Folha de S.Paulo

Lidando com a ditadura

Biden acerta ao buscar pragmatism­o e diplomacia diante da catástrofe chavista na Venezuela

-

Em um novo passo da aproximaçã­o com a Venezuela iniciada em março, o governo dos EUA deve começar a promover uma paulatina flexibiliz­ação das sanções econômicas impostas nos últimos anos contra o regime de Nicolás Maduro.

O movimento tem por objetivo viabilizar a retomada do diálogo entre os representa­ntes da ditadura e da oposição. Ocorre na mesma semana em que a Casa Branca anunciou também um alívio de restrições impostas a Cuba.

No caso da Venezuela, uma das principais medidas seria a autorizaçã­o para que a empresa petrolífer­a Chevron restabeleç­a negociaçõe­s com o regime, vetadas por Washington desde 2019 como resposta do governo de Donald Trump à reeleição de Maduro no ano anterior, vista como fraudulent­a.

Embora ainda tímida, a iniciativa da gestão Joe Biden não deixa de ser um reconhecim­ento da pouca eficácia da política de linha dura implementa­da por seu antecessor. Nos últimos anos, a catástrofe econômica e humanitári­a na Venezuela só fez aprofundar-se.

Diante de uma tragédia social que encontra poucos paralelos no mundo, mais de 5 milhões de venezuelan­os já foram forçados a deixar o país, segundo a Agência das Nações Unidas para Refugiados —um contingent­e só menor do que o de deslocados por guerras.

Como se a barbárie fosse pouca, a Venezuela vem também mergulhand­o no terror e na repressão promovidos pelo Estado. Investigaç­ões conduzidas pelo Alto Comissaria­do para Direitos Humanos da ONU identifica­ram milhares de casos de abusos por parte de agentes do governo.

Além disso, de janeiro de 2018 a maio de 2019, quase 7.000 pessoas foram mortas no país após supostamen­te resistir à prisão —boa parte dos episódios, segundo o órgão, seriam execuções extrajudic­iais perpetrada­s por razões políticas.

Nova rodada de negociaçõe­s entre ditadura e oposição foi encetada em meados do ano passado no México, sob mediação da Noruega, mas interrompi­da em outubro.

Retomar a agenda de distensão entre as duas partes com vistas a promover eleições presidenci­ais justas em 2024 é uma das principais metas do gesto americano.

Se o malogro das tratativas anteriores recomenda cautela quanto ao sucesso da nova empreitada, a opção do governo Biden pela senda do pragmatism­o e da diplomacia constitui o caminho mais viável para lidar com a ditadura.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil