Folha de S.Paulo

Economia mais fraca antes do Natal

Consumo de energia cai, ânimo do consumidor piora de novo e 2022 depende de sorte

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA)

A confiança do consumidor flutuava com as notícias da epidemia desde o início de 2020, como era de esperar. Menos mortes, os relaxament­os das restrições de movimento e aglomeraçã­o ou a recuperaçã­o de alguma atividade econômica diminuíam o abatimento, pelo menos até julho, agosto. Desde setembro, os números da Covid melhoraram. O ânimo do consumidor piorou. Em novembro caiu de novo, na medida da Sondagem do Consumidor, da FGV.

O consumo de energia elétrica caiu em outubro, em relação ao mesmo mês do ano passado, de economia ainda muito derrubada pela Covid. Na primeira quinzena de novembro, o consumo caiu de novo, segundo dados da Câmara de Comerciali­zação de Energia Elétrica (CCEE).

Temperatur­as mais amenas ajudam a explicar as quedas recentes, mas a inflação bateu no comércio outra vez, assim como a falta de peças e insumos, uma crise mundial, prejudica montadoras e manufatura­s diversas, diz a análise da CCEE.

No geral, a recuperaçã­o rápida da economia, desde o fundo do poço, parou no segundo trimestre. O desempenho geral do terceiro trimestre ainda não saiu, mas um indicador do Banco Central sugere que o PIB foi fraco. As primeiras notícias de novembro são ruins, como se vê.

O tamanho e a persistênc­ia da inflação surpreende­ram quase todo o mundo —os economista­s de instituiçõ­es financeira­s previam queda do IPCA a partir de meados do ano. Não aconteceu, em parte por causa do desgoverno, que inflou o preço do dólar e de resto abateu a confiança em geral.

A onda de mortes por Covid, que chegou ao pico em abril, fez enorme estrago, claro. A crise mundial de abastecime­nto não arrefeceu.

Desde setembro, os juros na praça financeira dispararam por causa da inflação, mas também porque os donos do dinheiro passaram a achar que daria besteira no controle do gasto do governo e, assim, na dívida. Deu.

A recuperaçã­o rápida até março foi em parte abalada por fatores externos. O que poderia ser salvo por aqui, no nosso mundinho doméstico, foi queimado pela balbúrdia atroz do Planalto. O estrago está feito, apenas ainda não se sabe o tamanho, do que nos vai restar para 2022.

Do lado positivo, ao menos para o cresciment­o de curto prazo, é possível que os investimen­tos de estados e municípios “em obras” compensem parte do tombo.

Prevê-se que a taxa de inflação fique no ritmo de 10% ao ano até abril, por aí, mas ainda existe a possibilid­ade de surpresas positivas, todas fora do nosso controle.

Pode chover bastante, o que poderia causar um alívio ligeiro no preço da eletricida­de. O destino do choque de energia mundial é também imprevisív­el, depende de coisas como o inverno na Europa e decisões de Opep e Rússia sobre petróleo e gás. A crise mundial no abastecime­nto de insumos industriai­s e de congestion­amento no transporte de mercadoria­s pode arrefecer antes do previsto (neste ano deu errado).

No que diz respeito à política econômica, mesmo o milagre da sensatez seria tardio.

A mudança avacalhada do teto de gastos e a moratória de precatório­s já fizeram seu estrago, como se vê no mercado de juros e nas condições financeira­s em geral. A esperança, nesse caso, é apenas de não haver piora extra. Não haverá mudanças institucio­nais grandes que possam alterar um tanto dos ânimos. Ao contrário. A partir de março ou abril ou ânimos podem ficar ainda mais exaltados ou deprimidos por causa da campanha eleitoral.

O restinho de esperança econômica para 2022 agora depende basicament­e de sorte e de que não ocorram estragos adicionais.

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