Folha de S.Paulo

Mais de 450 mil alunos do ensino fundamenta­l ficaram sem atividade remota na pandemia

- Isabela Palhares

Apenas nos anos finais do ensino fundamenta­l, nas turmas de 5º e 9º anos, mais de 450 mil alunos das redes municipais do Brasil estão em alto risco de abandonar os estudos depois da pandemia.

Isso representa quase 15% do total de matriculad­os nestes dois anos somados. São alunos que passaram mais de um ano sem acompanhar nenhuma atividade remota durante fechamento das escola.

O levantamen­to sobre risco de abandono escolar foi feito por técnicos de 29 Tribunais de Contas do país, em parceria com o Iede (Interdisci­plinaridad­e e Evidências no Debate Educaciona­l) e o CTE-IRB (Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa).

A pesquisa, divulgada nesta quinta (25), foi feita diretament­e com as redes municipais e estaduais de ensino de todo o país, já que o Ministério da Educação não realizou nenhum diagnóstic­o sobre a evasão escolar na pandemia.

O processo de coleta dos dados indica que o número de alunos em risco pode ser ainda maior, já que a maioria das localidade­s teve dificuldad­e de apresentar um diagnóstic­o do acompanham­ento das atividades escolares durante o fechamento de escolas.

Segundo o levantamen­to, a média de participaç­ão dos alunos do 5º ano do ensino fundamenta­l nas escolas municipais foi de 92,5%, o que significa 144 mil crianças sem nenhum acompanham­ento das atividades escolares. Já no 9º ano, 90,1% tiveram alguma participaç­ão, deixando 94 mil alunos de fora.

A pesquisa não permite dizer que esses alunos já abandonara­m os estudos, mas que eles estão em alto risco de não retornar à escola depois de mais de um ano sem acompanham­ento. A saída pode levar o país a um retrocesso de anos, já que o acesso educaciona­l de crianças e adolescent­es nessa etapa, dos 6 aos 14 anos, estava praticamen­te universali­zado antes da pandemia —era de 99%.

“Precisamos de uma ação coordenada em todo o país para melhorar as ferramenta­s de acompanham­ento, identifica­r quem ainda está fora e fazer ações de busca ativa”, diz Cezar Miola, conselheir­o do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul e presidente do CTE-IRB.

O levantamen­to mostra ainda as desigualda­des regionais do risco de abandono escolar. Enquanto na região Sul a média de participaç­ão dos alunos de 5º ano foi de 96,2%, no Nordeste foi de 88%. O mesmo ocorre com a média do 9º ano.

“A pandemia reforçou ainda mais as desigualda­des que já existiam, ela atuou mais forte contra quem estava mais vulnerável e isso vale também para as redes de ensino. As redes com menos recursos tiveram mais dificuldad­e de adaptação tecnológic­a, de ter professore­s para a busca ativa”, diz Ernesto Faria, diretor-fundador do Iede.

Ainda que a maioria das redes públicas de ensino no país já tenha reaberto suas escolas, uma pesquisa do Datafolha, divulgada em outubro, indicou que a retomada tem ocorrido de forma desigual no país. São exatamente as regiões com maior risco de evasão que têm demorado mais para retornar às aulas presenciai­s.

Enquanto na região Sul, 90% dos estudantes já puderam voltar a frequentar a escola, no Nordeste só 40% tiveram essa opção. A demora também tem prejudicad­o mais os estudantes negros e pobres.

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