Folha de S.Paulo

Doria leva Meirelles e teto de gastos para vender candidatur­a nos EUA

Durante viagem a NY, tucano descreve vitórias de 2016 e 2018 como exemplo para 2022

- Igor Gielow O jornalista viaja a convite da InvestSP

Em sua primeira viagem internacio­nal depois de ser confirmado pré-candidato a presidente em 2022 nas prévias do PSDB, o governador João Doria (SP) recuperou uma arma que Michel Temer (MDB) usou ao assumir o Planalto, em 2016.

Em conversas com investidor­es em Nova York, onde lidera missão empresaria­l e inaugurou um escritório de promoção comercial do governo paulista nesta quinta (2), Doria sacou Henrique Meirelles e o teto de gastos para se apresentar como um candidato liberal e responsáve­l na economia.

O ex-ministro da Fazenda, hoje seu secretário na área, foi nomeado o coordenado­r de seu programa econômico.

O tucano já esteve com o ex-prefeito Michael Bloomberg, com a direção do Bank of America, o banco Goldman Sachs e no Morgan Stanley na quarta (1º). Nesta quinta, ainda falaria no JPMorgan e, nesta sexta (3), com investidor­es, com o Council of the Americas, com o Itaú e com o maior gestor de fundos do mundo, o BlackRock.

“Há uma instabilid­ade fiscal e uma instabilid­ade política. Os investidor­es querem estabilida­de, porque não são investimen­tos especulati­vos, e sim de longo prazo”, disse Doria.

“A situação é muito parecida com a de 2016, quando eu assumi a Fazenda”, disse Meirelles. No cargo, ele entregou uma reforma administra­tiva à qual credita a folga de R$ 50 bilhões em investimen­tos até o fim de 2022, recorde na história recente do estado.

Naquele ano, após o impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT), Meirelles foi chamado pelo novo presidente, Temer, para tentar contornar a recessão que já durava mais de um ano. “A questão era a responsabi­lidade, mas também a credibilid­ade fiscal. Ao recuperar a confiança, baixamos o risco Brasil e outros indicadore­s, controland­o a inflação.”

Meirelles credita à implantaçã­o do teto de gastos, proposta de limitação de despesas federais por 20 anos, o tal choque de credibilid­ade. E a solução para 2023? “O teto de gastos ser respeitado”, disse, alfinetand­o as gambiarras fiscais de Jair Bolsonaro (PL).

Doria foi na mesma linha. “É um absurdo furar o teto, não há justificat­iva humanitári­a para isso, porque furar o teto gera fome”, disse em entrevista coletiva o governador, repetindo argumentos de Meirelles.

O ex-ministro, em conversa com jornalista­s, delineou os três pontos que considera mais imediatos para a economia: reforma administra­tiva para liberar recursos para investimen­to no social e em infraestru­tura, apresentar uma reforma tributária federal nova e apoiara pro postados estados que chegou ao Congresso e estímulo a privatizaç­ões e concessões em infra.

“Não vamos nos ater a siglas. Vamos fazer um modelo adequado ao país no momento”, disse, sobre a polêmica substituiç­ão do Bolsa Família pelo Auxílio Brasil.

Ele cita a proliferaç­ão de obras públicas de pequeno e médio porte em São Paulo como exemplo a ser seguido, pela capilarida­de delas na economia en ageração de empregos.

Como já fez o chefe, defendeu a venda da Petrobras. “Mas temos de dividi-la em três ou quatro empresas, para não criar um monopólio privado”, disse. Doria já defendeu também um fundo para a estabiliza­ção dos preços dos combustíve­is, bancado pelas vencedoras da privatizaç­ão.

O tucano já afirmou que quer um conselho com seis pessoas trabalhand­o sob a coordenaçã­o de Meirelles na área econômica. O secretário não quis declinar nomes, óbvio, mas no governo paulista o nome da ex-secretária de Fazenda de Goiás Ana Carla Abrão é dado como certo.

Meirelles deverá ir atrás de antigos colaborado­res, pessoas como o seu ex-secretário do Tesouro Mansueto Almeida, que ocupou o cargo também no governo Bolsonaro, até sair no meio do ano passado.

A receita ortodoxa do ex-ministro, que foi presidente do Banco Central nos oito anos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é criticada em diversos meios —alguma flexibiliz­ação nas regras do teto, draconiana­s, é objeto de intenso debate.

Enquanto isso, a gestão Paulo Guedes (Economia) resolveu driblá-lo apoiando medidas como a PEC do Calote, deterioran­do a situação econômica e a expectativ­a dos mercados.

Doria também atraiu a curiosidad­e política dos investidor­es, que questionar­am sua viabilidad­e. A resposta, segundo a Folha ouviu de participan­tes das conversas nos EUA, foi descritiva.

O tucano repassou sua vitória na primeira disputa eleitoral que travou, para a Prefeitura de São Paulo, em 2016, na qual também enfrentou duras prévias e números baixos em pesquisas. Dois anos depois, já mais conhecido, ele passou pelo mesmo processo e chegou ao Palácio dos Bandeirant­es.

Agora, patinando em 5% das intenções de voto há meses e enfrentand­o a competição de nomes como o do ex-juiz Sergio Moro para tentar tirar Bolsonaro do segundo turno presumido contra Lula, Doria se apresentou como alguém que cresce na chegada.

Meirelles, por sua vez, também enfrenta uma condição política peculiar. Ele será candidato a senador pelo PSD em Goiás. Só que o partido presidido por Gilberto Kassab quer o senador Rodrigo Pacheco (MG) na disputa presidenci­al contra Doria e outros.

“Não há problemas, são questões diferentes no nível nacional e no local. Quando aceitei o convite do Kassab, foi para ter total autonomia em Goiás”, afirmou. “Todos nos respeitamo­s.”

Nesse “roadshow” do governo paulista, não foi feito nenhum anúncio de investimen­to até aqui, ao contrário do que usualmente ocorre. Na inauguraçã­o do escritório da InvestSP, agência de promoção de investimen­tos e negócios do estado, Doria repassou a história deste modelo de inserção internacio­nal.

Lembrou que o contrato inicial da farmacêuti­ca chinesa Sinovac com o Instituto Butantan ocorreu na abertura da unidade da InvestSP em Xangai, em agosto de 2019.

Uma cooperação acerca do vírus zika acabou desembocan­do na produção conjunta da Coronavac, que foi o imunizante contra Covid-19 mais usado no país nos primeiros meses da campanha de vacinação. “Esse é um grande exemplo da utilidade desse modelo”, disse o presidente da agência, Gustavo Junqueira.

Com Doria viajam, além de Meirelles, outros dois secretário­s de estado e os presidente­s da Sabesp e do Butantan. São 18 servidores estaduais ao todo, ao custo de R$ 34 mil por cabeça, em média.

Já a chamada Missão Comercial Nova York é bancada pelos 30 empresário­s da comitiva e patrocinad­ores na iniciativa privada e custou R$ 4 milhões.

 ?? Luiz C. Ribeiro ?? João Doria, governador de SP e pré-candidato ao Planalto (dir.)., e Henrique Meirelles, secretário da Fazenda, em NY
Luiz C. Ribeiro João Doria, governador de SP e pré-candidato ao Planalto (dir.)., e Henrique Meirelles, secretário da Fazenda, em NY

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