Folha de S.Paulo

Cientistas encontram em Mato Grosso nova espécie de macaco

Sagui-de-schneider foi achado entre os rios Juruena e Teles Pires, em cidades como Paranaíta e Alta Floresta

- Reinaldo José Lopes

SÃO CARLOS (sp) Numa das regiões da Amazônia mais afetadas pelo desmatamen­to, pesquisado­res brasileiro­s identifica­ram uma nova espécie de macaco, que passou algumas décadas sendo confundida com alguns de seus parentes antes de ser finalmente revelada à comunidade científica.

Trata-se do sagui-de-schneider (Mico schneideri), cuja elegante pelagem, prateada na frente, com tons de laranja e chumbo, ajuda a diferenciá-lo dos vários outros membros do gênero mico que habitam áreas vizinhas da floresta.

Tudo indica que a espécie é exclusivam­ente mato-grossense, sendo achada apenas na região entre os rios Juruena e Teles Pires, em municípios como Paranaíta e Alta Floresta.

Os detalhes sobre a descoberta estão publicados em artigo na revista especializ­ada Scientific Reports. Assinam o estudo Rodrigo Costa-Araújo, do Museu Paraense Emílio Goeldi, Gustavo Canale, da Universida­de Federal de Mato Grosso, e pesquisado­res de outras instituiçõ­es no Brasil e no Reino Unido.

Embora abrigue 20% da diversidad­e de primatas do mundo, a Amazônia continua surpreende­ndo a comunidade científica com novas espécies de macacos porque ainda faltam muitos dados sobre a distribuiç­ão geográfica e as caracterís­ticas de cada bicho.

Foi isso o que levou a equipe do estudo a desconfiar que alguns animais armazenado­s no Museu Goeldi, atribuídos a outra espécie de sagui, a Mico emiliae, não tinham sido classifica­dos corretamen­te.

“Os três trabalhos anteriores que examinaram esses espécimes só utilizaram a coloração da pelagem para estudo, e isso com poucos exemplares. A pequena amostragem é sempre um problema [para a confiabili­dade de um estudo], e a cor da pelagem dos saguis da espécie nova parece que ‘desbota’ com o tempo”, explicou Costa-Araújo à Folha. “Na verdade, os bichos são bem diferentes quando observamos espécimes recém-coletados na natureza.”

De fato, foi isso o que fez a diferença para a nova pesquisa, afirma ele: novas idas a campo para achar mais saguis, junto com análises do DNA das diferentes espécies do gênero Mico e o mapeamento preciso da distribuiç­ão geográfica de cada bicho.

A confluênci­a de todas essas informaçõe­s é que permitiu bater o martelo e afirmar que o macaquinho matogrosse­nse de fato é uma espécie nova. O nome científico e popular do animal homenageia o primatólog­o e geneticist­a brasileiro Horácio Schneider (1948-2018).

Outro indício importante é a ocorrência aparenteme­nte exclusiva do bicho no chamado interflúvi­o (região entre rios) Juruena-Teles Pires. CostaAraúj­o explica que a distribuiç­ão geográfica das diferentes espécies do gênero mico tende a bater com a dos vários interflúvi­os amazônicos.

Pode-se imaginar, nesses casos, que a formação do curso atual dos rios teria separado populações ancestrais dos primatas, isolando-as de tal forma que, com a passagem de muitos milhares de anos, elas se transforma­ram em espécies distintas. “Mas não podemos afirmar isso. Estou buscando a resposta para essa pergunta no meu pós-doutorado”, conta ele.

Sabe-se pouco sobre o comportame­nto e os hábitos alimentare­s da maioria dos saguis amazônicos, embora os membros do grupo tendam a adotar um cardápio variado, que inclui seiva de árvores, frutas e pequenos animais. Também são necessário­s mais estudos para entender como surgiram as diferenças marcantes de pelagem entre as espécies, afirma Costa-Araújo.

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Diego Silva/Divulgação Sagui-de-schneider, identifica­do por pesquisado­res brasileiro­s

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