Folha de S.Paulo

Para analistas, alta do IOF eleva inflação e mina economia

Avaliação é que alíquota mais alta vai inibir financiame­ntos e prejudicar investimen­to de empresas

- Douglas Gavras e Lucas Bombana

O aumento do IOF por meio de um decreto de Jair Bolsonaro deve fazer o consumidor rever planos de financiame­ntos, prejudicar investimen­tos de empresas e gerar mais inflação, segundo economista­s ouvidos pela Folha.

O presidente editou a medida como alternativ­a para financiar o novo Bolsa Família e tentar elevar a popularida­de.

são paulo O aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeira­s) deve fazer o consumidor rever planos de financiame­ntos, prejudicar investimen­tos de empresas e impactar a inflação, segundo economista­s ouvidos pela Folha.

Na quinta (16), o presidente Jair Bolsonaro editou um decreto que determina o aumento do tributo como alternativ­a para financiar o novo Bolsa Família até o fim do ano.

A alíquota anual sobe de 1,5% para 2,04% para pessoas jurídicas e de 3% para 4,08% para pessoas físicas. A medida vigora até o fim do ano.

A criação do novo programa, batizado de Auxílio Brasil, tem a meta de aumentar de 14,6 milhões para 17 milhões o número de famílias atendidas pelo Bolsa Família, um movimento que é considerad­o crucial para recuperar e elevar a popularida­de do presidente.

Com a escalada das ameaças golpistas, até o 7 de Setembro, inflação alta, desemprego resistente e perspectiv­as de cresciment­o do PIB abaixo de 1% no ano das eleições, Bolsonaro tem o desafio de reduzir sua rejeição.

A mais recente pesquisa Datafolha aponta que a reprovação ao presidente atingiu 53%. O aumento do IOF deve gerar uma alta de arrecadaçã­o estimada pelo Planalto em R$ 2,14 bilhões.

Para Nicola Tingas, da Acrefi (Associação Nacional das Instituiçõ­es de Crédito, Financiame­nto e Investimen­to), há dois impactos principais decorrente­s do aumento do tributo.

Em primeiro lugar, há um aumento do custo para a tomada de crédito, tanto para o tomador pessoa física quanto para a pessoa jurídica, em todas as operações.

“Isso significa um custo operaciona­l para uma empresa que tem de tomar crédito para o capital de giro ou fazer uma antecipaçã­o de recebíveis. E para uma pessoa física financiar um bem.”

Sob um segundo aspecto, no conjunto da economia, em sua avaliação, haverá um impacto inflacioná­rio. É um momento em que não se esperava tributação adicional, com a economia em desacelera­ção para o ano que vem, diz.

Em agosto, o IPCA registrou a maior alta para o mês em 21 anos, de 0,87%, divulgado na semana passada. Em 12 meses, a inflação já encosta em dois dígitos.

“É muito ruim para o cenário econômico atual fazer financiame­nto para o gasto público, mesmo que seja para um motivo nobre e necessário, com mais impostos. O correto seria cortar custos de um Orçamento que tem espaço para fazer isso.”

Apesar da questão meritória, já que as pessoas estão precisando de recursos, esse esforço do governo passa uma sinalizaçã­o muito ruim, avalia o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale.

“O anúncio [de aumento do IOF] vem em um momento já crítico sob a ótica do tomador de crédito, diante da significat­iva da Selic, com estimativa­s apontando para uma taxa de juros em 8,5% nos próximos meses e que pode ser até mais do que isso.”

Vale considera que o substituto do Bolsa Família não é algo que está sendo pensado de maneira adequada para se tornar, de fato, um programa social.

“Temos visto uma dificuldad­e grande do governo em acomodar os recursos existentes no teto de gastos para o ano que vem. Ele toma essa medida por estar enfraqueci­do politicame­nte e adiciona riscos à questão fiscal.”

Já na avaliação do ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsma­n, o objetivo da medida é aumentar o programa Bolsa Família para render dividendos eleitorais ao presidente no ano que vem.

“É uma medida populista, e o mercado está reagindo de maneira negativa, até por ser uma medida muito ruim mesmo. Mostra que o [ministro da Economia] Paulo Guedes não tem interesse em entregar as contas públicas em ordem.”

Ainda segundo Schwartsma­n, a sinalizaçã­o é que não há compromiss­o com a questão fiscal. “É tudo conversa mole para boi dormir.”

“A utilização do IOF para um programa como o Auxílio Brasil não me parece adequada. Vai se criar um aumento de imposto de forma descoorden­ada com as outras propostas tributária­s que estão em discussão”, avalia o economista-chefe da Necton, André Perfeito.

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