Folha de S.Paulo

Setor de motorhomes lida com alta demanda e falta de peças

- Eduardo Sodré

SÃO PAULO Embaixo de um motorhome, há um automóvel. Essa premissa explica o problema dos empreended­ores que fabricam ou alugam esses veículos: os modelos viraram tendência em meio à pandemia, mas há dificuldad­es para atender a demanda.

A falta de componente­s e a inflação dos insumos —como o aço, que acumula alta próxima a 100% entre 2020 e 2021— atrasam a produção de veículos leves e pesados. Por consequênc­ia, há aumento nos custos e demora na entrega de componente­s para a montagem das casas sobre rodas.

“Tivemos dificuldad­e em 2020 por conta da pandemia e do atraso das importaçõe­s. Algumas peças que deveriam ter chegado no primeiro semestre só desembarca­ram no final do ano passado”, diz o engenheiro Júlio Lemos, que é um dos fundadores da Estrella Mobil Motorhomes.

Os problemas de montagem ocorrem em meio ao aumento da procura. Segundo os dados da Estrella Mobil, as vendas cresceram 60% na comparação entre os primeiros sete meses de 2020 e de 2021.

“Quando surgiu a pandemia, começaram a aparecer aquelas pessoas que, mesmo antes da quarentena, já pensavam em um novo formato de viajar ou que não sabiam que existia a cultura de motorhome no Brasil”, afirma Lemos. “A pandemia não foi um empurrãozi­nho, mas, sim, um grande pontapé para esse cresciment­o.”

A Vandão Motorhomes, empresa focada no aluguel, registrou cresciment­o da demanda em períodos cujas atividades eram mornas. A lista de espera tem 175 nomes cadastrado­s.

“Estamos com muita dificuldad­e para encontrar peças —principalm­ente as importadas— para montar os motorhomes que alugamos, e os veículos zero-quilômetro aumentaram bastante de preço”, diz Aline Frediani, diretora de marketing da empresa.

O aluguel de um motorhome é calculado com base no número de diárias e na quilometra­gem rodada. Viajar com um veículo para seis adultos por sete dias (média de 2.500 quilômetro­s) custa R$ 7.927 na Vandão, com taxas de seguro e limpeza inclusas.

Os problemas de fornecimen­to afetam os planos futuros. Segundo Aline, a empresa pretende substituir os veículos com mais de três anos de uso até o fim de 2022, mas a escassez de componente­s tende a perdurar.

Ao mesmo tempo, é preciso fazer um planejamen­to que considere mudanças no mercado de motorhomes. “Acreditamo­s que, com a regulariza­ção das atividades [após as restrições da pandemia], a demanda será menor no próximo ano e a tendência da procura é diminuir”, afirma Aline.

Segundo a Estrella Mobil, o perfil do público mudou com a Covid. Em 2018, 80% dos compradore­s eram aposentado­s e profission­ais liberais. Apenas 20% das vendas eram direcionad­as a um cliente com idade até a faixa dos 40 anos.

Com a pandemia, houve aumento do interesse pelos veículos entre pessoas mais jovens, e as vendas nesse segmento passaram dos 20% para 35% do total.

A alta do preço das vans que servem de base para a maior parte dos motorhomes tem pressionad­o os construtor­es. Hoje um furgão Renault Master é comerciali­zado por a partir de R$ 206,8 mil. Em janeiro do ano passado, o preço sugerido era de R$ 115 mil.

De acordo com a Estrella, um motorhome para quatro adultos custa, em média, R$ 380 mil. Trata-se de um veículo com valor elevado, mas a procura segue alta.

“Estamos ampliando a fábrica para nos adequar à demanda. Hoje nosso prazo de fabricação varia de quatro meses para veículos menores e até 12 meses para os caminhões de expedição”, diz Lemos, que espera crescer 20% em 2022 na comparação com 2021.

Oskar Kedor, fundador da startup Mobility S/A, participou de fóruns que discutiram o futuro do turismo e da mobilidade. Os cenários traçados ao longo de 2020 mostravam que o mercado de viagens corporativ­as seria o último a se recuperar, enquanto o segmento de motorhomes passaria pela maior expansão.

“Estamos com uma demanda reprimida também nos EUA e na Europa. Quem produz está inflaciona­ndo o mercado, tem fila de espera”, diz Oskar. O empresário explica que o motorhome se tornou prioridade para pessoas que adiavam o sonho de fazer uma longa viagem em família.

Ele compara os modelos mais luxuosos com os iates, que têm marinas com estrutura para receber viajantes de alta renda. Esse é um público que começa a se formar, interessad­o em modelos que custam R$ 700 mil.

Apesar das dificuldad­es, o empresário vê surgir oportunida­des no setor de turismo em meio à pandemia.

“Temos profission­ais que, por exemplo, fazem viagens a destinos próximos e ali conciliam o seu home office com momentos de lazer”, diz Oskar.

“Mais do que fechar pacotes tendo em vista apenas os períodos de férias, o agente de viagem passa a ser um consultor para oferecer as opções que melhor atendam às necessidad­es e experiênci­as desejadas pelo cliente em suas demandas de mobilidade.”

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Divulgação Motorhome Rigel, da Estrella Mobil, é construído sobre a van Mercedes Sprinter

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