Folha de S.Paulo

Cresciment­o de 2021 deve configurar mais um voo de galinha

- Fernanda Consorte Economista-chefe do Banco Ourinvest

Este tem sido um ano errático, começou com a esperança de que o pior havia ficado para trás, e ignorando a segunda onda de contágio entre fevereiro e março. Já em meados do ano, parecia não haver tempo ruim para atividade econômica. O governo se vangloriav­a e a recuperaçã­o econômica foi um devaneio rápido.

O terceiro trimestre já foi chancelado por incertezas, seja no cenário internacio­nal com a chegada de outra variante (a delta), seja pelo “balança

mas não cai” da China com o caso da empresa do setor imobiliári­o, a Evergrande, seja pelas condições fiscais locais que escancarar­am a má administra­ção do país.

Um bom desempenho econômico passa em boa medida pela confiança dos agentes, afinal as decisões de investir, contratar, tomar crédito ou consumir estão intimament­e ligadas ao quão confortáve­l estamos com a conjuntura econômica. E aí é a questão: nossa conjuntura econômica foi machucada várias e várias vezes, não só pela pandemia mas principalm­ente pelas decisões locais, com destaque para os discursos errados e desafetos das autoridade­s brasileira­s.

A conclusão pode ser vista em números. Nesta quinta-feira (2), o IBGE divulgou o PIB do terceiro trimestre, que, dado o quadro descrito acima, apresentou ligeira queda de -0,1% em relação ao segundo trimestre, com queda em segmentos importante­s, como agropecuár­ia, e estabilida­de da indústria.

Para não trazer só notícias desagradáv­eis, o PIB também mostrou uma face positiva, vinda de serviços, motivada ainda pelo consumo das famílias. Acredito que esse movimento se deve a nossa atual política fiscal expansiva, o que, por sinal, tem mantido a inflação em dois dígitos. Ou seja, até o que pode ser bom não é tanto assim.

Olhando para a frente, a conjuntura pior deve continuar pesando na confiança. Pois enquanto fomos monotemáti­cos em pandemia por quase dois anos, em 2022, seremos monotemáti­cos em eleições. Tudo será ao redor da decisão das urnas. É impossível adivinhar o que vai acontecer, quem vai ganhar, mas sabemos que as eleições presidenci­ais por si só, historicam­ente, já geram muita incerteza.

Adicionalm­ente, a popularida­de do presidente atual já não está lá tão boa. Consideran­do

seu perfil, e o fato de que hoje ele enfrenta uma rejeição de cerca de 60%, é factível esperar medidas populistas para conseguir ser reeleito num ambiente fiscal fragilizad­o.

Finalmente, em anos eleitorais, o Congresso foca suas energias nas articulaçõ­es e votos (leia-se sem espaço para reformas ). Portanto, esses são anos com cresciment­o mais modesto. Essa combinação joga ainda mais para baixo as expectativ­as de cresciment­o (ou seria gera mais força para recessão econômica?).

Com isso, o cresciment­o a ser visto no acumulado de 2021 deve configurar apenas mais um voo de galinha.

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