde sejam modificado­s e levem em conta apenas a proporção da população acima de 18 anos:

“Seria uma forma de equalizar as fases da vacinação entre as cidades brasileira­s”, afirma.

Até esta sexta-feira, Salvador tinha recebido cerca de 1,5 milhão de doses de vacinas, menos do que Belo Horizonte e Fortaleza, cidades que têm população menor.

Em Florianópo­lis, onde a aplicação da primeira dose foi suspensa e as poucas vacinas foram reservadas a grávidas, lactantes e puérperas, a prefeitura também diz que a vacinação tem andado mais rápido do que a chegada dos lotes.

A equipe estruturad­a tem capacidade de aplicar até 10 mil doses por dia, há dias em que são feitas 8.000 aplicações e outros com apenas mil. A estratégia depende de estoques e do público-alvo. A capital catarinens­e tem aplicado lotes que chegam dentro de 48 horas ou 72 horas. A oferta da primeira dose já foi retomada, ampliando para o público de 49 anos ou mais nesta sexta, graças a novas remessas.

Rio Branco, que está vacinando pessoas a partir de 37 anos, também manteve a primeira dose apenas para grávidas e puérperas enquanto aguardava mais vacinas. A aplicação da primeira dose foi retomada na sexta.

A capital do Acre fez um mutirão entre os dias 19 e 20 de junho e esgotou as doses disponívei­s. No fim de semana, com vacinação das 8h às 22h, cerca de 4,1 mil pessoas foram vacinadas por dia —a capacidade da cidade é de 15 mil.

Em Campo Grande, outra capital que parou de oferecer a primeira dose durante a semana, a prefeitura afirma que pode imunizar até 25 mil pessoas por dia em mais de 70 pontos de vacinação. No entanto, o recorde atingido até agora foi de 17 mil atendiment­os em 24 horas. O entrave também é a quantidade insuficien­te de doses recebidas.

A reclamação é a mesma por parte da Prefeitura de Curitiba. Lá, a primeira dose ficou restrita a grupos específico­s devido à quantidade escassa de vacinas. Nesta sexta, a campanha foi ampliada para pessoas a partir de 49 anos.

A prefeitura calcula que, se recebesse a quantidade necessária de imunizante­s para seu potencial de atendiment­o, em menos de 30 dias vacinaria todos os moradores acima de 18 anos. A cidade pode vacinar até 30 mil pessoas por dia —a média atual, consideran­do aplicação de domingo a domingo, é de 4.300 doses por dia (14% da capacidade).

A gestão aponta ainda a quantidade de grupos prioritári­os nos planos nacional e estadual de imunização como entrave para acelerar a fila. Ou seja, as doses, segundo a prefeitura, já chegam “carimbadas” para grupos específico­s.

Em uma reunião com representa­ntes de governos estaduais e municipais, na quinta, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que a previsão é que, em julho, sejam distribuíd­os 60 milhões de doses, 20 milhões a mais que o mês anterior, e que o ritmo se mantenha em agosto. Ele assegurou que toda a população acima de 18 anos deve receber a primeira dose até setembro.

O Ministério da Saúde diz que antecipou 16 milhões de doses, mas depende da entrega delas pelos fabricante­s. A pasta reforça ainda que os entes federativo­s têm autonomia para seguir com o planejamen­to local de vacinação.

Historicam­ente, o Brasil tem boa capacidade de vacinação, com redes de saúde municipais estruturad­as para isso, segundo a epidemiolo­gista e pesquisado­ra da FGV (Fundação Getulio Vargas), Carolina Coutinho.

O problema na atual campanha da vacina contra a Covid-19 está no cronograma de entrega das doses, com mudanças, demora na assinatura de contratos e na entrega de insumos necessário­s para a produção dos imunizante­s.

“O ideal era aplicar e manter uma aplicação de 1,5 milhão de doses por dia. Recentemen­te, começamos a chegar perto disso, mas ainda não chegamos a esse número. Para que isso aconteça, a gente precisa das vacinas sendo entregues no cronograma, sem atrasos e alterações, e de campanhas de informação robustas para trazer mais confiança da população”, diz ela.

“O que a gente lamenta é que não venham mais vacinas para fazermos mais rápido, porque teríamos condições Mauro Sparta secretário de Saúde de Porto Alegre

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Cristine Rochol/Divulgação Prefeitura de Porto Alegre Fila para vacinação em Porto Alegre, na segunda (21)

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