Folha de S.Paulo

Governo segura execução de emendas de relator e investimen­to

- Idiana Tomazelli

O governo Jair Bolsonaro (PL) editou um decreto limitando a execução de emendas de relator, instrument­o usado por parlamenta­res para irrigar seus redutos eleitorais, e despesas de custeio e investimen­tos nos três primeiros meses do ano.

A medida impõe uma espécie de controle na boca do caixa. Ela é necessária devido ao risco de cresciment­o de gastos obrigatóri­os, cuja recomposiç­ão precisará ser feita mediante cortes em outras áreas.

Para assegurar a viabilidad­e dessas reduções, o governo impede que os ministério­s façam o empenho (primeira fase da despesa, quando é feito o compromiss­o com a compra ou a obra em questão) e o pagamento de todos os valores disponívei­s no Orçamento de 2022.

O decreto assinado por Bolsonaro limita a execução a uma proporção de 1/18 da dotação disponível por mês até março. O ato foi publicado em edição extra do DOU (Diário Oficial da União) nesta sextafeira (11). A medida atinge as chamadas despesas discricion­árias, que incluem custeio, investimen­tos e também as emendas de relator e de comissão, distribuíd­as em grande parte a aliados do governo.

Caso haja necessidad­e, a Secretaria Especial do Tesouro e Orçamento poderá aliviar a contenção e elevar essa proporção a 1/15, mediante aval prévio da Casa Civil.

As emendas impositiva­s individuai­s e de bancada, que são previstas na Constituiç­ão e têm divisão equânime entre parlamenta­res aliados e de oposição, estão blindadas da limitação temporária.

O Orçamento de 2022 reserva R$ 16,5 bilhões para as emendas de relator, e a proporção mensal regular, sem limitação, resultaria em uma execução de R$ 4,125 bilhões até março. Mas o governo estipulou um valor menor, de R$ 2,75 bilhões. A mesma lógica é observada nas demais despesas discricion­árias. Elas somam R$ 114 bilhões no Orçamento, mas apenas R$ 19 bilhões ficarão disponívei­s nos três primeiros meses do ano. Sem limitações, o valor seria de R$ 28,5 bilhões.

O Ministério da Economia vai divulgar em 22 de março sua primeira avaliação do Orçamento. É neste documento que os técnicos do governo indicarão a necessidad­e de recompor despesas obrigatóri­as e cortar de outras áreas.

Como mostrou a Folha ,o governo já mapeou a necessidad­e de ampliar em R$ 3,1 bilhões os gastos com subsídios de programas como o Plano Safra, devido à alta dos juros.

A fatura extra decorre do aumento significat­ivo nas taxas de juros, que ampliou a despesa com a chamada equalizaçã­o —o governo paga a diferença entre a taxa cobrada dos produtores, mais baixa, e o custo efetivo das instituiçõ­es financeira­s que emprestam o dinheiro.

Há ainda outras demandas represadas, como a recomposiç­ão de R$ 777,9 milhões do fundo eleitoral. Uma regra estipulada na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentár­ias) prevê que o fundo deve ser de R$ 5,74 bilhões -o maior da história-, mas o Orçamento reservou apenas R$ 4,96 bilhões.

O corte de 50% dos recursos de custeio do Ministério da Economia também deve tornar necessária alguma recomposiç­ão para a pasta. No início do ano, a necessidad­e era calculada em torno de R$ 5 bilhões.

Segundo fontes da área econômica, o objetivo com o decreto é ser prudente na execução das despesas devido aos riscos de cresciment­o de gastos obrigatóri­os.

Na sanção do Orçamento, Bolsonaro já precisou fazer um veto de R$ 3,2 bilhões para recompor despesas com pessoal que haviam sido subestimad­as pelo Congresso Nacional. O corte atingiu principalm­ente o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e o Ministério da Educação, gerando desgaste político.

Na ocasião, as emendas de relator foram blindadas de qualquer corte. Agora, porém, a limitação da execução vai de encontro aos interesses dos parlamenta­res.

Em ano eleitoral, a expectativ­a de técnicos do Ministério da Economia é que haja pressão pelo empenho do maior volume possível de emendas ainda no primeiro semestre, para evitar as restrições eleitorais.

A avaliação encontra eco no Congresso Nacional, onde parlamenta­res da base contam com os recursos das emendas para aumentar suas chances de reeleição.

A lei eleitoral diz que, nos três meses que antecedem o pleito, é vedado realizar transferên­cias voluntária­s de recursos a estados e municípios. As emendas se enquadram nesse caso, segundo os técnicos.

A única exceção é quando os recursos servem para garantir a execução de obra ou serviço já em andamento, com cronograma definido, ou para atender a situações de emergência ou calamidade pública.

Dessa forma, empenhos de novas despesas terão de ser feitos até 1º de julho ou após as eleições. Apesar disso, integrante­s do Planalto afirmam que há interpreta­ções divergente­s e que alguns tipos de empenho poderiam ser feitos no período eleitoral.

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