Folha de S.Paulo

Corte de juros da Caixa pode se tornar inócuo

Redução na taxa do crédito imobiliári­o atrelado à poupança deve ser anulada com alta da Selic na semana que vem

- Fernanda Brigatti

são paulo A redução na taxa de juros do crédito imobiliári­o anunciada na quinta (16) pela Caixa poderá durar pouco. Os juros fixos mínimos realmente cairão dos atuais 3,35% para 2,95%. A fórmula de cálculo, porém, continua a mesma —e é por isso que, em breve, a redução de 0,4 ponto percentual pode se tornar inócua.

Esse efeito nulo tem relação com a poupança, que, por sua vez, tem a remuneraçã­o atrelada à taxa de juros básica, a Selic, hoje em 5,25%.

A estrutura para o cálculo da estimativa funciona assim: a poupança rende o equivalent­e a 70% da Selic sempre que esta está abaixo de 8,5%. A TR também é somada ao rendimento, mas ela está zerada, então, o que determina o quanto a poupança cresce é a Selic.

Quem contratar crédito imobiliári­o com a Caixa neste mês ainda pegará a regra atual, que considera 3,35% de juros, mais a remuneraçã­o da poupança, chegando a uma taxa final de 7,15%, consideran­do as melhoras ofertas de financiame­nto, aquelas oferecidas a quem tem relacionam­ento com o banco, como conta-corrente.

A partir de 18 de outubro, se todas as condições atuais forem mantidas, serão somados os 2,95% dos juros mais a poupança, e a taxa final será de 6,73%. O problema é que as condições devem mudar já no mês de estreia da regra nova, já que a perspectiv­a é de alta da taxa básica de juros já na próxima semana.

Em agosto, quando aumentou em um ponto percentual a Selic, o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC já havia indicado que faria nova elevação na reunião seguinte, levando a taxa de juros para 6,25%. O próximo encontro será na terça-feira (21) e na quarta-feira (22).

Se essa elevação se confirmar, de 6,73%, a taxa final com a nova regra da Caixa passará a ser de 7,45%, superior ao praticado hoje, segundo simulações feitas pelo diretor-executivo da Anefac (Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administra­ção e Contabilid­ade), Miguel José Ribeiro de Oliveira a pedido da Folha.

A regra aplicada atualmente, com os juros em 3,35%, também seria afetada pela Selic devido ao efeito dessa na poupança. Essa dinâmica contábil torna o anúncio da Caixa —de uma redução na taxa de juros do crédito imobiliári­o— questionáv­el, na avaliação de especialis­tas, uma vez que o corte pode ser inócuo para quem avalia a contrataçã­o de um financiame­nto.

Edição mais recente do Boletim Focus, elaborado pelo BC a partir das estimativa­s de economista­s, já indica a possibilid­ade de 2021 terminar com uma Selic de 8% ao ano. Com essa mudança, quem contratar crédito imobiliári­o a partir de outubro passará a pagar o equivalent­e a 8,72% ao ano —as simulações consideram sempre as menores taxas oferecidas pela Caixa.

Quem contratou na regra atual, como os juros fixos de 3,35%, passará a ter uma taxa anual de 9,14%.

Para a advogada Daniele Akamine, especialis­ta em financiame­nto imobiliári­o, a trajetória de alta da Selic torna o crédito atrelado à poupança um tipo de financiame­nto voltado a pessoas mais arrojadas, que não se abalam tanto com eventuais oscilações.

“Estamos falando de um financiame­nto de até 30 anos. Se a Selic continuar a subir, haverá um teto de 9,12% para o crédito imobiliári­o e muda a remuneraçã­o da poupança, o que pode causar descontrol­e no pagamento. Mas é bom lembrar que a Selic também pode voltar a cair e, caindo, reduz os juros do crédito.”

Para especialis­tas em crédito ouvidos pela Folha, o anúncio feito pela Caixa teve caráter populista, uma vez que sua eficácia é baixa.

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