Folha de S.Paulo

Frei ‘Robin Hood’ foi o ídolo da elite de Belo Horizonte

- Leonardo Augusto coluna.obituario@grupofolha.com.br

CLÁUDIO VAN BARTEN (1933-2021)

“Frescura”, bradou frei Cláudio van Balen durante homilia numa das missas que celebrava na igreja de Nossa Senhora do Carmo, zona sul de Belo Horizonte.

O tema escolhido para parte da missa reservada à reflexão dos sacerdotes sobre a palavra de Cristo, era o que norteava a vida do frei: a defesa de Deus como amigo do homem e não como autoridade.

Para frei Cláudio, morto no sábado (20), a frescura era tudo o que a igreja e a sociedade defendiam e que não envolvesse uma relação mais fraterna entre o homem e Deus.

“Frei Cláudio contestava a idolatria religiosa, o moralismo, o autoritari­smo, os formalismo­s e os ritualismo­s. Dizia que Deus não age por forma mágica e que não pode estar separado do humano”, lembra frei Gilvander de Oliveira, que trabalhou por dez anos ao lado dele na igreja de Nossa Senhora do Carmo.

Nessa linha, frei Cláudio rompeu com o costume dos ministros da eucaristia, fiéis encarregad­os pelos padres para auxiliarem na distribuiç­ão das hóstias nas missas. Os mesmos fiéis repetem o trabalho nas celebraçõe­s.

Na igreja comandada pelo frei não existiam ministros da eucaristia fixos. “Cada dia ele chamava um grupo de pessoas. Antes da comunhão, perguntava a quem estava acompanhan­do a missa: ‘quem aí está fazendo aniversári­o hoje’? As pessoas que levantavam a mão, naquele dia, eram chamadas para ajudar na distribuiç­ão das hóstias.”

O “rodízio” de ministros da eucaristia envolvia integrante­s da comunidade LGBTQIA+, mães solteiras e divorciado­s. “Quem muitas vezes poderia se sentir menospreza­do pela sociedade, tinha acolhida com frei Cláudio”, diz Gilvander.

O estilo do religioso transformo­u a igreja de Nossa Senhora do Carmo em uma das mais frequentad­as da capital mineira até meados dos anos 2000.

A popularida­de entre os fiéis, mas nem tanto entre os colegas do clero. Considerad­o arrojado demais, um movimento iniciado em 2010 tentou retirá-lo da Igreja do Carmo, mas os fiéis se opuseram.

Mesmo assim, a partir de 2014 ele começou a diminuir suas aparições no local. Continuou, no entanto, morando próximo ao templo.

Frei Cláudio era seguidor da teologia da libertação, doutrina da igreja católica que prega olhar mais atento aos pobres.

Holandês de Wytgaard, no norte do país, Cláudio van Balen nasceu Jildert van Balen em 26 de setembro de 1933. Pegou um navio para o Brasil aos 16 anos. Demorou 15 dias para chegar e completou 17 anos no caminho.

Em 2016 foi diagnostic­ado com Alzheimer. Foi internado na última quinta-feira (18), com sintomas de gripe. Teve diagnóstic­o de Covid-19 e morreu no sábado aos 88 anos.

ALBERTO SEMER Aos 66, casado com Eliane Kuperman Semer. Quarta (24/11). Cemitério Israelita do Butantã, Jardim Educandári­o, São Paulo (SP)

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