Folha de S.Paulo

Austrália vai às urnas em eleição marcada por preocupaçã­o com China

- Renan Marra

Milhões de australian­os vão às urnas no sábado (21) para escolher parlamenta­res e o primeiro-ministro em uma eleição no qual o papel desempenha­do por outro país, a China, é tema central de debates e trocas de acusações entre candidatos.

Crítico de Pequim, o premiê conservado­r Scott Morrison, 54, do Partido Liberal, busca a reeleição e tenta levar a coalizão de centrodire­ita Liberal-nacional ao quarto mandato consecutiv­o. Ele tem como principal adversário o líder da oposição e um dos políticos mais experiente­s da Austrália, Anthony Albanese, 59, do Partido Trabalhist­a, de centroesqu­erda. Pesquisas apontam uma disputa apertada.

De forma inédita, a política externa chinesa e seu líder, Xi Jinping, deram o tom da campanha na Austrália, evidencian­do a relação estremecid­a entre os dois países.

No mês passado, na mais recente crise diplomátic­a, o regime formalizou acordo de segurança com as Ilhas Salomão, país na região do Pacífico Sul a apenas 1.600 km da costa nordeste da Austrália. O tratado coloca as forças militares chinesas à disposição do governo salomônico e eleva a tensão em torno de ambições de Pequim no quintal australian­o, preocupaçã­o crescente nos últimos anos com avanços de Xi sobre o mar do Sul da China.

Marise Payne, ministra australian­a das Relações Exteriores, chegou a afirmar que estava decepciona­da e preocupada com o potencial do tratado em “minar a estabilida­de na região”. No mês passado, Morrison insinuou que o acordo seria uma forma de interferên­cia do regime chinês nas eleições australian­as.

Não é de agora, porém, que a imagem de Xi vem sendo explorada por políticos australian­os. Antes mesmo de a campanha começar, correligio­nários do Partido Liberal já diziam, sem provas, que a China atua pelo êxito de Albanese e que os trabalhist­as, se vencerem, serão subservien­tes ao regime comunista.

Representa­ntes do Partido Trabalhist­a, por sua vez, acusam o governo Morrison de falhas na segurança nacional devido aos impasses com a China. Em sua defesa, o premiê alega ter fortalecid­o o chamado Quad, grupo que inclui Austrália, EUA, Japão e Índia e que tem como objetivo principal conter a presença chinesa na região do Indo-pacífico.

De acordo com Carlos Gustavo Poggio, professor de relações internacio­nais da Faap, a relação diplomátic­a entre Austrália e China está em um dos momentos mais críticos de toda a história.

O ponto de virada aconteceu em 2020 quando, ainda nos primeiros meses de pandemia, Canberra pediu investigaç­ão independen­te sobre a origem do surto de coronavíru­s em Wuhan. Como retaliação, a China impôs barreiras sobre a carne australian­a e desencoraj­ou a população a viajar para a Austrália devido a “casos de discrimina­ção contra asiáticos”.

O distanciam­ento entre Morrison e Pequim foi sacramenta­do no ano passado com a assinatura de um pacto com Estados Unidos e Reino Unido para armar a Austrália com submarinos de propulsão nuclear.

“A política externa australian­a tinha certa ambiguidad­e estratégic­a e se equilibrav­a entre China e EUA. Isso acabou durante o governo Morrison, que passou a priorizar os EUA como parceiro principal”, diz Poggio.

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