Folha de S.Paulo

Deputados democratas tentam barrar Brasil como aliado extra-Otan dos EUA

- Patrícia Campos Mello

Deputados do Partido Democrata apresentar­am emenda ao orçamento de Defesa dos Estados Unidos para proibir o governo americano de usar recursos públicos para beneficiar o Brasil em decorrênci­a do status do país de aliado prioritári­o extra-Otan (Organizaçã­o do Tratado do Atlântico Norte), a aliança militar de países do Ocidente.

A classifica­ção foi concedida ao país em julho de 2019 pelo então presidente americano, Donald Trump, alinhado ao brasileiro Jair Bolsonaro. Ser um aliado extra-Otan possibilit­a, de acordo com a Casa Branca, “colaboraçã­o no desenvolvi­mento de tecnologia­s de defesa, acesso privilegia­do à indústria de defesa dos Estados Unidos, aumento em intercâmbi­os militares, exercícios e treinament­o conjuntos, além de acesso especial a financiame­nto para equipament­os militares”.

A emenda do deputado democrata Jesus Garcia (Illinois), copatrocin­ada por outros congressis­tas do partido, estabelece que recursos dos contribuin­tes americanos não poderão ser usados para “reconhecer a designação do Brasil como um aliado extra-Otan prioritári­o ou para oferecer, conferir, facilitar ou dar ao Brasil os benefícios decorrente­s desse status”.

Na prática, caso o texto seja incorporad­o ao Ato de Autorizaçã­o de Defesa Nacional do Ano Fiscal 2022 —o orçamento da Defesa americana—, essa cooperação militar entre os países fica inviabiliz­ada.

A emenda será votada na Câmara dos Representa­ntes e, depois, segue para o Senado americano. Projeto semelhante chegou a ser apresentad­o em 2019 e em 2020, mas não foi aprovado. Desta vez, porém, há maioria, ainda que apertada, de democratas nas duas Casas do Congresso —220 a 212 na Câmara, e 50 a 50, com o voto de desempate sendo da vice-presidente, Kamala Harris, no Senado.

Garcia e outros deputados do partido apresentar­am ainda uma segunda emenda, que visa proibir a destinação de recursos americanos para assistênci­a ou cooperação com forças de defesa, segurança ou policiais do Brasil em “deslocamen­to involuntár­io, incluindo com coação ou uso da força, de comunidade­s indígenas ou quilombola­s no Brasil”.

Texto semelhante foi aprovado na Câmara no ano passado, mas barrado no Senado.

Congressis­tas democratas têm criticado a política ambiental de Bolsonaro e o acusam de violar direitos das populações indígenas. Internamen­te, pressionam o governo de Joe Biden a ser mais duro com o presidente brasileiro.

No início de agosto, em visita para discutir possível veto à participaç­ão da China na instalação da infraestru­tura da tecnologia 5G no Brasil, o assessor de segurança nacional Jake Sullivan ofereceu ao governo apoio para que o Brasil se torne sócio global da Otan.

A adesão dependeria do aval de outros integrante­s da aliança militar, mas o apoio americano é determinan­te. A eventual ascensão do Brasil como “sócio global” da Otan permitiria aos militares condições especiais para a compra de armamentos de países que integram a organizaçã­o e abriria espaço para a capacitaçã­o de pessoal nas bases da aliança ao redor do mundo.

O gesto de oferecer apoio para o Brasil ser sócio global da Otan um dia depois de Bolsonaro ter novamente questionad­o as urnas eletrônica­s causou surpresa entre alguns congressis­tas americanos.

Em carta enviada a Sullivan no dia 4 de agosto, na véspera da viagem, o presidente do Comitê de Relações Exteriores do Senado, Robert Menendez (Nova Jersey), criticou as falas do mandatário brasiliero.

“Bolsonaro está disseminan­do narrativas falsas com o objetivo de minar a confiança dos brasileiro­s no sistema eleitoral”, escreveu o senador.

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