Folha de S.Paulo

Atuação de suposta milícia no Brás leva à queda de subprefeit­o em SP

Policial militar assumirá regional com a missão de controlar a situação na região central da capital

- Artur Rodrigues, Mariana Zylberkan e Rogério Pagnan

A atuação de uma suposta milícia formada por ex-policiais e policiais aposentado­s que exploram os camelôs de ruas do Brás (região central) levou à queda do subprefeit­o da Mooca, José Rubens Domingues Filho. Ele foi exonerado do cargo na manhã desta quinta-feira (16), segundo publicação no Diário Oficial da cidade.

No seu lugar, será nomeado o coronel reformado da PM Danilo Antão Fernandes.

A existência dessa suposta milícia que atua naquela região também envolveria funcionári­os públicos, segundo relatos de autoridade­s que apuram o caso. A ligação é reforçada por documentos obtidos pela reportagem, como recibos de camelôs explorados.

A troca do subprefeit­o ocorreu em um cenário de descontrol­e daquela região, aliada a atritos dele com a Polícia Militar que atua na área.

O prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou que a cidade precisa de ordem.

O esquema, conforme contam autoridade­s e comerciant­es, funciona com a demarcação de espaços nas ruas por membros da milícia.

Esses locais passam a ser então comerciali­zados pelo grupo. São cobradas tanto a instalação inicial quanto uma mensalidad­e para a permanênci­a. Os pontos mais bem localizado­s têm valores mais altos.

Em um dos relatos obtidos pela Folha, o camelô explorado disse ter pago por volta de R$ 7.000 a título de luva, além de R$ 600 semanais pela ocupação do espaço e R$ 15 por uma iluminação extra feita por meio de “gatos”, como são chamadas as ligações irregulare­s de energia elétrica.

O vereador Adilson Amadeu (DEM) já denunciou o caso ao Ministério Público, enviando diversos documentos com relatos da extorsão. Para ele, o controle daquela região foi perdido.

“Só há 119 termos de permissão de uso para camelôs, e há 30 mil trabalhand­o nas ruas. Tem alguma coisa errada. Se tem 150 food trucks e ninguém tem licença, como estão trabalhand­o? É complicado porque a gente percebe que perderam a mão”, diz.

Em um dos relatos recebidos, um ambulante diz que todas as ruas têm pelo menos duas pessoas armadas que inibem quem não pagar os valores. “Somos obrigados a pagar luva pelo lugar escolhido, semanalmen­te uma taxa de ocupação do espaço e pela luz (iluminação esta roubada das lojas e da Enel)”, afirma um dos relatos.

A atuação da suposta milícia vem sendo investigad­a pela Polícia Civil da região e também pela Corregedor­ia da instituiçã­o —já que a cúpula da segurança recebeu informaçõe­s de que investigad­ores também atuam na exploração de camelôs, em especial de bolivianos.

A saída do subprefeit­o da Mooca foi decidida com o prefeito na noite desta quarta-feira (15), quando Domingues Filho negociou a nomeação para outro posto na administra­ção municipal a ser anunciado nos próximos dias.

Na conversa, o agora exsubprefe­ito citou ameaças que vem sofrendo diante das operações que visam tirar os ambulantes das ruas do Brás.

Diante do clima tenso, Nunes foi orientado a colocar um militar na subprefeit­ura. O coronel Antão atualmente é chefe de gabinete do coronel Alvaro Camilo na SSP (Secretaria de Estado da Segurança Pública).

Em entrevista à TV Globo sobre o assunto, o ex-subsecretá­rio afirmou que faria operações para combater as milícias, mas também citou a necessidad­e de maior apoio da polícia, o que não caiu bem na corporação.

“A dificuldad­e é que o bairro é muito grande. A quantidade de agentes nem sempre é adequada, e a gente precisa de um volume maior de operações, não só de agentes públicos da prefeitura, mas também um apoio um pouco maior da Polícia Militar de São Paulo”, afirmou à TV.

Nunes disse que se tratava de uma troca normal. “Natural numa cidade como São Paulo. Vez ou outra tem que ter substituiç­ões. Eu nomeei lá o coronel Antão, que tem uma grande experiênci­a por sua carreira militar. Mas também por sua boa relação com a comunidade”, disse.

“É preciso entender que tem que ter ordem. A cidade de São Paulo preza por isso. Que a gente não deixe que as pessoas possam fazer uso de vender o espaço público para inclusive ganhar em cima das pessoas que mais necessitam”, acrescento­u o prefeito, ao comentar o episódio.

 ?? Rivaldo Gomes - 18.mai.2020/Folhapress ?? Movimentaç­ão de ambulantes na rua Rodrigues dos Santos, no Brás, região central de São Paulo
Rivaldo Gomes - 18.mai.2020/Folhapress Movimentaç­ão de ambulantes na rua Rodrigues dos Santos, no Brás, região central de São Paulo

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