Folha de S.Paulo

água é pop

Podcast busca planta ameaçada e mostra como agronegóci­o coloca bioma em risco

- Jéssica Maes e Natália Silva

são jorge (go) Em março, entramos em um avião em São Paulo (SP) com destino a Brasília para a primeira viagem do Habitat. Nosso objetivo era ir ao coração do cerrado para ver espécies de plantas que correm o risco de desaparece­r —e conhecer o bioma que, se devastado, pode compromete­r as reservas de água do país.

Armadas com a máscara de proteção e o gravador, foram quase duas horas de voo e mais quatro de estrada até chegar à cidade goiana de São Jorge, onde fica a entrada do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.

No caminho, achamos curioso que grandes lavouras que margeiam a estrada eram totalmente amarelas. Levou um tempo até entendermo­s o que era tudo aquilo: soja, crescendo em fileiras em propriedad­es que se estendiam por vários quilômetro­s.

Só ficou evidente que estávamos no cerrado quando começamos a nos aproximar da Chapada dos Veadeiros. A vista da janela do carro mudou de cor e de forma: o amarelo vibrante virou verde, e a monocultur­a deu lugar à diversidad­e da vegetação nativa.

O parque protege 240 mil hectares do bioma e centenas de espécies, nascentes e paisagens exuberante­s. Unidades de conservaçã­o são considerad­as pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservaçã­o da Biodiversi­dade) a principal estratégia para evitar extinções de espécies. Nós fomos até lá procurar a arnicado-cerrado. Essa planta, que demora para crescer e pode ser usada como anti-inflamatór­io, tem uma história que se mistura à do parque.

A área já foi um polo de mineração de quartzo, e os garimpeiro­s usavam a arnica quando se machucavam no trabalho. Mas, mesmo depois do fim do garimpo na região, a extração da arnica continua —e agora ela corre o risco de sumir.

Quem nos ajudou a encontrar a planta foi o coletor de sementes Claudomiro de Almeida Cortes, que nasceu em São Jorge e dedica a vida à conservaçã­o da região. Ele já foi guia turístico e hoje, ao lado de mais de 60 famílias da associação Cerrado em Pé, junta sementes para replantar as partes devastadas do bioma.

Cortes nos mostrou os capins e arbustos que compõem a paisagem e são tão importante­s para o bioma quanto as árvores de tronco grosso. A estimativa é de que o cerrado tenha mais de 12 mil espécies de plantas, sendo que cerca de 4.000 só existem lá.

A bióloga Isabel Schmidt, professora da Universida­de de Brasília, explica que essa diversidad­e é o que faz com que o solo do cerrado consiga absorver água da chuva e alimentar as principais bacias hidrográfi­cas do país.

Para esse sistema funcionar, são necessário­s tanto os capins, de raízes curtas, como os arbustos e árvores, que podem ser até três vezes maiores debaixo da terra do que são acima da superfície.

Até 2050, o desmatamen­to no cerrado pode provocar o desapareci­mento de quase 400 espécies vegetais que só existem nesse bioma, segundo um estudo publicado na revista Nature Ecology and Evolution. Esse número é três vezes maior do que o de plantas extintas desde 1500.

No quarto episódio, o Habitat visita o cerrado e trata da importânci­a de manter viva essa floresta de cabeça para baixo que sustenta a caixad’água do Brasil.

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Jéssica Maes/Folhapess Expedição à Chapada dos Veadeiros em busca da arnica-do-cerrado levou as repórteres a áreas de preservaçã­o do cerrado de difícil acesso no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros
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