Folha de S.Paulo

Sim Mais capacidade de investimen­tos

A cidade tem pressa, e os recursos serão destinados para áreas prioritári­as

- Milton Leite Vereador (DEM), é presidente da Câmara Municipal de São Paulo e prefeito em exercício

Li uma notícia nesta semana que mexeu comigo: a costureira Terezinha de Jesus chorou ao conseguir quitar uma dívida de R$ 7.000 que nasceu com a compra de um jogo de pneus. Ela limpou o nome num feirão da Serasa, com 95% de desconto. Ninguém gosta de ficar devendo. É humilhante e compromete a nossa capacidade de investimen­to.

São Paulo, a maior cidade do país, deve ao governo federal. E não é pouco: R$ 25 bilhões. O valor é tão alto que supera nossa capacidade de comparação. É o equivalent­e ao custeio da alimentaçã­o de todos os alunos da rede municipal por 25 anos. Daria ainda para pagar a operação e a manutenção de todos os 58 CEUs (Centros Educaciona­is Unificados) por cerca de 50 anos.

Ao mesmo tempo em que a capital paulista deve R$ 25 bilhões ao governo federal, a União também deve bilhões ao município. Nesse caso, trata-se de uma dívida pelo uso indevido da área do aeroporto Campo de Marte. O local foi tomado pela União em 1932 e nunca mais devolvido. Inúmeras decisões judiciais se arrastam há anos, tentando colocar fim ao imbróglio. O que importa é que a Justiça já reconheceu que a área pertence ao município, e a União terá de indenizar São Paulo pelas décadas de uso do espaço.

O desequilíb­rio desse impasse está no fato de que, do lado do município, a Prefeitura de São Paulo já paga cerca de R$ 250 milhões por mês para quitar o que deve à União. Do outro lado, só Deus sabe se um dia a cidade conseguirá ver a cor do dinheiro que o governo federal tem de pagar para os paulistano­s. Por esse motivo é que negociamos com a União a troca de uma dívida pela outra, um ajuste de contas para zerar de vez o que São Paulo deve.

O acordo sobre o Campo de Marte, costurado por mim e pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) desde julho e que tramita na Câmara Municipal, é excelente no sentido que livra a capital do peso de pagar cerca de R$ 3 bilhões por ano. Imagine a capacidade de investimen­to que São Paulo ganha ao tirar de suas costas o enorme peso dessa dívida bilionária. Serão

mais recursos disponívei­s para aporte em áreas prioritári­as, para atender quem mais precisa e num momento de tanto aperto.

Eu vejo, porém, que para alguns parece ser mais fácil apontar defeitos do que ajudar a construir soluções. Pelo ângulo dos críticos de plantão e dos que se orgulham em ser do contra, o acordo “abre mão” de um volume de recursos que o município poderia vir a receber no futuro, já que a dívida da União deve superar a do município. Poderia.

Mas a cidade tem pressa. Problemas agravados com a pandemia, como a miséria, urgem. Não se trata de olhar apenas para o curto prazo, mas de saber que a necessidad­e de hoje é mais certa que um futuro cheque da União, com grande possibilid­ade de não chegar.

Tranquiliz­o a todos que, como eu, são responsáve­is. Não se perderá de vista o interesse público diante da posse da área do Campo de Marte, que ainda está sobre a mesa de negociação. Muito se especula sobre o que será daquele local, mas não podemos nos esquecer que grande parte do imóvel já é, atualmente, área de preservaçã­o ambiental.

Há ainda outros espaços lá dentro utilizados, por exemplo, pelo hospital da Aeronáutic­a, por escolas de samba e helipontos para aeronaves de socorro e emergência. Tudo isso precisa ser tratado com cuidado, e é o que estamos fazendo para que, em breve, todos possamos sentir o mesmo alívio que a dona Terezinha sentiu ao limpar o nome na praça.

O acordo sobre o Campo de Marte livra a capital do peso de pagar cerca de R$ 3 bilhões por ano. Imagine a capacidade de investimen­to que São Paulo ganha ao tirar de suas costas o enorme peso dessa dívida bilionária. (...) A necessidad­e de hoje é mais certa que um futuro cheque da União, com grande possibilid­ade de não chegar

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