Fortaleza aprova lei que cria campanha contra o aborto e o uso de métodos anticoncepcionais
Uma lei aprovada em Fortaleza propõe “campanhas publicitárias e informativas” contra o aborto e o uso de anticoncepcionais.
O texto passou pela Câmara de Vereadores da capital do Ceará e foi sancionado no último dia 9 pelo prefeito Sarto Nogueira (PDT), que é médico ginecologista e evangélico.
Depois de críticas nas redes sociais, o prefeito disse que não irá pela prefeitura criar peças publicitárias sobre os dois temas.
Mas, na terça (14), a gestão publicou decreto sobre “ações e atividades públicas municipais que venham a ser adotadas em contribuição à Semana pela Vida”. O documento, no entanto, não detalha que ações a prefeitura promoverá.
Após o decreto, Nogueira comentou a decisão em uma transmissão ao vivo pela internet. “É importante que fique claro: essa lei não obriga o município de Fortaleza a fazer qualquer tipo de campanha, e não temos nenhuma previsão de realizar campanha dessa natureza”, afirmou.
“A minha posição como médico é bem clara e quero deixar clara para todos que estão nos escutando. Na posição de médico ginecologista, já receitei uso de contraceptivos. Tem métodos comprovadamente eficazes e seguros.”
Atualmente, a legislação brasileira autoriza o aborto em casos específicos —de estupro, risco de morte da mãe ou quando o bebê é anencéfalo, defeito na formação do sistema nervoso central do feto.
Em relação aos anticoncepcionais, que chegaram ao Brasil no início da década de 1960, o SUS (Sistema Único de Saúde) disponibiliza oito tipos de gratuitamente.
As opções vão da camisinha ao DIU (Dispositivo Intrauterino). Também são realizados na rede pública procedimentos cirúrgicos de laqueadura, vasectomia e esterilização masculina.
A lei 11.159, em tramitação desde 2017, é de autoria do vereador Jorge Pinheiro (PSDB), da comunidade Shalom, ligada à renovação carismática da Igreja Católica.
Ela cria a “Semana pela Vida”, permitindo “campanhas publicitárias e informativas” contra o aborto e o uso de anticoncepcionais.
Pelo texto da lei, essa semana deve ser de promoção de “campanhas publicitárias, institucionais, seminários, palestras e cursos” sobre gestação e cuidados com o parto.
Também cita campanhas “contra a prática do aborto, mediante o convênio com organizações que ofereçam suporte psicológico, social e médico a gestantes, bem como orientações dos malefícios do aborto à mulher, sem qualquer promoção da prática ou de seus supostos benefícios ou facilidades”.
Em outro trecho, a lei sugere “campanhas de informação a respeito dos malefícios médicos e psicológicos da utilização de anticoncepcionais”.
O texto cita ainda “o reconhecimento público de entidades que atuem na luta contra o aborto e em defesa da vida em todos os seus estágios, desde a fecundação até o seu ocaso natural”.
Nas redes sociais, o prefeito recebeu críticas tanto de apoiadores quanto de movimentos feministas. Alguns comentários intitularam-na como “lei de The Handmaid’s Tale”, em alusão à série de televisão dos EUA sobre um regime opressivo contra mulheres, baseada no livro “O Conto da Aia”, de Margaret Atwood.
Para o Coletivo Juntas, grupo que se manifestou contra o prefeito, a lei é “absurda e retrocede em décadas as lutas e avanços dos direitos sexuais e reprodutivos das meninas e mulheres em nosso país”.
“Não bastando fortalecer a criminalização do aborto, [a lei municipal] avança para retroceder a legislação atual, colocando uma régua moral e completamente irracional, que se aproxima ao negacionismo científico, e ignora que, na verdade, esse debate deve ser de saúde pública”, escreveu o grupo.
Questionada pela reportagem sobre o motivo de ter sancionado uma lei que não é para ser cumprida, a assessoria do pedetista informou que “a lei apenas insere essa semana no calendário de eventos do município, mas não obriga a realização”.
“Essa lei não obriga o município de Fortaleza a fazer qualquer tipo de campanha, e não temos nenhuma previsão de realizar campanha dessa natureza
Sarto Nogueira prefeito de Fortaleza