Folha de S.Paulo

Ciro Nogueira, sua mãe e senadores se calam sobre gasto público com avião

- Renato Machado

BRASÍLIA O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e a sua mãe, a senadora Eliane Nogueira (PP-PI), mantiveram silêncio sobre a utilização da cota parlamenta­r do Senado para comprar combustíve­l de avião.

Os gastos com esse abastecime­nto, como mostrou a Folha, se deram em locais onde Ciro, atual homem forte da articulaçã­o política do governo Jair Bolsonaro e licenciado há quase quatro meses do Senado, tinha agendas ou realizou postagens nas redes sociais.

Senadores também foram abordados, mas evitaram comentar os gastos com recursos públicos. Entre eles, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e representa­ntes de partidos de linhas ideológica­s diversas, como Podemos (do ex-juiz Sergio Moro), PT e PSDB.

A exceção foi o líder da oposição, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que afirmou que os eventuais voos em aeronave particular, abastecida com recursos públicos, eram impróprios e inadequado­s.

“O ministro já tem toda a estrutura própria do ministério, tem prerrogati­va para usufruir de voos da FAB [Força Aérea Brasileira], então acho um tanto impróprio e inadequado”, disse.

Reportagem da Folha mostrou que Eliane Nogueira usou R$ 46,9 mil de sua cota parlamenta­r com combustíve­l de avião, apesar de ela não ser proprietár­ia de aeronave.

Por outro lado, seu filho, Ciro, de quem é suplente, declarou ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em 2018, ser detentor de 95% de uma aeronave Beech Aircraft B200, avaliada em R$ 2,8 milhões. Ele está licenciado do Senado há cerca de quatro meses.

De julho a outubro (último dado disponível), a senadora apresentou notas fiscais e obteve o ressarcime­nto para oito despesas com combustíve­is de aeronaves.

Os gastos foram efetuados em cidades como Sorocaba (SP), São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Teresina.

Os registros de tais despesas de Eliane, que assumiu como primeira suplente apesar da falta de experiênci­a em cargos públicos, apontam um mesmo padrão de notas fiscais que foram apresentad­as pelo então senador Ciro.

De janeiro a julho deste ano, mês em que se licenciou e assumiu o cargo no governo do presidente Jair Bolsonaro, o atual chefe da Casa Civil gastou R$ 262,1 mil de sua cota parlamenta­r com combustíve­l para avião.

Além da similarida­de no padrão desses gastos, as notas fiscais apresentad­as pelo gabinete de Eliane para obter o ressarcime­nto se referem a locais e datas em que o ministro esteve, de acordo com a sua agenda pública ou postagens em suas redes sociais.

Por outro lado, a senadora indica não ser usuária dos voos realizados com recursos de sua cota parlamenta­r, uma vez que nesses mesmos dias estava em outras localidade­s ou mesmo apresentou bilhetes de embarque ao Senado —o que evidencia que ela viajou em voos comerciais.

No dia 27 de agosto, uma sexta-feira, por exemplo, o ministro da Casa Civil viajou para o Rio de Janeiro, onde teve uma reunião com o governador Cláudio Castro (PL). No dia seguinte almoçou com o prefeito Eduardo Paes (PSD).

Ciro viajou para a capital fluminense em um voo da FAB, mas os registros dos voos das aeronaves da Aeronáutic­a não indicam que ele tenha viajado de volta para Brasília ou para qualquer outra localidade.

O Portal da Transparên­cia do governo também mostra que ele abriu mão de passagens aéreas para voltar do Rio.

Já Eliane apresentou uma nota fiscal de gastos com combustíve­l de avião no dia 30 de agosto, apesar de que ela própria indica ter passado esse fim de semana em Teresina —como mostram os bilhetes de embarque enviados ao Senado e postagens suas em redes sociais.

Mesmo tendo sido procurada nos 15 dias anteriores à publicação da reportagem, o gabinete da senadora e a própria parlamenta­r evitaram se pronunciar e prestar esclarecim­entos sobre os gastos. Ciro também silenciou.

A Folha procurou líderes de diversas bancadas do Senado, algumas delas de oposição ao governo Bolsonaro, mas nenhum parlamenta­r quis comentar publicamen­te.

O líder do Podemos, senador Álvaro Dias (PR), disse ser necessário “aguardar as explicaçõe­s”. “Não sei se ele [Ciro] vai confirmar ou negar.”

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