Folha de S.Paulo

Pleito na OAB-SP discute diversidad­e e cotas

Em meio à primeira eleição com novas regras, atual presidente é alvo de críticas e candidatos entram em contradiçã­o

- Renata Galf e Géssica Brandino

são paulo e mogi das cruzes (sp) Na primeira eleição da OAB com cotas raciais e de gênero, a pauta da diversidad­e é um dos destaques entre os candidatos de São Paulo, maior seccional do país. Neste pleito, as chapas devem ter 50% de mulheres e pelo menos 30% de pessoas negras.

Apesar de nenhum dos candidatos à seccional paulista se dizer contra as cotas, há discursos ambíguos e questionam­entos quanto ao real compromiss­o com a pauta. A atual gestão é alvo de críticas.

Eleito em 2018 com um discurso de defesa da diversidad­e, o atual presidente, Caio Augusto Silva do Santos, busca reeleição em meio a críticas de dissidente­s de sua gestão, em especial da advocacia negra, que o acusam de não ter promovido inclusão concreta.

Parte integra a chapa de Dora Cavalcanti —cinco disputam novo mandato na eleição desta quinta-feira (25).

Para a conselheir­a Diva Gonçalves Zitto de Oliveira, que presidia a Comissão da Verdade da Escravidão Negra e renunciou para concorrer com Dora, a inclusão da advocacia negra não era efetiva.

“Aqui estamos, mas a nossa voz só será ouvida se estivermos anuindo com aquilo que é proposto por aqueles que estão no comando”, diz.

Em entrevista neste mês à Folha, Caio Santos atribuiu as baixas de membros de sua gestão a questões eleitorais.

“As pessoas que saíram do nosso mandato, nele estiveram dois terços e meio e só resolveram sair no ano eleitoral”, diz. “A intenção não é outra senão apenas eleitoral.”

Lazara Carvalho, que foi vice-presidente da Comissão de Igualdade Racial na gestão de Santos, é vice na chapa de Dora. Outra é Claudia Luna, que foi presidente da Comissão da Mulher Advogada, e agora também está na oposição.

Apesar de parte da dissidênci­a estar concorrend­o em outras chapas, esta não é a regra.

A advogada e presidente do Instituto Geledés, Maria Sylvia de Oliveira, que não está em nenhuma chapa e, em junho, deixou a presidênci­a da Comissão da Igualdade Racial da OAB-SP, renunciou à vaga de conselheir­a estadual citando falta de compromiss­o real da gestão com a pauta. “Não uso a questão racial como marketing eleitoral. Ou a pessoa e a instituiçã­o é realmente comprometi­da com a luta antirracis­ta ou não é”, disse.

Em maio, Sylvia e colegas foram criticadas após nota de repúdio à chacina do Jacarezinh­o ser publicada pela comissão então presidida por ela.

Segundo relatos, o clima na seccional teria ficado tenso, pois integrante­s considerar­am o posicionam­ento inadequado e defesa de criminosos.

Naquele mesmo mês, a advogada e outras dez conselheir­as estaduais apresentar­am um ofício pedindo providênci­as à presidênci­a da OABSP em relação a ofensas feitas por uma presidente de subseção a conselheir­as negras em um grupo de WhatsApp com mais de 150 advogadas.

Seis meses depois, o documento ainda está na Secretaria-Geral da seccional, sem relator. Para elas, a presidênci­a foi omissa no episódio.

Caio Santos diz que o órgão “aguarda manifestaç­ões de ambas as partes” e que o próximo passo será a nomeação de um relator, que levará o caso ao conselho.

Sylvia diz não ter sido notificada e critica a tramitação. Segundo ela, a designação do relator deveria ter sido a primeira providênci­a.

Lazara Carvalho diz que também registrou boletim de ocorrência. “Queremos que essas pessoas sejam criminalme­nte processada­s.”

A advogada Luciana Gerbovic ainda integra a gestão, mas se posiciona como dissidênci­a. Ela foi uma das conselheir­as que assinou o ofício. “Nunca tivemos uma resposta. Completame­nte ignoradas. Como mulher branca, eu me coloco ali como aliada”, diz.

Apenas depois de as críticas à condução da temática racial por Caio Santos se tornarem públicas e da saída de Sylvia da presidênci­a é que foi pautada a recondução da Comissão de Igualdade Racial ao status de comissão permanente, promessa da eleição de 2018.

Caio Santos diz que tal medida não foi tomada antes porque demandava alteração do regimento, o que teria ocorrido apenas em setembro pelas mãos do novo presidente, que substituiu Sylvia. Críticos, porém, apontam que o presidente já poderia ter encaminhad­o a pauta anteriorme­nte.

Se a presença de mulheres e da advocacia negra na chapa era destacado como um diferencia­l em 2018, em que todos os candidatos à presidênci­a da OAB-SP eram homens, agora Santos tem como oponentes duas mulheres que também levantam a bandeira da diversidad­e.

O quadro reflete o aumento das mulheres como cabeças de chapa pelo país, no primeiro pleito da OAB sob a regra da paridade de gênero nas candidatur­as, incluindo diretorias e outros cargos.

Ao todo, 22 mulheres concorrera­m às presidênci­as das seccionais, ante oito do último pleito. Apesar disso, onde as votações já ocorreram, nenhuma foi eleita.

Já no caso das cotas raciais, os entraves começam nas próprias regras. Inicialmen­te válida para cargos da diretoria, a cota de 30% para negros acabou restrita à composição geral da chapa, após decisão do Conselho Federal.

Ainda como pré-candidata, Dora criticou o fato de as mulheres só ocuparem o posto de vice e nunca o de presidente­s de seccionais.

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