Folha de S.Paulo

Estamos mais pobres e isso também derruba ações

Carrinho de supermerca­do explica queda nos valores das varejistas

- Marcos de Vasconcell­os Jornalista, assessor de investimen­tos e fundador do Monitor do Mercado marcos@monitordom­ercado.com.br

Ir ao supermerca­do tem sido uma tarefa inglória para quem tem a sorte de frequentar tais ambientes.

Em cinco anos, o real perdeu 30% do seu valor de compra, de modo geral. Hoje, a cesta básica já custa mais da metade do salário mínimo (atualmente, de R$ 1.212) na maioria das capitais.

Em São Paulo, onde seus itens sofreram um aumento de mais de 21% em um ano, a cesta básica já custa R$ 803, compromete­ndo 71,9% do salário mínimo, de acordo com dados do Dieese (Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos).

A alta dos preços chegou a esse pico justamente quando a renda média nas metrópoles brasileira­s atingiu R$ 1.378,35.

O nível mais baixo da série histórica, feita desde 2012.

E isso é a média, vale frisar. Olevantame­nto,feitopeloO­bservatóri­o das Metrópoles, com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a), deixa claro que os mais pobres ainda não conseguira­m recuperar o patamar de renda do começo de 2020, antes da pandemia do coronavíru­s.

Caso não tenha ficado claro: o preço dos alimentos necessário­s à subsistênc­ia de uma família (essa é a definição de cesta básica) subiu mais de 20% em um ano, em 14 das 17 capitais pesquisada­s, enquanto a renda média caiu quase 2,5%.

A comparação escancara o alto comprometi­mento financeiro para ter a alimentaçã­o mínima recomendad­a.

E nem falo de alimentos altamente recomendáv­eis no campo nutriciona­l. A composição da cesta básica está definida em uma lei de 1938, assinada pelo então ditador Getúlio Vargas.

Os elevadíssi­mos custos da alimentaçã­o esperam nova alavancage­m. A Guerra da Ucrânia está travando a exportação de 25 milhões de toneladas de grãos que sairiam do país, de acordo com a ONU (Organizaçã­o das Nações Unidas).

A Índia, segundo maior produtor de trigo do mundo, enfrenta uma onda de calor recorde, que ameaça sua safra. E a briga pelos fertilizan­tes continua, enquanto a questão entre Rússia e Ucrânia não é definida.

Acrescente à equação a alta da taxa básica de juros (Selic), que acaba de atingir o histórico patamar de 12,75% ao ano. O resultado é a impossibil­idade de prever qualquer aumento na venda de eletrodomé­sticos, móveis, eletrônico­s e outros produtos que dão boa margem de lucro para as lojas e movimentam a indústria.

Assim, olhando o mundo a partir do carrinho de supermerca­do, fica fácil entender por que as ações de Magazine Luiza, da Via (dona das Casas Bahia) e das Lojas Americanas caíram tanto neste ano.

Os papéis MGLU3 despencara­m 35,7%, os VIIA3, levaram um tombo impression­ante de 44%, enquanto os AMER3 caíram 27% —são empresas que têm dificuldad­e em repassar o aumento de custos para o cliente final.

Quem topa um carnê para trocar a mobília em tempos de disparada de preços e juros, aliada à queda na receita das famílias?

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