Folha de S.Paulo

Vida de gado

- Mariliz Pereira Jorge

Por que petistas acreditam que Lula e o PT não podem ser cobrados por suas declaraçõe­s quando relativiza­m ou enaltecem ditaduras? O ex-presidente deve ser um dos protagonis­tas da eleição que tem a missão de recuperar a esfacelada democracia no Brasil. O declínio foi também identifica­do por um levantamen­to da organizaçã­o Internatio­nal Idea.

Não é opcional que Lula, além de todos os partidos e políticos de esquerda, se posicione sem titubear em relação a governos autoritári­os. É assim que já são listados Nicarágua, Venezuela e Cuba no relatório em que o Brasil é apontado como o que mais perdeu atributos democrátic­os em 2022.

Jair Bolsonaro é um autocrata que flerta com um golpe desde antes da eleição. Para se opor a ele e abraçar um compromiss­o com as instituiçõ­es não cabe concessões ou espaço para que se trace paralelos estapafúrd­ios, como fez Lula ao comparar os 16 anos de governo de Angela Merkel aos do ditador Daniel Ortega.

O ex-presidente diz que não pode julgar o que aconteceu na Nicarágua. Mentira. Pode e deve condenar uma ditadura, inclusive em aceno a eleitores que desconfiam das intenções de sua possível volta.

À direita ou à esquerda, quem acha que não cabe à imprensa e a seus articulist­as cobrar da classe política o compromiss­o irrestrito com a democracia, fala em regulament­ação dos meios e demoniza profission­ais, vai muito além do direito de exigir que o jornalismo seja imparcial. Mostra que se pudesse colocaria um cabresto e que a cobertura seria, sim, puro chorume ideológico.

Para os extremista­s não basta que se critiquem os arroubos autoritári­os, a incompetên­cia, os crimes contra a população, que sejam denunciado­s o aparelhame­nto de órgãos e a corrupção do governo Bolsonaro. Para o petista de cabresto, a imprensa que presta é aquela que Jamais desaprova o partido e muito menos Lula. Gado é gado. E gado sempre acha feio o que não é espelho.

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