Relator do IR recua e exclui taxação sobre paraísos fiscais
Criação de empresa fora do Brasil é exigência de investidor, segundo especialistas
brasília O relator da proposta do governo que altera o Imposto de Renda, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), apresentou uma nova versão do projeto excluindo a regra que taxaria anualmente recursos de brasileiros em paraísos fiscais e que prometia cobrir o buraco a ser aberto pelas demais medidas previstas no texto.
A ausência da regra representa um recuo de Sabino, que disse nos últimos dias que o “espírito patriota” levara os envolvidos a resgatar a norma. Segundo ele, ela pagaria com folga as reduções de impostos geradas pelo projeto de lei.
Previsto no projeto original do governo, apresentado no fim de junho, o instrumento que taxaria recursos em paraísos fiscais anualmente havia sido removido no mês seguinte após conversas com o ministro Paulo Guedes (Economia).
Nesta terça (3), Sabino afirmou que a regra deixou de ser prevista porque grande parte dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) não aplica a regra.
A OCDE não obriga seus membrosa adotara taxação, mas recomenda que os países a apliquem co mouma boa prática para evitara sonegação fiscal. Países como EUA, França e Canadá aplicam a norma, com variações em cada caso.
Em vez da medida voltada a paraísos fiscais, Sabino inseriu no texto um dispositivo que dá ao indivíduo com recursos no exterior a opção de atualizar os valores que possui ao declará-los às autoridades brasileiras. Um imposto de 6% incidiria sobre os rendimentos registrados, sem necessidade de repatriá-los ao Brasil.
Segundo ele, a regra de atualização vai contribuir para deixar o impacto fiscal da reforma neutro. Mas, após questionamentos durante entrevista, ele esclareceu que a atualização dos valores no exterior deve gerar uma arrecadação aproximada de R$ 20 bilhões em 2022 e não tem previsão de arrecadação nos anos seguintes —ou seja, a medida tem efeito temporário.
A versão anterior da proposta do IR apresentado por Sabino no mês passado gerava um buraco permanente de R$ 30 bilhões ao ano na arrecadação pública, principalmente pelos cortes de impostos sobre empresas. Ele e o ministro Paulo Guedes (Economia) têm defendido a proposta mesmo assim. O ministro diz que é possível arriscar a perda desse número porque a arrecadação está crescendo.
Em seu novo texto, Sabino também tenta apresentar um mecanismo para atender governadores e prefeitos —que temem perda de receitas e, mesmo com as mudanças, ainda veem problemas na proposta. Estados e municípios têm direito a uma parte da arrecadação com Imposto de Renda e, com os cortes previstos, calculam perder recursos.
Para conter a insatisfação, a ideia de Sabino é fazer com que os cortes planejados na alíquota do IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica) sejam feitos ao longo de três anos (e não dois, como na proposta anterior) e dependam em parte de haver crescimento real da arrecadação durante o período.
A proposta apresentada em meados do mês por Sabino propunha um corte na alíquota-base do IRPJ de 15% para 2,5%, sendo uma redução de 10 pontos percentuais no primeiro ano de vigência e mais 2,5 pontos no segundo ano.
Agora, o deputado apresentou a nova versão com um corte de 7,5 pontos no primeiro ano, de 2,5 pontos no segundo e outros 2,5 pontos no terceiro.
A compensação orçamentária para o primeiro corte estaria assegurada pelas próprias medidas arrecadatórias contidas na proposta, que incluem a taxação de dividendos. Já os cortes adicionais no segundo e no terceiro ano só seriam feitos se a arrecadação crescer em relação ao ano anterior —já descontada a inflação.
Para os estados, o projeto continua prevendo a subtração de receitas dos entes e criando um horizonte de “manifesta insolvência fiscal” de estados e municípios.
Sabino também vai propor o fim do instrumento do JCP (juros sobre capital próprio), um passo além em relação à proposta anterior que previa o fim da dedução do JCP em outros impostos.
Ele também disse que vai propor o aumento de 4% para 5,5% na alíquota da CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), uma contraprestação paga à União pelo aproveitamento econômico de recursos minerais.
Empresas do Simples não vão pagar impostos sobre dividendos, como já sinalizado anteriormente.
