Folha de S.Paulo

Custo de medidas para enfrentar crise de energia chega a R$ 140 bi, estima instituto

- Nicola Pamplona

rio de janeiro A série de medidas tomadas pelo governo para enfrentar a crise hídrica que derrubou os níveis dos reservatór­ios das hidrelétri­cas brasileira­s vai custar ao consumidor ao menos R$ 140 bilhões, que serão pagos na conta de luz nos próximos anos.

O cálculo é o ICS (Instituto Clima e Sociedade), que questiona ainda os impactos ambientais da estratégia adotada pelo governo, de privilegia­r o aumento da oferta de energia em vez de incentivar economia e investimen­tos em eficiência energética.

A conta do custo para o consumidor considera a elevada geração de térmicas para suprir o mercado em 2020 e a decisão de contratar usinas mais caras para os próximos anos, tanto em leilão emergencia­l promovido pelo governo quanto pela inclusão de jabutis na lei de privatizaç­ão da Eletrobras.

“Embora o risco de apagão tenha arrefecido neste ano, a gente segue com custo para o consumidor bastante alto, com tendência de aumentos para a frente”, disse a coordenado­ra do ICS Amanda Ohara, nesta segunda (22).

Os R$ 140 bilhões incluem R$ 11,8 bilhões referentes a térmicas em operação, R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões correspond­entes a empréstimo em negociação pelo governo para bancar novas usinas, R$ 39 bilhões para pagar a operação dessas novas usinas e R$ 78,3 bilhões referentes aos jabutis da lei da Eletrobras.

Esse último valor foi estimado pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), segundo o ICS, como necessário para pagar os benefícios dados pela lei aos segmentos de gás natural e de energias renováveis.

“[O impacto na conta] não é acumulado em um ano, mas é um valor significat­ivo, consideran­do que o faturament­o do setor foi de R$ 162 bilhões em 2019”, comparou Ohara, defendendo que programas de eficiência energética poderiam ter impacto na solução da crise com custos menores.

Para tentar evitar um reajuste de 21% nas contas de luz em 2022, quando Jair Bolsonaro estará em campanha pela reeleição, o governo tenta acelerar a privatizaç­ão da Eletrobras, que prevê aporte de recursos em encargos cobrados nas tarifas, e agilizar o empréstimo para bancar as térmicas.

O grupo ministeria­l de resposta à crise chegou a lançar dois programas de redução de consumo, um para indústrias e outro para consumidor­es de pequeno porte, mas ainda não há informaçõe­s sobre a efetividad­e nem sobre os custos que tiveram.

O primeiro foi descontinu­ado em novembro pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), sob o argumento de que as chuvas eliminaram o risco de problemas nos horários de maior consumo. O segundo ainda está vigente, mas dados sobre o consumo indicam baixa adesão.

O coordenado­r do Programa de Energia e Sustentabi­lidade do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), Clauber Leite, diz que o custo da crise energética é uma “herança maldita” da falta de planejamen­to do governo.

“Já estamos vivendo um racionamen­to via tarifa, e a escolha foi não ter programa de redução de consumo”, afirma, criticando ainda as distorções do modelo de precificaç­ão da energia no país, que vem prejudican­do os consumidor­es ligados a distribuid­oras.

A queixa, nesse caso, é que os preços de negociação despencara­m nas últimas semanas, puxados pelo aumento da previsão de chuvas, mesmo que a geração térmica ainda esteja a plena capacidade.

Com energia sobrando após o início da pandemia, as distribuid­oras de eletricida­de poderiam estar lucrando com a venda do excedente, o que seria revertido em descontos para o consumidor. “É um modelo insustentá­vel”, afirma.

Embora o risco de apagão tenha arrefecido neste ano, a gente segue com custo para o consumidor bastante alto, com tendência de aumentos para a frente Amanda Ohara coordenado­ra do ICS (Instituto Clima e Sociedade)

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