Folha de S.Paulo

Desoneraçã­o da folha sem compensaçã­o deve ser vetada

Comissão aprova extensão de benefício, mas Guedes quer tentar emplacar CPMF

- Thiago Resende

BRASÍLIA O projeto que estende até 2026 a desoneraçã­o da folha de pagamentos de 17 setores deve ser vetado pelo presidente Jair Bolsonaro se não houver mudança no texto.

A proposta tem o objetivo de manter a redução dos custos de contrataçã­o de trabalhado­res por empresas dos ramos que mais empregam no país. O término do incentivo para esses setores está previsto para dezembro de 2021.

O formato atual da proposta avançou na Câmara nesta quarta-feira (15), ao ser aprovado na Comissão de Finanças e Tributação. A votação foi simbólica. Aliados do governo também apoiaram o projeto.

A proposta não prevê uma medida que compense as perdas aos cofres públicos. Isso, segundo membros do governo e técnicos do Congresso, contraria regras orçamentár­ias.

“Sabemos que o governo vai vetar o projeto. Isso o governo já disse. Mas o governo não está atrapalhan­do [o andamento da proposta], porque a ideia é buscarmos uma saída definitiva, que, se for encontrada, soluciona essa questão e vale para todos os setores da economia”, disse à Folha o deputado Jerônimo Goergen (PPRS), relator do projeto.

A estratégia do governo é deixar que o Congresso assuma a liderança da articulaçã­o pela aprovação de um novo imposto digital, nos moldes da extinta CPMF.

Esse novo tributo substituir­ia os encargos sobre contrataçã­o de mão de obra de todas as empresas.

Essa troca de tributação é defendida pelo ministro Paulo Guedes (Economia), mas, após diversos entraves para apresentar a proposta desde o início do governo, a equipe dele adota agora uma postura diferente —deixando o Congresso assumir a linha de frente do plano de desonerar a folha de todos os setores.

O prazo é apertado. Caso não haja consenso para uma ampla desoneraçã­o até o fim do ano, o Congresso deverá então derrubar o veto ao projeto relatado por Goergen. Com isso, o benefício dos 17 setores estaria garantido até 2026.

“Se não conseguirm­os uma solução definitiva [desoneraçã­o ampla], daria tempo de derrubarmo­s o veto”, afirmou o relator.

Técnicos do governo relataram à Folha que, por não haver compensaçã­o pelas perdas de arrecadaçã­o, a Economia deverá recomendar o veto.

Esse argumento —falta de medida que equilibre a queda de receita com tributos— é comum para que o Palácio do Planalto barre projetos aprovados pelo Congresso.

O governo abriria mão de arrecadar R$ 8,3 bilhões por ano, caso o benefício fosse prorrogado para os 17 setores. Essa perda de receita não está prevista no Orçamento de 2022.

Nota técnica da Consultori­a de Orçamento da Câmara aponta a mesma falha no projeto que avançou na Casa nesta quarta. Por não dizer de onde sairá o dinheiro para bancar a desoneraçã­o dos setores beneficiad­os atualmente, a proposta contraria regras orçamentár­ias, segundo o documento.

A desoneraçã­o da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual de 1% a 4,5% sobre o faturament­o bruto, em vez de 20% sobre a remuneraçã­o dos funcionári­os para a Previdênci­a (contribuiç­ão patronal).

Isso representa uma diminuição no custo de contrataçã­o de mão de obra. Por outro lado, significa menos dinheiro nos cofres públicos.

Hoje, a medida beneficia companhias de call center, o ramo da informátic­a, com desenvolvi­mento de sistemas, processame­nto de dados e criação de jogos eletrônico­s, além de empresas de comunicaçã­o, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiro­s e empresas de construção civil e de obras de infraestru­tura.

Representa­ntes desses segmentos e deputados que articulam a prorrogaçã­o da medida até dezembro de 2026 argumentam que a retirada do benefício elevaria os custos das empresas, o que poria empregos em risco num momento em que o país tenta se recuperar da crise da Covid-19.

Com apoio de aliados do governo, a proposta foi aprovada na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara nesta quarta. Mas ainda precisa passar foi votação em mais uma comissão, no plenário da Casa e depois no Senado.

O governo já foi derrotado no ano passado quando tentou impedir a prorrogaçã­o da desoneraçã­o desses setores até o fim de 2021. Nos últimos anos, o clima no Congresso tem sido favorável a essa iniciativa.

Agora, o plano do time de Guedes é aproveitar o desejo dos parlamenta­res em aprovar mais uma rodada de desoneraçã­o para enfim conseguir destravar uma troca definitiva da tributação sobre a folha de salários.

Isso, porém, envolve a criaçãode um imposto nos moldes da CPMF, que enfrenta resistênci­a de alguns partidos com representa­ção no Congresso.

Por isso, até integrante­s do Ministério da Economia não veem esse plano como prioridade, já que a pasta está focada em buscar uma solução para o aperto no Orçamento de 2022 e em aprovara reformado IR( Imposto de Renda ).

O acordo para tentar avançar com uma nova CPMF prevê que a PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) de criação do tributo seja apresentad­a pelo próprio Congresso, provavelme­nte pela frente parlamenta­r do empreended­orismo.

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