4 de 10 alemães não sabem em quem votar a 8 dias de eleição
Pleito vai definir sucessor de Angela Merkel no país mais poderoso da Europa
bruxelas A pouco mais de uma semana da eleição que vai escolher o sucessor de Angela Merkel como premiê da Alemanha, nunca os eleitores do país estiveram tão indecisos, mostrou levantamento do instituto Allensbach para o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, divulgado na terça (14).
De cada 10 alemães que pretendem participar da eleição, 4 dizem não saber em quem vão votar no domingo, dia 26. É o maior índice da história a tão pouco tempo do pleito. Quatro anos atrás, os indecisos eram 35%, e em 2013, 24%.
Em jogo está o futuro da principal potência europeia, cujo PIB em 2020 se aproxima de US$ 4 trilhões (R$ 21 tri, pelo câmbio atual), e quinta maior economia do mundo, de acordo com cálculos do Banco Mundial que relativizam o poder de compra para permitir comparações (PPP).
A Alemanha tem peso preponderante, ao lado da França, em decisões europeias sobre estratégias de defesa e relações com a Rússia e a China, o que faz desta a “eleição de maior consequência global neste ano”, nas palavras do presidente da consultoria de risco político Eurasia e colunista da Folha, Ian Bremmer.
Apesar da relevância, pesam na indecisão dos 40% a pouca confiança nos candidatos (63% disseram considerá-los “não convincentes”), o descontentamento com os partidos (56%) e a sensação de que “muita coisa ainda pode acontecer” até a votação (42%).
O fato é que essa é uma eleição cheia de “nunca antes”, a começar por Merkel não estar na disputa: é a primeira vez em 75 anos que um premiê no cargo não se lança à reeleição.
Isso tira de jogo o que cientistas políticos chamam de “efeito desempenho”: a possibilidade de votar com base na aprovação ou na rejeição do que foi feito no passado.
Nomes novos no cenário político como candidatos e a possibilidade de que sejam necessários três partidos para governar também ajudam a embaralhar as peças.
Pela média de pesquisas recentes, dois partidos ocupam a dianteira das intenções de voto: o social-democrata SPD, de centro-esquerda, e o democrata-cristão União (CDUCSU) —o partido de Merkel—, de centro-direita. Eles têm 26% e 21% das intenções de voto, respectivamente.
Os Verdes, que chegaram a liderar em maio, aparecem em terceiro lugar, com 16%. Em seguida vêm os liberais FDP, de direita, e os nacionalistas AfD, de ultradireita, com 11% da preferência eleitoral.
Os alemães votam em deputados, não no candidato a premiê. Da agremiação com maior número de representantes eleitos costuma sair o nome do primeiro-ministro, que precisa ser aprovado pela maioria do Bundestag (equivalente à Câmara dos Deputados).
No momento, o favorito é o ministro das Finanças, Olaf Scholz, do SPD, mas seu desafio não termina ao final da contagem de votos. Se as porcentagens previstas pelas pesquisas se mantiverem, ele precisará do apoio de ao menos outros dois partidos, numa negociação longe de ser fácil.
Há várias combinações possíveis de siglas em jogo —o SPD poderia, por exemplo, formar governos tanto mais à direita quanto mais à esquerda—, o que aumenta a indecisão do eleitor interessado em fazer a escolha a partir da plataforma de governo, em vez de pelos nomes dos políticos.
Na prática, pode estar acontecendo o contrário. A forte flutuação nas pesquisas eleitorais deste ano, mais um fenômeno inédito, pode indicar o que especialistas chamam de “efeito candidato”, segundo o cientista político Rüdiger Schmitt-Beck, da Universidade de Mannheim.
A popularidade aparente do social-democrata Scholz pode ter reanimado antigos simpatizantes do SPD antes desanimados ou insatisfeitos — até o final de julho, o partido vinha se arrastando na faixa de 15% das intenções de voto.
Em levantamento do Politbarômetro da ZDF, 67% dos eleitores disseram considerar Scholz adequado para ser premiê, contra 29% dos que preferem o candidato da União, Armin Laschet, e 26% dos que aprovam a candidata dos Verdes, Annalena Baerbock.
Efeito semelhante, mas com sinal trocado, pode ter acontecido no caso de Laschet, que não era o favorito entre seus partidários. SchmittBeck diz que, insatisfeitos com a escolha, apoiadores dos democratas-cristãos podem estar dizendo que nem pretendem votar, mas há chances de que apareçam na última hora.
“A União é a mais subestimada. Tenho certeza de que o partido se sairá melhor do que parece até agora”, disse ele em entrevista ao t-online.
O fato de que os três líderes das pesquisas são relativamente desconhecidos faz crescer a importância dos debates na TV, segundo analistas. O último deles, que acontece neste domingo (19), pode afetar o resultado da eleição.
Apesar da indecisão, a intenção de ir às urnas é grande: 72% afirmaram ter certeza de que vão votar (com mais idosos e mais ricos acima da média), e outros 15% dizem que pretendem comparecer, elevando a porcentagem a 87%. Na eleição de 2017, 76% dos eleitores registrados votaram.
Mais uma diferença desta eleição é o crescimento do voto por correspondência, algo que ganhou força em vários países europeus durante a pandemia de Covid. Cerca de 40% dos eleitores registrados dizem que enviarão sua escolha pelo correio —o que, segundo analistas, torna o resultado ainda mais imprevisível, já que os votos são decididos em momentos diferentes antes do dia 26.