Na entrevista virtual sobre a nova versão do texto, apresentada a jornalistas e analistas, o deputado evitou responder a todas as perguntas e deixou de apresentar o impacto fiscal detalhado das medidas anunciadas. Ele ainda não havia informado os números até o fechamento deste texto.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta terça que o texto foi melhorado por Sabino, mas que o objetivo não é “fazer pegadinha”. “[A proposta] A PEC tinha todas as condições para que fosse aprovada inclusive antes do recesso. O relatório do deputado Sabino melhorou e muito o texto original, mas nosso objetivo aqui não é de fazer pegadinha, não é de fazer surpresa, não é de prejudicar segmento nenhum, nem público nem privado, nem ente federativo, nem categoria de profissionais liberais.”
são paulo O projeto de reforma tributária apresentado pelo governo no fim de junho pode aumentar os custos das startups na hora de captar investimentos e elevar a cobrança de impostos de empresários e investidores, dizem advogados que acompanham o setor.
O texto, como foi apresentado originalmente, afeta as companhias por endurecer as regras na tributação de sócios de empresas sediadas em paraísos fiscais ou com regime privilegiado.
Ainda não há segurança sobre o que acontecerá com as medidas de maior efeito para as empresas iniciantes ao longo da tramitação do texto, que eram consideradas importantes para cobrir perdas de arrecadação trazidas por outras medidas da reforma.
Isso porque elas ficaram inicialmente de fora do substitutivo preliminar elaborado pelo deputado federal Celso Sabino (PSDB-PA), relator do texto na Câmara dos Deputados. No entanto, em entrevista à Folha, o parlamentar disse que iria reinserir as medidas para cobrança de impostos em paraísos fiscais
Nesta terça (3), porém, apresentou a líderes do Congresso uma nova versão do texto excluindo a regra que taxaria automaticamente recursos de brasileiros em paraísos fiscais.
As startups são atingidas pelo cerco aos paraísos fiscais porque, no setor, é frequente que as companhias criem holdings no exterior, em especial em Delaware, nos EUA, e nas Ilhas Cayman, para que sejam as controladoras de suas operações no Brasil.
A ação, conhecida como “flip”, é uma exigência comum de investidores estrangeiros que não querem se submeter à jurisdição brasileira, considerada complexa e arriscada para os negócios, segundo advogados.
A advogada Bruna Marrara, do escritório Machado Meyer, diz que atualmente, quando há a transferência das ações da startup para esses países, o investidor pode considerar que a empresa mantém o mesmo valor declarado antes em seu Imposto de Renda, sem ser tributado.
O projeto do governo, porém, exige que seja apurado o
Pedro Henrique Ramos advogado do escritório Baptista Luz e conselheiro do Dínamo, grupo que reúne startups e investidores
valor de mercado da companhia na hora da transferência e o acionista da empresa passa a ser tributado caso haja ela tenha se valorizado.
Como exemplo, a advogada cita o caso de investidor que aplicou R$ 100 mil em uma startup que será transferida para o exterior. Nesse momento, sua cota pode ser avaliada em R$ 250 e, sobre a diferença, deve incidir imposto de pelo menos 15%. “Ele pode ter de tirar dinheiro do bolso sem ainda ter recebido nada”, afirma.
Outro ponto que foi incluído no texto do governo, mas não aparece no substitutivo, é a tributação do ganho na venda de empresas em paraísos fiscais que tenham ativos brasileiros.
O imposto, caso aprovado o texto do governo, passaria a ser cobrado quando houvesse venda de companhias com US$ 100 milhões em ativos no Brasil ou que tenham mais de 50% de seus ativos localizados aqui. A medida busca atingir pessoas que residem fora do país.
O setor também pode sofrer impacto com mudanças nas regras para tributação de lucros de empresas em países com regime diferenciado.
O projeto do governo prevê que sócios brasileiros de empresas em países nessas condições passem a pagar impostos sobre os lucros da companhia logo que eles são apurados.
Pela regra atual, quem tem uma holding no exterior só paga impostos quando o lucro é distribuído aos sócios, diz Marcelo Perez, do escritório Bronstein, Zilberberg, Chueiri & Potenza.
Outro assunto de grande interesse das startups, a possibilidade de oferecer opções de compra de suas ações para ampliar a retenção de funcionários, é afetado tanto pela proposta do governo como também pelo substitutivo.
O texto prevê que, caso essas ações sejam oferecidas a diretores, elas não poderão ser deduzidas do Imposto de Renda como despesa operacional.
“O projeto está indo contra a necessidade do mercado, de tornar a empresa mais competitiva na hora de trazer talentos”, diz o advogado Pedro Henrique Ramos, do escritório Baptista Luz e conselheiro do Dínamo, grupo que reúne startups e investidores.
O projeto está indo contra a necessidade do mercado, de tornar a empresa mais competitiva na hora de trazer talentos