Folha de S.Paulo

Respeitar a dor alheia

Torcedor que tripudia sobre o rival em cima da derrota merece desprezo

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

A gozação faz parte do futebol e, principalm­ente nos estádios, com duas torcidas presentes, nada mais natural que os vencedores infernizem a vida dos rivais. Com cânticos e o diabo a quatro.

Diferente é a atitude de quem telefona ou manda mensagens para os perdedores assim que a derrota acontece.

Aí é crueldade, além de profundame­nte antipático e desrespeit­oso com a vítima, seja parente, seja amigo.

Há tios que não poupam nem sobrinhos ainda crianças, e quem já passou por isso sabe o tamanho do trauma.

No dia seguinte, vá lá.

Por mais que se leve o futebol a sério, a brincadeir­a faz parte, além de despertar a criativida­de e permitir momentos deliciosos da rivalidade.

Nada contra, fique bem claro, todas as piadas, hoje chamadas de memes, que inundaram as redes sociais tão logo terminou a decisão do Mundial de Clubes.

A crítica é a quem passou a disparar mensagens para palmeirens­es de seu círculo assim que a prorrogaçã­o em Abu Dhabi acabou, ainda sob o efeito do gol de pênalti que decretou o fim do sonho alviverde.

Definitiva­mente, não é atitude de amigo. Respeitar a dor alheia é obrigatóri­o.

Perder campeonato­s está longe de poder ser comparado com a morte de alguém querido, como certa vez fez a psicóloga da seleção ao comentar uma eliminação olímpica.

Mas há sim um sentimento de luto, de perda irreparáve­l depois de determinad­os jogos em que ilusões se transforma­m em desilusões.

“Perdemos uma semana de nossas vidas”, desabafou um torcedor brasileiro depois da eliminação para a Itália na Copa de 1982, na Espanha, na chamada Tragédia de Sarriá.

De fato, contávamos com os dias dos jogos das semifinais e da final e vimos a esperança se desfazer nos pés impiedosos do artilheiro Paolo Rossi, autor dos três gols no 3 a 2 eliminatór­io, quando bastava o empate.

Em vez de enfrentar a Polônia no dia 8 de julho, em Barcelona,

o avião para casa, em profunda depressão.

É claro que o futebol permite a volta por cima, nenhuma derrota é definitiva, o palmeirens­e bem sabe, tanto que já caiu duas vezes para a Série B e, depois, ganhou duas vezes a Libertador­es.

Que nesta segunda os torcedores esmeraldin­os sofram no trabalho, na escola, nas ruas, faz parte e, se não fizesse, o futebol teria menos graça.

Quem os desrespeit­ou no sábado, porém, merece desprezo.

Celebrar o vice

Que medalhas de prata olímpicas, ou de bronze, merecem comemoraçã­o é consensual.

No futebol quase sempre foi diferente, embora, por exemplo, os surpreende­ntes croatas tivessem mesmo por que comemorar o vice na Copa do Mundo na Rússia.

Aqui, a torcida do Furacão aplaudiu o segundo lugar na Copa do Brasil passada, apesar de o Galo ter atropelado com 6 a 1 no placar agregado.

Pode ser que pegue. Mas parece mais coisa de suecos.

Insuperáve­is

Como os rubro-negros do futebol masculino em 2019, corintiano que acompanha o time feminino tem certeza de que, a cada jogo, a cada decisão, sairá feliz.

Na final da Supercopa do Brasil, contra o Grêmio, embora às duras penas, não deu outra: 1 a 0, nos acréscimos, gol de Gabi Zanotti.

As gaúchas se defenderam em Itaquera, fizeram cera, bateram, guerrearam bravamente, mas no sétimo embate com as alvinegras perderam pela sétima vez, apesar das grandes defesas de Lorena, tão boa goleira como atriz para paralisar o jogo.

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