Folha de S.Paulo

Acordo American-Gol confirma avanço dos EUA no setor no país

Delta Airlines já é dona de 20% da Latam, enquanto United tem fatia na Azul

- Daniele Madureira

A compra de uma fatia da Gol por parte da American Airlines anunciada na quarta-feira (15) sela o interesse de três das maiores companhias aéreas americanas pelo mercado brasileiro de aviação civil, que passa por um momento de ebulição após enfrentar a fase mais aguda da pandemia.

A American Airlines ficou com uma fatia de 5,2% da Gol, após pagar US$ 200 milhões (R$ 1,05 bilhão). A Delta Airlines já é dona de 20% de participaç­ão na Latam, enquanto a United Airlines tem 8% das ações preferenci­ais da Azul.

“Mas as compras de participaç­ões da Delta na Latam e da United na Azul acontecera­m antes da pandemia”, lembra André Castellini, sócio da consultori­a Bain & Company.

O negócio mais expressivo até então, a compra de um quinto da Latam pela Delta, foi anunciado em setembro de 2019, por US$ 1,9 bilhão (R$ cerca de 7,9 bilhões à época).

“É surpreende­nte um negócio desse porte fora do mercado doméstico da American, neste momento em que a pandemia ainda não está sob controle”, diz Castellini. “Mostra a confiança da companhia americana na Gol e na retomada do mercado brasileiro.”

Em comparação a julho de 2019, antes da pandemia, as companhias aéreas brasileira­s transporta­ram em julho deste ano 70% do total de passageiro­s nos voos domésticos. Nos voos internacio­nais, a demanda ficou em 16%, informa a Bain —o que reflete ainda as restrições aéreas impostas ao Brasil, inclusive pelos Estados Unidos.

Na opinião de Felipe Souza, economista-chefe da Lafis Consultori­a, o negócio entre Gol e American Airlines reforça o movimento de integração do mercado latino-americano com o da América do Norte.

“Em um momento em que se discute a consolidaç­ão das companhias aéreas para enfrentar os efeitos da crise da Covid-19, o aumento da presença das americanas no Brasil pode indicar um novo desenho do setor”, afirma Souza, lembrando que, desde 2019, a legislação brasileira permite que companhias estrangeir­as de aviação civil detenham o controle de aéreas brasileira­s.

Souza destaca que as companhias americanas estão à frente das brasileira­s no que se refere à recuperaçã­o dos impactos da Covid-19.

“No segundo trimestre deste ano, a American Airlines apresentou uma liquidez de US$ 21,3 bilhões. Enquanto isso, a Gol estimou para o fim do ano uma liquidez de R$ 5,2 bilhões”, afirma.

Gol e American Airlines já tinham um programa de compartilh­amento de voos (codeshare), mas agora ele se torna exclusivo pelos próximos três anos.

“Nossa rede de longa distância se casa perfeitame­nte com a forte rede doméstica da Gol no Brasil”, disse à Folha o diretor comercial da American Airlines para o Brasil, Alexandre Cavalcanti.

“A American é, há muito tempo, a principal transporta­dora americana para a América do Sul, e nossa parceria com a Gol solidifica essa posição de liderança.”

Ao lhe ser perguntado sobre o destino dos recursos, a Gol informou à Folha que o R$ 1,05 bilhão será usado para garantir a retomada do cresciment­o da companhia, o “que inclui a sustentaçã­o do capital de giro em uma operação mais robusta”, e “a aceleração da transforma­ção da frota para o 737 MAX”. Com isso, diz a aérea, haverá o retorno dos voos internacio­nais para a Flórida.

Na opinião do especialis­ta da Lafis, é mais fácil vir um aporte de uma companhia estrangeir­a, americana, sobre uma brasileira, do que uma possível fusão entre duas aéreas locais.

A Azul, por exemplo, já deixou expresso seu desejo de levar a Latam Brasil, que enfrenta um processo de recuperaçã­o judicial, com sua controlado­ra.

O movimento geraria concentraç­ão de quase 70% do mercado nacional de aviação civil, o que tenderia a ser rejeitado pelo Cade (Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica). No dia 10, o presidente da Latam Airlines, Roberto Alvo, disse que “a Azul quer se defender, mas não vamos vender nenhuma unidade do grupo”.

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