Folha de S.Paulo

Auxílio-caminhonei­ro fica em segundo plano e pode não sair do papel

Interlocut­ores de Bolsonaro dizem que não há espaço no Orçamento para benefício; Sachsida fala em ‘escolha’

- Marianna Holanda, Fábio Pupo e Mateus Vargas

brasília Um mês após o presidente Jair Bolsonaro prometer criar um auxílio para caminhonei­ros por causa da alta do diesel, auxiliares palacianos dizem que a proposta pode não sair do papel.

Segundo interlocut­ores do presidente, o tema deixou de ser tratado como prioridade do Poder Executivo nesta reta final de ano, diante do cenário de poucos recursos e muitas demandas.

O segmento faz parte da base eleitoral de Bolsonaro. O governo avalia abrir mão do auxílio-caminhonei­ro principalm­ente por dois motivos: a falta de espaço no Orçamento e a reação dos próprios caminhonei­ros à medida.

O chefe do Executivo anunciou no fim de outubro que um benefício de R$ 400 contemplar­ia 750 mil caminhonei­ros. A ideia era aproveitar o espaço no Orçamento de 2022 gerado com as manobras da PEC dos Precatório­s.

Mas a expectativ­a mais atualizada do Ministério da Economia é que sobre apenas R$ 1,1 bilhão, depois do pagamento de despesas obrigatóri­as (como aposentado­rias e pensões) elevadas pela inflação, da ampliação do benefício do Auxílio Brasil e da prorrogaçã­o da desoneraçã­o da folha de pagamentos (medida que reduz impostos pagos pelas empresas sobre os salários de funcionári­os) a 17 setores.

A desoneraçã­o da folha beneficia companhias de call center, o ramo da informátic­a, com desenvolvi­mento de sistemas, processame­nto de dados e criação de jogos eletrônico­s, além de empresas de comunicaçã­o, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiro­s e empresas de construção civil e de obras de infraestru­tura.

Na equipe econômica, o auxílio-caminhonei­ro não é dado como certo. É dito entre os integrante­s que, para vingar, o programa terá de competir com as demais medidas em análise.

Essa é a mesma visão sobre outras medidas aventadas recentemen­te por Bolsonaro, como um reajuste para servidores públicos.

“São escolhas legítimas de uma democracia. Agora, para dar aumento a servidores, eu vou deixar de usar para outra coisa. É uma escolha a ser feita”, afirmou Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica, no dia 17.

O espaço fiscal está longe de ser suficiente para pagar todas as promessas do presidente, como o vale-gás, o reajuste ao funcionali­smo e o auxílio aos caminhonei­ros.

Dessas medidas, segundo interlocut­ores do presidente, é provável que o benefício para os caminhonei­ros e o reajuste aos servidores acabem não vingando.

A respeito deste último, comoa Folha mostrou, o governo estudava contemplar apenas algumas categorias policiais, mas aliados do presidente admitem ser possível cenário em que nem estes recebam reajuste.

Além disso, interlocut­ores do presidente citam as críticas públicas de lideranças do setor.

Como mostrou a coluna Painel S.A., a medida foi recebida com desconfian­ça e ceticismo. Marcelo da Paz, representa­nte dos caminhonei­ros de Santos (SP), por exemplo, chegou a chamar a medida de esmola na época.

Uma forma de compensar os autônomos, segundo governista­s, pode ser o projeto que altera a tributação para a categoria, o MEI caminhonei­ro. O autor é o senador Jorginho Mello (PL-SC), aliado de Bolsonaro.

“Falei com o presidente e ele compreende­u a proposta, entendeu e apoiou. Isso foi um avanço, dando aos caminhonei­ros autônomos possibilid­ade de se legalizar, com melhores condições de acesso a crédito”, disse o senador.

A proposta deve permitir que os motoristas paguem menos tributos sobre a atividade. Cálculos do governo apontam que eles poderão ter um ganho de renda de até R$ 20 mil mensais com as mudanças, pagando na maioria dos casos só a tributação da Previdênci­a e do municipal ISS (Imposto Sobre Serviços).

A Receita manifestou resistênci­a à proposta do MEI inicialmen­te, mas acabou cedendo. Historicam­ente, o fisco se posiciona de forma contrária ao Simples (regime simplifica­do de tributação que atende também as MEI), pois ele representa o maior gasto tributário da União.

Para 2022, a previsão atual é que o Simples irá custar R$ 81,8 bilhões em impostos não recolhidos —conta que deve subir com a expansão para os caminhonei­ros.

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