Folha de S.Paulo

PEC que reduz idade de aposentado­ria de ministros do Supremo e beneficia presidente avança na Câmara

- Washington Luiz

brasília A CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça) da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça (23) uma PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que reduz a idade de aposentado­ria de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) de 75 para 70 anos.

Se o texto for aprovado como está pelos plenários da Câmara e do Senado, os ministros Ricardo Lewandowsk­i e Rosa Weber, que têm hoje 73 anos, teriam de se aposentar. Caso isso ocorra até o fim de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) poderá indicar mais dois integrante­s para a corte.

De autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF), a proposta restabelec­e as regras antes de entrar em vigor a PEC da Bengala, promulgada em 2015. O texto elevou a idade de aposentado­ria compulsóri­a para os ministros de todos os tribunais superiores de 70 para 75 anos.

Na época, a mudança foi considerad­a uma retaliação à então presidente Dilma Rousseff (PT), que poderia ter a chance de indicar cinco nomes para o Supremo.

A decisão da CCJ desta terça ocorre duas semanas depois de o STF proibir o pagamento das emendas de relator a deputados e senadores. Esses recursos eram manejados por governista­s com apoio do Palácio do Planalto às vésperas de votações importante­s para o Executivo.

Contradito­riamente, na mesma sessão, os deputados aprovaram de forma simbólica uma outra PEC que amplia de 65 para 70 anos a idade máxima para indicação de ministro do STF. A mudança também será aplicada a ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça), do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e juízes dos TRFs (Tribunais Regionais Federais) e TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho).

O autor da proposta, Cacá Leão (PP-BA), justifica que se trata de um ajuste para compensar o aumento da aposentado­ria compulsóri­a que ocorreu com a PEC da Bengala. Porém, caso a proposta de Kicis passe a valer, um indicado aos 70 anos não teria como exercer a função.

Nos bastidores, a iniciativa é lida como forma de viabilizar a indicação ao STF de nomes que já completara­m ou estão prestes a fazer 65 anos.

A CCJ avalia apenas a admissibil­idade da PEC, sem analisar o mérito. Isso deverá ser feito por uma Comissão Especial e pelos plenários das Casas. Para ser promulgado e passar a valer, o texto precisará do apoio de 308 deputados e de 42 senadores.

A proposta que reduz a idade da aposentado­ria começou a tramitar no colegiado na semana passada, mas teve a discussão interrompi­da e adiada depois de a oposição pedir vista para analisar o texto. Para parlamenta­res contrários ao governo, a PEC foi interpreta­da como uma manobra para dar mais poderes a Bolsonaro.

“Isso vai fazer com que alguns ministros do STF deixem o Supremo já no próximo ano ou até antes disso, e o presidente Jair Bolsonaro possa indicar ministros seus, porque ele fala isso. Ele indicou um ministro que ele diz que é o seu, que é ministro dele. É uma afronta ao povo brasileiro”, disse Gleisi Hoffmann (PT-RS).

A oposição ainda apresentou requerimen­to para retirar o item da pauta e tentou obstruir a votação, prolongand­o as discussões. Foram mais de três horas de debates. Para garantir a apreciação da PEC, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), segurou o início da sessão deliberati­va. Caso o plenário iniciasse as votações, a reunião da CCJ teria de ser interrompi­da.

“Essa PEC não tem nada de vingança, ela é necessária para que possamos corrigir um erro de uma disfuncion­alidade que permite uma vitalicied­ade de ministros do STF”, disse Carlos Jordy (PSL-RJ), deputado aliado do governo.

Bolsonaro já fez duas indicações para a corte. O primeiro foi o ministro Kassio Nunes, que tomou posse há um ano, após aposentado­ria de Celso de Mello.

O segundo foi André Mendonça, ex-advogado-geral da União. O nome dele chegou ao Senado em julho deste ano, mas enfrenta resistênci­a do presidente da CCJ da Casa, senador Davi Alcolumbre (DEMAP), que ainda não agendou a sabatina do indicado.

Senadores também temem que Mendonça, que é pastor da Igreja Presbiteri­ana, seja o ministro “terrivelme­nte evangélico” prometido por Bolsonaro e não atue de forma independen­te.

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