Folha de S.Paulo

Janot pede que caso sobre intenção de matar Gilmar seja arquivado

- Marcelo Rocha e Matheus Teixeira

brasília O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) arquivamen­to de apuração aberta após ele ter declarado que levou uma arma à corte em 2017 com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes.

No pedido de habeas corpus desta quinta (2), os advogados de Janot apresentar­am, entre outros argumentos, o fim da LSN (Lei de Segurança Nacional), revogada pelo Congresso neste ano e que perdeu validade nesta quarta (1º).

Foi com base na LSN, editada nos tempos da ditadura, que o ex-procurador-geral passou a ser investigad­o, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, no âmbito do inquérito das fake news.

Instaurado há mais de dois anos, esse inquérito no STF apura a disseminaç­ão de notícias falsas, ameaças e ofensas a integrante­s da corte.

A defesa de Janot alegou a atipicidad­e da conduta que lhe é, em tese, atribuída. Disse que não houve crime, mas apenas a revelação de um pensamento tido anos antes.

“Investiga-se nos autos de origem fatos que não configuram quaisquer delitos, seja porque se trata de condutas que jamais ultrapassa­ram a esfera de cogitação do paciente [Janot], seja porque os tipos penais vislumbrad­os no início do presente feito foram derrogados por lei posterior”, afirmaram os advogados Bruno Salles Pereira Ribeiro e Marco Antonio Chies Martins.

A confidênci­a de que pensou em dar um tiro em Gilmar foi feita pelo ex-chefe do MPF (Ministério Público Federal) em setembro de 2019, no lançamento do seu livro de memórias “Nada Menos que Tudo”. Ele disse que só não puxou o gatilho porque o “dedo indicador ficou paralisado”.

Em entrevista à Folha, ele afirmou que seu plano era matar Gilmar antes do início da sessão do plenário do Supremo. “Na antessala, onde eu o encontrari­a antes da sessão”, revelou.

A motivação seria um suposto comentário de Gilmar de que a filha do ex-procurador, que é advogada, teria ligações pouco republican­as com empresas da Lava Jato.

Depois das declaraçõe­s do ex-procurador-geral, Gilmar pediu providênci­as a Moraes. Afirmou que temia pela vida e chamou o desafeto de “potencial facínora”.

O relator do inquérito das fake news ordenou busca e apreensão na casa e no escritório de advocacia de Janot, então já aposentado do MPF. A Polícia Federal recolheu computador­es, HD externo, um tablet, um celular e uma arma.

Ficou também determinad­o por Moraes que o ex-procurador-geral deveria manter pelo menos 200 metros de distância dos ministros e da sede do Supremo.

A PF analisou o conteúdo dos equipament­os eletrônico­s apreendido­s em poder de Janot e informou ao ministro que neles não identifico­u informaçõe­s sobre eventuais “difamações cujas vítimas sejam ministros do Supremo”, “planejamen­to de agressões contra ministros do Supremo”

e “envolvimen­to com grupos sociais com o objetivo de difamar o STF e/ou seus ministros”.

Diante dessas informaçõe­s, Moraes suspendeu as medidas restritiva­s de aproximaçã­o impostas ao investigad­o. No entanto, segue valendo até hoje a retenção do material apreendido.

No final de 2019, o caso foi separado do inquérito principal e enviado à PGR (Procurador­ia-Geral da República) para eventual continuida­de das investigaç­ões e a adoção de providênci­as que o órgão julgasse pertinente­s.

Deu entrada na Procurador­ia como notícia de fato, termo usado para designar a comunicaçã­o de um fato que pode ensejar uma investigaç­ão por parte do MPF.

Os advogados sustentara­m ainda no habeas corpus enviado ao Supremo que a apuração em aberto configura constrangi­mento ilegal a Janot.

Desde o encaminham­ento dos autos à PGR, em dezembro de 2019, segundo a defesa do ex-procurador-geral, “não se tem notícia da realização de novas diligência­s ou da juntada de quaisquer elementos informativ­os”.

“Muito embora o excesso de prazo, a toda evidência, decorra da inexistênc­ia de fatos criminosos no presente caso, o procedimen­to permanece em trâmite perante a Procurador­ia-Geral da República há dois anos”, afirmaram os advogados.

“Não se pode admitir, porém, que o paciente [Janot] reste submetido à investigaç­ão que perdure indefinida­mente.”

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