Folha de S.Paulo

Ritmo de aplicação alimenta atritos entre Kalil e Zema em BH

- Leonardo Augusto

BELO horizonte Se morasse em Vitória, no estado vizinho de Espírito Santo, o vendedor ambulante de peixes Anderson Calixto, 42, poderia ter recebido sua dose de vacina contra a Covid-19 desde a última terça-feira (22). Nessa data, a capital capixaba iniciou a imunização de moradores acima de 40 anos sem comorbidad­es.

Mas Anderson vive em Belo Horizonte, uma das capitais mais atrasadas na imunização com base no critério idade.

A capital mineira estava desde o dia 12 de junho parada na faixa de 56 anos. Na quartafeir­a (23), após a chegada de mais imunizante­s na segunda-feira (21), a prefeitura incluiu moradores de 53, 54 e 55 anos na campanha.

Ainda assim, entre as capitais, Belo Horizonte só aparece à frente de Brasília (DF) e Porto Velho (RO), que estão vacinando quem tem mais de 60 anos, Belém, que imuniza moradores com mais de 58 anos, Boa Vista (RR), que convoca moradores de 54 e 55 anos, e Palmas (TO), que chamou quem tem mais de 55 anos.

A Prefeitura de Belo Horizonte diz que a comparação de vacinação entre municípios não é o melhor parâmetro, “já que a pirâmide etária é diferente em cada cidade”.

Mas o ritmo de vacinação na capital irrita moradores. “Dá raiva. Só Deus para saber o que esse povo tá arrumando”, afirma Calixto. “E esse trem tá dando mais medo do que de ser humano”, afirma, referindo-se ao vírus.

Em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, abriu na terça (22) o cadastro para vacinação de moradores entre 40 e 49 anos.

O carpinteir­o Leonardo Borges de Jesus, 30, diz se revoltar quando vê no noticiário o cenário da Covid em outras nações. “Tem países comemorand­o a reabertura. Estão deixando de usar máscaras. E aqui? Como vamos comemorar?” Leonardo afirma ter esperança, mas acredita que a sua imunização vai demorar.

Na quarta-feira (23) postos de saúde da cidade ficaram vazios ao longo de todo o dia.

Em uma unidade do bairro Serra, onde a fila para vacinação contra a Covid-19 costuma dobrar a esquina oposta, a informação que se recebia na portaria era que não havia vacina nem para maiores de 56 anos ou para população com comorbidad­es, sem previsão de chegada, segundo uma funcionári­a.

A vacinação contra a Covid-19 na cidade é mais um motivo de embate entre o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) e o prefeito da capital, Alexandre Kalil (PSD). Os dois colecionam atritos e devem polarizar a disputa pelo governo do estado nas eleições do ano que vem.

“A situação em BH é exasperant­e. O estado decidiu cortar doses da capital por rixa política. A fila parou de andar, estacionou em 56 anos. Contagem, cidade vizinha, já está em 49 anos. São Paulo e Rio de Janeiro, nessa faixa. E o povo aqui à mercê de politicage­m, da pior”, escreveu no Twitter o professor da Universida­de Federal de Minas Gerais (UFMG) Roberto Andrés.

Minas Gerais recebeu até a quinta-feira (24) 27 remessas de imunizante­s contra a Covid, um total de 13.439.824, conforme o último boletim divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde.

Com população de 2,5 milhões de habitantes, Belo Horizonte recebeu 1.854.257 doses. Do total, 1.640.258 já foram distribuíd­as, conforme relatório da prefeitura divulgado na quinta-feira (24).

No início da semana, Zema foi às redes sociais falar sobre vacinação contra a Covid-19, após o secretário municipal de Saúde de Belo Horizonte, Jackson Machado, afirmou que estava sendo feito uso político das vacinas. Zema disse que todos os mineiros receberão a vacina de acordo com o calendário do estado.

“Vamos deixar claro uma coisa: as vacinas são enviadas pelo Ministério da Saúde, que determina o percentual destinado a cada grupo. Ao governo do estado cabe fazer a distribuiç­ão para 853 cidades de Minas. À cidade cabe a aplicação com controle dos grupos”.

Em entrevista à imprensa realizada também na segunda-feira (22), o secretário de estado de Saúde, Fábio Baccherett­i, afirmou que os critérios para distribuiç­ão das vacinas são técnicos.

“As vacinas vêm ‘carimbadas’ por grupos prioritári­os pelo Ministério da Saúde. Cabe ao governo de Minas fazer a distribuiç­ão conforme o banco de dados do próprio ministério ou de acordo com os dados que foram preenchido­s pelo próprio município”, disse.

Segundo o secretário, existem cidades que conseguem avançar mais porque vencem grupos ou optam por vacinar por idade antes de grupos prioritári­os. “O importante é que todo o estado terminará junto a vacinação de adultos”, apontou.

“Dá raiva. Só Deus para saber o que esse povo tá arrumando. E esse trem tá dando mais medo do que de ser humano Anderson Calixto, 42 morador de Belo Horizonte

 ?? Leonardo Augusto/Folhapress ?? Leonardo Borges de Jesus, 30, reclama da demora da vacinação em BH
Leonardo Augusto/Folhapress Leonardo Borges de Jesus, 30, reclama da demora da vacinação em BH

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil