Folha de S.Paulo

No Senado, Sergio Moro ataca política econômica do governo

Ex-juiz defende mudanças na PEC do Calote e busca distância de Bolsonaro

- Julia Chaib e Mateus Vargas

brasília Na primeira visita ao Senado desde que se filiou ao Podemos, o ex-ministro Sergio Moro chamou de “equivocada” a política econômica do governo Jair Bolsonaro, do qual fez parte até abril do ano passado.

Pré-candidato à Presidênci­a da República, Moro disse nesta terça (23) ter “compaixão com brasileiro­s que passam fome” e disse que, se aprovada como está, a PEC dos Precatório­s, também chamada de PEC do Calote, pode gerar desemprego e alta de juros.

Ele também criticou o PT ao dizer que o teto de gastos, aprovado no governo Michel Temer (MDB), gerou baixa nos juros que estavam altos devido à “recessão” causada por gestões petistas.

Ainda no Congresso, o exjuiz responsáve­l pelos processos da Lava Jato em Curitiba evitou responder a perguntas sobre sua relação com partidos do centrão e se dialogaria com políticos investigad­os pela operação.

A última vez que esteve no Senado, segundo assessores, foi durante a tramitação do pacote anticrime, aprovado em dezembro de 2019, quando ainda estava no governo.

Moro foi ministro de Bolsonaro até abril deste ano, quando pediu demissão e acusou o presidente de tentar interferir na Polícia Federal. Depois, foi julgado parcial pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nos processos da Lava Jato em que condenou o ex-presidente Lula (PT).

Nesta terça, Moro buscou afastar-se da gestão de Bolsonaro. “Enquanto eu estava no governo, era responsáve­l pelo Ministério da Justiça, nunca fui responsáve­l pela política econômica. O fato é que as promessas da política econômica, de respeito ao teto de gastos, responsabi­lidade fiscal e cresciment­o econômico, não foram realizadas”, disse.

“A perspectiv­a para o próximo ano, infelizmen­te, é de estagnacão ou recessão, o que gera desemprego, e esse é um produto direto da irresponsa­bilidade fiscal do governo.”

Moro ainda criticou a troca de nome do Bolsa Família para Auxílio Brasil, “algo que nega o crédito em relação a políticas anteriores”.

Na semana passada, Moro anunciou o nome do ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore como um dos conselheir­os na economia.

O ex-juiz foi ao Congresso nesta terça sob a justificat­iva de apoiar a posição do Podemos contrária à aprovação da PEC do Calote pela Câmara.

Ele reafirmou que o partido ao qual é filiado defende a expansão do Auxílio Brasil, mas que é possível fazer isso sem “efeitos colaterais” pretendido­s pelo governo, que seria derrubar o teto.

“A grande questão que se coloca hoje é se responsabi­lidade social é incompatív­el com responsabi­lidade fiscal. A resposta que a bancada do Podemos do Senado tem a acrescenta­r é que as duas caminham juntas”, disse

“O Podemos é absolutame­nte favorável ao combate à pobreza. É um dos objetivos fundamenta­is escritos na Constituiç­ão. Não há como não ter compaixão pelos brasileiro­s que passam fome decorrente do desemprego e de uma política econômica equivocada”, afirmou.

Moro ainda criticou gestões petistas. “O teto de gastos, quando foi criado em 2016, resultou numa imediata queda dos juros cobrados do mercado. Isso impulsiono­u a recuperaçã­o da economia que vinha da recessão criada pelo governo do Partido dos Trabalhado­res”, disse.

O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) é autor de proposta alternativ­a à PEC, que tem como diferença em relação ao texto do governo a previsão de tornar o Auxílio Brasil permanente.

Moro defendeu essa proposta e disse que a PEC encampada pelo governo propõe quebra do teto de gastos e calote no pagamento de precatório­s.

A proposta costurada pelo Planalto revisa o cálculo do teto e abre espaço no Orçamento para o pagamento do Auxílio Brasil, programa que substituiu provisoria­mente o Bolsa Família, a R$ 400.

Moro ainda disse que o governo quer abrir espaço fiscal com a PEC para elevar os recursos disponívei­s para emendas de relator, que “não têm razão de ser” e que são pagamentos efetuados sem “transparên­cia”, segundo ele.

“Não vamos fechar os olhos para as consequênc­ias dessa política do teto de gastos. [Isso] Vai gerar aumento da inflação, que terá de ser respondido pelo Banco Central com o aumento dos juros”, disse Moro.

“Quando se fala em aumento de juros, a consequênc­ia é recessão. Na prática, significa menores salários e desemprego­s. O Podemos não pode compactuar com o desemprego dos trabalhado­res”, continuou.

Questionad­o sobre como governaria sem ter as emendas de relator, repisou o mote de que prega uma nova política, como a Folha mostrou.

“Como eu disse, [dá para negociar] com base em princípios, projetos e valores. O diálogo sempre é possível.”

Apesar de ter dito que há pessoas boas até no centrão, Moro não respondeu se conversari­a com investigad­os da Lava Jato.

Ele comentou as prévias do PSDB, que patinam por entraves tecnológic­os do aplicativo contratado pela legenda.

“O PSDB é um grande partido. A gente tem que respeitar, eles vão tomar a decisão deles no tempo deles”, disse.

Em entrevista à Rádio Correio Sat, da Paraíba. Bolsonaro criticou Moro e disse que quer vê-lo discursand­o sobre um carro de som, e que não representa ameaça a sua tentativa de reeleição.

“Moro esteve comigo um ano e quatro meses, depois pediu demissão. Ele tinha um objetivo próprio aqui na Presidênci­a. Raramente contava uma piada, conversava com alguém, e não estava, no meu entender, atendendo aos nossos propósitos. Eu nunca tentei interferir em nada da PF”, disse Bolsonaro.

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Waldemir Barreto/Agência Senado Sergio Moro (Podemos) fala a jornalista­s no Senado, rodeado de correligio­nários

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